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Como o PowerPoint ganhou um Oscar e um Nobel, explodiu o ônibus espacial, invadiu as correntes de e-mail e dominou o mundo

Por Bruno Garattoni Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h47 - Publicado em 18 mar 2011, 22h00

Flórida, 2003. Após dois anos de problemas e adiamentos, o ônibus espacial Columbia finalmente é lançado com sucesso. Exceto por um detalhe quase imperceptível. Durante o lançamento, um pequeno pedaço de espuma se solta e acerta a asa esquerda do ônibus espacial. Preocupada, a Nasa monta um esquema de emergência para decidir rapidamente o que fazer. Os engenheiros estudam profundamente o caso, trocam centenas de e-mails e produzem um relatório a respeito. São 3 arquivos de PowerPoint, com as piores características que uma apresentação pode ter. Em vez de um texto lógico e ordenado, com começo, meio e fim, as ideias são picotadas num labirinto de bullets, gráficos e setinhas – cada slide tem nada menos do que 6 níveis de tópicos e subtópicos. As informações importantes (provas de que o Columbia corre perigo) estão lá, mas organizadas de forma contraditória. Como não conseguem chegar a uma conclusão, os diretores da Nasa resolvem não fazer nada. Doze dias depois, o ônibus espacial se desintegra ao entrar na atmosfera terrestre, matando os 7 astronautas a bordo. A comissão formada para investigar o caso aponta 3 causas para a tragédia. Danos na asa do Columbia, erros da Nasa e as benditas apresentações – isso porque, para fazer as ideias caber nos slides, os engenheiros usaram abreviações que mudaram ou enfraqueceram o sentido de algumas informações. “O uso endêmico do PowerPoint ilustra bem os problemas de comunicação da Nasa”, concluiu a investigação do governo dos EUA.

Califórnia, 2003. Ex-vice-presidente e candidato derrotado nas eleições de 2000, Al Gore procura a Duarte Design, uma empresa que fica na Califórnia e tem uma especialidade e tanto: seus 48 funcionários são considerados os maiores experts do mundo em PowerPoint. Gore, que tem fama de ser meio chato e falar como um robô, quer melhorar o visual de uma apresentação que tem feito pelo país, falando sobre os riscos do aquecimento global. Centenas de horas de trabalho depois, o resultado está pronto – e lindo. Ele não traz informações novas; praticamente nada que já não seja amplamente conhecido e aceito pela comunidade científica.

Mas a apresentação é tão incrível, com 266 slides tão bem editados, que encanta quem a vê. E acaba virando filme. Uma Verdade Inconveniente, de 2006, é o primeiro longa-metragem inteiramente baseado numa apresentação de PowerPoint (na verdade, Gore e seus ajudantes usaram o Apple Keynote, uma imitação melhorada do programa da Microsoft). Milhões de pessoas se conscientizam sobre as mudanças climáticas, o filme ganha o Oscar de melhor documentário, Gore passa a ser considerado um grande comunicador – e conquista o Prêmio Nobel da Paz. Tudo isso, em boa parte, graças aos slides. O PowerPoint pode criar gênios e provocar tragédias. Mas o que ele geralmente faz é matar as pessoas de tédio. É difícil encontrar alguém que goste de PowerPoint – no mundo corporativo, já virou lugar-comum falar mal do programa. Sabe quando dá para perceber, já no primeiro slide, que tudo será uma perda de tempo? E o que dizer daquelas correntes que chegam por e-mail, quase sempre no formato Power Point? São absolutamente inúteis. Mas como um programa tão detestado conseguiu dominar o mundo?

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Pode parecer difícil de acreditar, mas já existiu um mundo sem PowerPoint. No começo dos anos 80, o único jeito de montar uma apresentação era digitá-la numa máquina de escrever, desenhar os gráficos à mão e depois fotocopiar tudo em folhas de acetato – as famosas (e toscas) transparências. Já era possível fazer os slides em computador, mas custava muito caro: era preciso recorrer a empresas especializadas, que usavam máquinas de grande porte e cobravam US$ 500 por hora. Só grandes empresas e executivos podiam pagar. Até que, em 1984, a Apple lançou o primeiro computador pessoal com mouse – o Macintosh. E o engenheiro americano Robert Gaskins percebeu a deixa: agora qualquer pessoa poderia fazer seus próprios slides em computador. Ele desenvolveu um software, que acabou vendendo para a Microsoft por irrisórios US$ 26 milhões (hoje, o Office dá US$ 8 bilhões de lucro por ano). Bill Gates batizou o programa de PowerPoint – algo como “bom argumento”, em inglês – e lançou a primeira versão em 1987. O PowerPoint 1.0 era preto-e-branco e só rodava em Mac (como vários produtos da Microsoft, ele começou no Mac e não no pc, que na época não tinha potência suficiente). Mas, como a maioria das empresas usava pcs, o programa não decolou.

