De carona no cometa
O que os cientistas estão aprendendo com os dados coletados após bombardearem Tempel 1
Duilia de Mello
Foi um 4 de julho digno de superpotência: em vez de explodir fogos de artifício, a Nasa comemorou o último dia da independência americana bombardeando um cometa a 134 milhões de km da Terra. A explosão, parte da missão Deep Impact, abriu uma cratera de onde pesquisadores esperam tirar dados que expliquem da origem do Universo à possibilidade de um cometa ter trazido a vida para a Terra. Uma sonda gravou tudo – são as imagens mais próximas de um cometa já feitas.
Ainda há muito a analisar. Mas o que foi visto é surpreendente: descobriu-se, por exemplo, que o Tempel 1 possui uma série de crateras, provavelmente formadas por colisões com outros corpos celestes. “Pensávamos que os cometas tinham superfície lisa, mas encontramos um objeto irregular. Precisamos entender como essas formações foram criadas num corpo tão pequeno”, diz Paul Feldman, especialista em cometas da Universidade Johns Hopkins. Outra surpresa: a presença de moléculas orgânicas, feitas de carbono – matéria-prima da vida na Terra.
O interesse pelos cometas pode ser explicado pelas características peculiares desses corpos. Como não têm atividade vulcânica, oceanos em mudança ou atmosfera, eles tendem a não sofrer as grandes transformações pelas quais os planetas passam. Por causa disso, seus núcleos, protegidos por uma camada de gelo espessa, podem conter matéria primordial intacta por vários bilhões de anos.
Impacto profundo
Quem é quem namissão cinematográficada Nasa
A sonda
Tamanho: 3,2 metros de comprimento, 1,7 metro de diâmetro e 2,3 metros de altura.
Como funciona: A sonda Deep Impact foi lançada pela Nasa no dia 12 de janeiro de 2005. Ela tem 2 partes: um projétil, espécie de bala de revólver supertecnológica, que foi ejetado para se chocar com o cometa; e uma câmera que filmou e fotografou 14 minutos de imagens a partir da explosão. A câmera de alta definição é capaz de enxergar um objeto de 1,4 km de diâmetro a 700 km de distância.
O projétil
Peso: 370 kg
Composição: Na maior parte, cobre.
Como funciona: O projétil foi lançado da Deep Impact, mas tinha sistema próprio de navegação. Entre a sonda e o cometa foram 880 mil km de viagem, percorridos em 22 horas – no momento do impacto, a velocidade era de 36 720 km/h. A colisão aumentou em 10 vezes o brilho do cometa, que pôde ser observado da Terra.
Tempel 1
Formação: 4,6 bilhões de anos.
Origem: Cinturão de Kuiper. Como ele é cheio de crateras, parece mais com os objetos do cinturão, onde existem também asteróides e outros cometas. O cinturão de Kuiper fica a 6 bilhões de km da Terra.
Tamanho: 3 km de raio.
Por que o Tempel 1? Entre os principais motivos da escolha estão as dimensões do cometa – grande o suficiente para suportar o impacto sem se desintegrar ou sair da órbita; sua rotação lenta, que possibilitou que a sonda tirasse fotos da cratera formada pelo impacto; e a órbita, que nunca cruza a da Terra.
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Feito rocha
Para surpresa dos cientistas, o choque levantou menos gelo e poeira do que o esperado. “O Tempel 1 é bem sólido. Acreditávamos que o projétil levantaria mais material do que o observado”, diz Paul Feldman, da Universidade Johns Hopkins. Mas os astrônomos apenas começaram a analisar as imagens. Ainda não se sabe, por exemplo, tamanho e profundidade da cratera formada. E tudo indica que o projétil não conseguiu trazer à superfície material do núcleo do cometa.
Sua mãe é um cometa
A Nasa disse ter encontrado no Tempel 1 mais moléculas de etano e metano do que esperava. Esses gases têm entre seus constituintes o carbono, elemento fundamental na formação da vida – o DNA contém bilhões de átomos de carbono. Isso quer dizer que os primeiros seres vivos da Terra chegaram aqui trazidos por um cometa que se chocou com o planeta, como acreditam alguns cientistas? Os primeiros resultados do Deep Impact indicam que, tecnicamente, a hipótese não é inviável.
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Olha o foco!
Os técnicos da missão estão tentando reconstruir algumas das imagens tiradas com a câmera de alta resolução da Deep Impact. As fotos estão ligeiramente fora de foco. A Nasa descobriu o problema pouco após o lançamento da sonda – mas então já era tarde para fazer consertos. Isso porque a câmera não possuía um sistema de autofoco, retirado para baratear os custos do projeto, que chegaram a 330 milhões de dólares.