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Por debaixo do pano

Escondida nas fibras dos tecidos, a tecnologia promete transformar os hábitos dos consumidores. Vêm aí roupas que repelem a sujeira e até combatem bactérias.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h33 - Publicado em 30 jun 1999, 22h00

Gabriela Aguerre

Prepare-se. Seu guarda-roupa vai mudar. Meias que não cheiram mal depois de usadas, camisetas que repelem o cheiro do suor e calças que não sujam são algumas novidades que a indústria têxtil vai pôr no armário do brasileiro nos próximos meses. Não se trata, porém, de novas fibras sintéticas. “A novidade é o acabamento. Os tecidos vão receber um tipo de tratamento incrível”, afirma Davi Constantinidis, químico da Clariant, a empresa suíça resultante de fusão de duas gigantes do setor, a Hoechst e a Sandoz.

A camiseta-desodorante é feita de malha comum. O que ela tem de diferente só aparece num microscópio (veja a foto maior). Desenvolvidas na França, as fibras do tecido contêm minúsculas cápsulas recheadas com substâncias antitranspirantes que impedem a formação do suor ou carregam perfume.

Os tecidos inteligentes estão chegando às vitrines depois de terem conquistado o mercado de roupas funcionais. “Eles já são muito usados em uniformes e revestimentos”, explica o químico Evaldo Maluf, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas da Universidade de São Paulo (IPT). É o caso dos tecidos resistentes a fogo, vitais para bombeiros, mas pouco maleáveis e, portanto, ainda inadequados para as passarelas.

“Esses panos especiais podem determinar as tendências para a evolução da indústria têxtil”, ressalva Maluf. De fato, cedo ou tarde as descobertas tecnológicas acabam sendo aprimoradas e aplicadas no dia-a-dia. Foi o que aconteceu com a roupa de cama dos hospitais e os jalecos dos médicos, feitos de tecido antimicrobial, que cria um ambiente impróprio para microrganismos causadores de infecções. Depois dos hospitais, o tecido está chegando às lojas. Vêm aí as meias antichulé, capazes de manter os pés cheirosos.

A cobertura faz toda a diferença

Imagine uma roupa que não ensope na chuva nem encharque de suor no calor – e ainda por cima não fique empoeirada. Pode parecer figurino de ficção científica, mas isso já é quase realidade. Depois de 90 minutos de um jogo de futebol, a camisa de um atleta pode pesar 1 quilo a mais, só de suor. Mas hoje já existem tecidos hidrofilizados (veja infográfico) que retêm apenas 200 gramas de líquido. O restante evapora rapidamente sem se acumular.

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Para que a roupa funcione como uma capa de chuva – e ao mesmo tempo não deixe a poeira grudar –, a técnica utilizada é outra: aplica-se no tecido uma substância chamada fluorcarbono, conhecida popularmente por uma de suas marcas comerciais, o teflon, que impede a gordura de grudar na panela. Ela já é usada em guarda-chuvas e estofamentos para carro. O problema é que o pano fica sem nenhuma flexibilidade, incômodo demais para ser vestido. Mas a tecnologia para torná-lo mais confortável já surgiu, empregando fibras maleáveis e elásticas. Agora é possível aproveitá-la no vestuário. “No próximo século, toda a pesquisa têxtil vai se voltar para o conforto”, prevê Maluf.

Seu guarda-roupa não perde por esperar. A tecnologia aplicada à moda ainda vai dar muito pano para manga.

1. À primeira vista, as peças parecem comuns. As qualidades das novas roupas não são visíveis a olho nu

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2. Com a ajuda de um microscópio, um tecido desodorante fica assim. Os fios entrelaçados são as fibras e as bolinhas são cápsulas especiais

3. Cada cápsula é inserida depois que o tecido está pronto. Dentro dela existe um líquido, que pode ser perfume ou desodorante

Pano de fundo

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Os tecidos inteligentes funcionam como um cenário para uma série de reações químicas.

1. Anti-sujeira

Gotas e pó deslizam como óleo em uma frigideira.

A mesma substância que impede que um ovo frito grude na frigideira faz com que um tecido fique imune a sujeira e a gotas de óleo ou água. É o fluorcabono.

O pano possui uma carga elétrica negativa muito grande e, como um ímã às avessas, forma uma espécie de rede acima do tecido, repelindo essas partículas.

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Por esta rede, as moléculas de água não passam, apenas deslizam na superfície. As partículas de pó também escorregam como uma gota de óleo em uma panela antiaderente.

2. Anti-suor

Processo químico faz tecido sintético virar quase natural.

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A hidrofilização só vale para tecidos sintéticos. Nesse processo, centenas de moléculas de poliéster são reunidas em polímeros, que são aglomerados de moléculas. Eles criam ondulações entre as fibras que deixam a chuva e o suor escorrer com facilidade. Assim, um tecido sintético como o poliéster fica tão permeável quanto o algodão natural. O líquido não fica retido no pano.

Como você pode ver na imagem ao lado, uma fibra natural possui várias ramificações irregulares. É no meio desses veios que a água desliza com facilidade.

As fibras sintéticas são lisas feito berinjela. Por isso, a água, ao atingir um tecido sintético não-hidrofilizado, fica praticamente parada e demora para ser absorvida. Ela não dispõe de dutos para escorrer.

3. Antibactéria

As roupas antibichos também evitam mau cheiro.

Microrganismos precisam de umidade e nutrientes para proliferar. O tecido antimicrobial recebe um revestimento que impede a fixação de bactérias. Cria um ambiente inóspito para a multiplicação dos micróbios.

4. Antifogo

Fórmula secreta corta propagação da chama.

Um produto conservado como segredo industrial pela fabrica Clariant, mas à base de sais de fósforo, cria uma camada de proteção na superfície do tecido. Essa substância eleva o ponto de carbonização do pano, isto é, a temperatura em que ele queima.

Idéia luminosa

Pesquisador japonês insere gene fluorescente no bicho-da-seda.

O fio de seda se desfaz com um sopro mais forte. Foi pensando em como diminuir essa fragilidade que pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Kyoto, no Japão, resolveram interferir na etapa inicial do processo de criação da seda. Ou seja, eles foram mexer direto com o bicho-da-seda. A experiência, divulgada em março deste ano, consistiu em injetar um gene que cria uma substância fluorescente na lagarta. Deu certo. O gene foi aceito. “Ele não produziu seda fluorescente, mas o bicho ficou brilhante, o que significa que o animal aceitou o gene”, contou à SUPER o biólogo Hajime Mori, que participou da pesquisa. O resultado alentador estimula a manipulação genética para se obter seda especial diretamente com o produtor.

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