Ele só começaria a conquistar o planeta 3 anos depois, quando uma supernovidade abalou o mundo corporativo: os notebooks. De uma hora pra outra, todo executivo passou a querer um – era um símbolo de poder e modernidade. E rodava o PowerPoint. Pronto. Cada vez mais gente começou a usar o programa, que em 1990 ganhou versão para Windows e explodiu de vez – só nos primeiros 3 anos, as vendas do PowerPoint subiram 1 400%. De lá para cá, os slides viraram a linguagem oficial das empresas e também se infiltraram em outras partes da vida. Nos EUA, o PowerPoint já é ferramenta comum em trabalhos escolares, domina as comunicações do Exército (ele foi usado para planejar e “vender” a invasão e reconstrução do Iraque) e é empregado até em igrejas – existem várias empresas especializadas em montar e turbinar apresentações bíblicas. O PowerPoint é onipresente porque funciona mesmo. Uma série de experiências feitas na Universidade do Arizona provou que as apresentações de slides são 30% mais eficazes, no quesito convencimento da plateia, do que um texto ou exposição puramente verbal. E os slides mais convincentes são os que têm gráficos animados, transições e efeitos especiais – justamente as firulas mais típicas do PowerPoint.

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Mas tudo isso também tem um lado ruim. Ao mesmo tempo em que ajuda a acreditar nas coisas, o PowerPoint torna mais difícil entendê-las. É isso mesmo. Estudos feitos nos EUA e na Austrália comprovaram que, numa apresentação de PowerPoint, as pessoas absorvem 20% menos informações do que quando os dados são expostos verbalmente. E os slides com figuras e animações, que mais agradam e convencem o público, são justamente os piores nesse aspecto.

Ninguém sabe exatamente por que isso acontece, mas os pesquisadores arriscam uma teoria. As apresentações de PowerPoint expõem os mesmos dados de várias formas diferentes (por escrito, graficamente, verbalmente) ao mesmo tempo. Mas essa repetição causa uma sobrecarga no cérebro – que, em vez de aprender mais, passa a ignorar parte das informações. “O PowerPoint ajuda o apresentador, não a plateia”, acredita Edward Tufte, cientista da informação da Universidade Yale e maior inimigo do PowerPoint (é autor de um livro a respeito e fez parte da comissão da Nasa que acusou o programa pelo acidente com o Columbia). Até o próprio criador do PowerPoint parece ter se voltado contra ele. “Todas essas acusações são verdadeiras”, admite Robert Gaskins. Ele diz que as pessoas deveriam se preocupar mais com o conteúdo, e menos com o visual, das apresentações. Mas a tendência não é essa.

A grande novidade do PowerPoint 2010, que chega ao mercado nos próximos meses, é que ele permite incluir vídeos do YouTube nas apresentações. Dificilmente isso vai torná-las mais relevantes. Mas pelo menos vai deixá-las menos chatas. Sim, o PowerPoint pode ser divertido. Como no PowerPoint Karaoke, um evento que foi inventado na Alemanha e já se espalhou para EUA, Canadá e Inglaterra. Cada participante escolhe uma das apresentações previamente selecionadas pelos organizadores (todas encontradas na internet e cheias de clichês do PowerPoint, com títulos como “Gestão Estratégica Balanceada”), sobe ao palco e tenta vender o peixe da melhor maneira possível. “Eu nem sabia sobre o que estava falando”, comemorou o vencedor da primeira edição do evento. Que beleza! PowerPoint é isso aí.
 

A ciência do slide perfeito
Dez dicas dos maiores especialistas em PowerPoint

1. Qual conclusão você quer passar para a plateia? Pense nisso. E comece redigindo o último slide da apresentação.

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2. Seja o mais conciso possível, e não se preocupe com os detalhes. O slide ideal tem no máximo 10 palavras.

3. Só use os bullets quando absolutamente necessário (exemplo: no slide introdutório, que enumera as ideias a serem expostas).

4. Procure colocar apenas uma ideia ou gráfico por slide (caso necessário, divida as suas informações em vários slides).

5. Use dois tipos de fonte: uma para os títulos, outra para o texto. De preferência, use fontes sem serifa (como Arial e Tahoma).

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6. Evite usar fontes menores do que 28 pontos. O menor tamanho aceitável é 24.

7. Ao montar um gráfico, destaque sua informação mais relevante – e faça isso no próprio slide (não use o laser pointer).

8. Gráfico de pizza? Prefira a versão 2D (a 3D distorce as porcentagens). E use apenas duas cores nos gráficos de barrinhas.

9. Depois de terminar sua apresentação, releia os slides e veja se cada um deles pode ser compreendido em no máximo 3 s.

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10. Não repita para o público, em hipótese nenhuma, as frases que estão escritas nos slides. Isso fará com que você seja ignorado.

Fontes Nancy Duarte (Slide: ology) e Garr Reynolds (Presentation Zen)

Para saber mais

Slide:ology – The Art and Science of Great Presentations

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Nancy Duarte, O’Reilly Books, 2009.

The Cognitive Style of PowerPoint

 

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