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Por que os EUA estudam banir o TikTok do país?

O governo americano diz que o aplicativo pode estar roubando dados dos usuários e enviando para o governo chinês. O caso reflete a desgastada relação diplomática entre os países. Entenda.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 7 jul 2020, 20h36 - Publicado em 7 jul 2020, 20h26

As complicadas relações diplomáticas do século 21 estão se materializando de maneira cada vez mais inusitada. Dessa vez, o alvo da polêmica é o TikTok, uma das redes sociais mais populares dos últimos tempos.

Na última segunda (06), Mike Pompeo, Secretário de Estado dos EUA (cargo equivalente ao nosso ministro das Relações Exteriores), disse em entrevista à Fox News que o país estuda banir o aplicativo de seu território. “Eu não quero passar na frente do presidente [Donald Trump], mas é algo que estamos considerando”, relatou.

O motivo de tudo isso é diplomático: a rede social TikTok nasceu na China, e há a preocupação de que os dados dos usuários possam estar sendo enviados para o governo de lá, tudo isso enquanto a relação entre os dois países está cada vez mais deteriorada, especialmente após a pandemia de Covid-19.

Se você está por fora do mundo tecnológico, o TikTok é uma rede social em que os usuários gravam, editam e compartilham vídeos curtos em seus perfis. É especialmente popular entre os jovens, e já acumulou mais de 2 bilhões de downloads desde que foi lançada, no final de 2016 – foram 315 milhões apenas nos três primeiros meses de 2020. A empresa por trás do enorme sucesso é a ByteDance, uma companhia privada com sede em Pequim, na China.

Desde o ano passado, porém, o aplicativo vem sendo alvo de denúncias sobre sua política de privacidade – algo comum com várias redes sociais nos últimos tempos, principalmente após o escândalo da empresa Cambridge Analytica, que utilizou indevidamente os dados de usuários do Facebook para fins de propaganda eleitoral. Mas a preocupação com o TikTok tem um quê a mais: o receio de que os dados dos usuários possam estar sendo gravados e enviados para o governo chinês. Essa possibilidade levou até senadores americanos a publicamente pedirem uma investigação mais profunda sobre o aplicativo, alegando preocupações sobre a segurança nacional.

Especialistas independentes já apontaram que sim, o TikTok coleta dado de seus usuários – mas praticamente todas redes sociais e apps fazem isso para uso próprio. Inclusive, os dados que são coletados estão listados nos termos de uso que o usuário deve ler e aceitar ao baixar o aplicativo. Nesse mesmo contrato, a empresa diz que essa base de dados é usada para “atender solicitações de produtos, serviços, funcionalidades da plataforma, suporte e informações para operações internas, incluindo solução de problemas, análise de dados, testes, pesquisas, estatísticas para propósitos de pesquisa e para solicitar seu feedback”.

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Mas alguns fatores específicos fizeram com que o Ocidente ficasse de olho no app. No começo de 2020, falhas no segurança do aplicativo foram identificadas por uma empresa de segurança digital. Os erros facilitavam o acesso de hackers aos dados de usuários e até a tomada de controle de contas de terceiros. A rede social corrigiu o erro assim que foi divulgado.

Mais recentemente, uma outra polêmica envolvendo o aplicativo nasceu após o lançamento da versão beta do iOS 14, o novo sistema operacional da Apple. Isso porque o iOS 14 tem uma funcionalidade nova, que mostra quando um aplicativo tem acesso à área de transferência de seu celular, onde fica armazenado o texto que você copia para depois colar. Mais de 50 aplicativos foram pegos no flagra tendo acesso a essa funcionalidade, sem motivo aparente – e sem avisar o usuário. O mais renomado deles era o TikTok.

Análises subsequentes mostraram que o aplicativo provavelmente só estava “lendo” o que estava copiado para fins internos, mas que não conseguia de fato armazenar aquelas informações ou compartilhar. Recentemente, a empresa deu uma explicação: a funcionalidade existe, e seu objetivo é evitar posts de spam repetitivos. Contudo, como as preocupações sobre privacidade estavam em alta, a plataforma retirou o recurso.

