Eduardo Azevedo
A Olimpíada de Sydney terá seis estreantes ilustres: o taekwondo, o levantamento de peso feminino, o triatlo, a classe 49 do iatismo, o trampolim acrobático e o pólo aquático feminino. A espera foi longa mas, finalmente, esses esportes vão valer medalha. O Brasil só terá representantes em dois deles: no triatlo, com seis atletas, e no taekwondo, com a paranaense Carmem Carolina.
Dirigentes e praticantes têm razão para comemorar. Transformar uma modalidade em “olímpica” é quase tão difícil quanto bater um recorde mundial. A concorrência é acirradíssima e as exigências do Comitê Olímpico Internacional (COI) são muitas. Se, por um acaso, você inventar um dia desses um novo jogo e quiser transformá-lo em esporte olímpico, terá pela frente uma verdadeira maratona. Depois de escrever as regras, será preciso difundir a nova modalidade pelo mundo afora e montar uma federação internacional. Para ter alguma chance, um esporte masculino deve ser praticado em 75 países, espalhados por quatro continentes. Nas modalidades femininas, bastam quarenta países em três continentes. Aí, depois de organizar pelo menos um campeonato mundial, você precisa requisitar o ingresso numa determinada edição dos Jogos, sempre com quatro anos de antecedência. Só então vem a parte mais difícil: arrancar do COI um parecer positivo – o que depende de muita politicagem.
Chá de cadeira
Ainda hoje, modalidades estruturadas e famosas assistem aos Jogos do lado de fora, mesmo pleiteando a vaga, às vezes, durante décadas a fio (veja o texto abaixo). Em alguns casos, a insistência vence. O beisebol levou 32 anos até ser finalmente oficializado, em 1992. Na maior parte do século, a porta de entrada era um mecanismo inventado na terceira Olimpíada, em 1904, os chamados “esportes de demonstração”. Sem contar para o quadro de medalhas, as modalidades candidatas entravam nos Jogos para aumentar sua divulgação, numa espécie de degrau para ganhar o selo olímpico. Foi assim que entraram esportes hoje tradicionais, como handebol (1936) e basquete (1964).
Mas logo a novidade virou um instrumento para agradar os anfitriões da festa, que exibiam o seu jogo preferido. Em Londres-1908, por exemplo, houve uma disputa que desafiava todos os princípios básicos da competição olímpica: uma corrida de barcos a motor. A novidade era um mimo do COI ao duque de Westminster, proprietário de uma lancha de 40 pés. O duque competiu apenas contra dois adversários. Mesmo assim não escapou do vexame – jogou o barco sobre um banco de areia e ficou encalhado. Outros esportes representavam a cultura do povo local. O budo, esporte japonês com espadas, foi apresentado em Tóquio-64 e o korfball, semelhante ao basquete, foi atração em Amsterdã-28. Só em Atlanta-96 o COI decidiu acabar com a festa. Os esportes de demonstração foram extintos e agora só entra quem efetivamente tem condições de ficar.
Barrados no baile
Para garantir uma vaga olímpica, não é suficiente que o esporte seja praticado em âmbito mundial.
O futsal que o diga. Há vinte anos na fila, o antigo futebol de salão nunca conseguiu nem sequer ser exibido como demonstração. E não é por falta de adeptos. O futsal está presente em dezenas de países – muitos deles grandes potências esportivas. Só no Brasil, há 258 000 atletas registrados. Na Espanha o contingente é ainda maior.
Para o presidente da Confederação Brasileira de Futsal, Aécio de Borba Vasconcelos, a culpa é da eterna briga entre o COI e a Fifa, entidade máxima do futebol de campo que controla também o futsal. “Os membros do Comitê Olímpico querem a todo custo incluir jogadores profissionais de futebol de campo nos Jogos”, explica o dirigente. “Como a Fifa não deixa, para não rivalizar com a Copa do Mundo, eles dão o troco proibindo o ingresso do futebol de salão.”
Outro que está na fila é o surfe. Mesmo tendo se candidatado apenas em 1995, o esporte tem mais chances que o futsal. Além de bem organizado, está livre da politicagem. Porém o técnico Marcos Conde, da seleção brasileira de surfe, acredita que a estréia só acontecerá mesmo em 2008, e não em Atenas-2004. “É que na Grécia não há ondas”, lamenta.
Apartheid sexual
Dos seis esportes que fazem sua estréia olímpica em Sydney, dois não são propriamente novos mas, sim, versões femininas de modalidades que antes eram praticadas exclusivamente pelos homens. É o caso do levantamento de peso e do pólo aquático.
O número de esportes olímpicos que não admitem mulheres é cada vez menor, uma conseqüência direta da crescente participação feminina na sociedade.
Mas alguns redutos machistas ainda resistem. O boxe e a luta greco-romana, por exemplo, estão longe de permitir mulheres se socando por medalhas olímpicas. Há também os “clubes da Luluzinha”, onde homem não entra. Alguém já viu marmanjos disputando medalhas na ginástica rítmica?
E no nado sincronizado, quem se lembra de pernas peludas para fora da água, em perfeita harmonia?
Não há versões masculinas para esses esportes. O hipismo é um caso raro em que homem pode concorrer com mulher. Na prova de salto em Atlanta-96, a francesa Alexandra Lederman ganhou a prata e dividiu o pódio com dois cavaleiros.
No ranking mundial, porém, as amazonas ainda não figuram entre os vinte melhores atletas.