TikTok e o governo chinês

De qualquer forma, as suspeitas sobre o aplicativo permaneceram – apesar de não haver nenhuma prova de que o TikTok esteja de fato roubando dados dos usuários e os enviando para a China, como algumas teorias dizem. A própria empresa já se distanciou bastante dessa narrativa e negou diversas vezes que tenha alguma relação com o governo chinês. Em uma nota divulgada ano passado, a empresa disse: “Armazenamos todos os dados dos usuários americanos do TikTok nos Estados Unidos, com backup em Cingapura. Nossos centro de dados estão localizados totalmente fora da China e nenhum está sujeito às leis chinesas. Vamos ser bem claros: o TikTok não remove conteúdos com base em preocupações da China. Nunca fomos solicitados pelo governo chinês a remover qualquer conteúdo, e não o faríamos se solicitado. Ponto final.”

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De fato, o aplicativo TikTok não opera diretamente da China – apesar da empresa responsável por ele ser sediada em Pequim, o produto “TikTok” é feito especialmente para o mercado exterior. Por lá, inclusive, utiliza-se uma outra versão do aplicativo, chamada Douyin. Segundo representantes da empresa, os aplicativos são mantidos de forma independente, com “mercados, usuários, conteúdos, equipes e políticas” diferentes.

Além disso, o TikTok vem tentando se afastar cada vez mais do governo chinês após as suspeitas dos EUA. Recentemente, o aplicativo anunciou que vai parar de operar em Hong Kong em resposta à implementação da nova lei de segurança imposta pela China, que aumenta o poder do país na região. A decisão foi vista como uma forma de se afastar do controle chinês e mostrar que a empresa é totalmente independente do regime comunista.

Mesmo assim, não está claro se será suficiente. Na entrevista em que afirmou que o TikTok pode ser banido, Mike Pompeo disse que só deve baixar o aplicativo quem queira que “suas informações privadas  fiquem nas mãos do Partido Comunista Chinês”. Os ataques não vieram do nada: a desconfiança com o app faz parte de um cenário maior, em que a relação de China e Estados Unidos, as duas maiores potências do mundo, está se desgastando cada vez mais. Mesmo antes da pandemia os dois países disputavam uma guerra comercial e se estranhavam devido as claras diferenças de regime. Com o novo coronavírus, as tensões se acirraram, especialmente por parte do presidente Donald Trump, que já se referiu a doença como “gripe chinesa” diversas vezes e criticou o país por ser o local de surgimento do vírus.

Para além da briga com os EUA

O TikTok não protagoniza somente a disputa entre as duas maiores economias do mundo, mas também entre as duas nações mais populosas da Terra. Na semana passada, o governo da Índia anunciou que vai banir definitivamente vários aplicativos chineses do seu território (incluindo o TikTok), alegando que eles são “ameaças à soberania e integridade do país.” A notícia surpreendeu a empresa, já que a Índia representava o maior mercado para o serviço devido à grande população.

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A medida foi vista como de grande teor político na medida em que a relação entre os vizinhos se desgasta mais e mais. No começo do mês, houve um confronte direto entre militares chineses e indianos na região fronteiriça dos Himalaias, que deixou 20 soldados indianos mortos (a China não divulgou se houve óbitos de seu lado). Na decisão, o governo indiano não citou motivos políticos, mas sim a preocupação com a privacidade dos dados dos usuários semelhantes às expressas por autoridades americanas.

Como se não bastasse isso, o TikTok também está sob a mira de outro país, por conta de desentendimentos políticos com a China. Na Austrália, alguns políticos também pedem a proibição do aplicativo pelos mesmos motivos de segurança – embora também haja um fundo diplomático na medida.

As relações entre China e Austrália estão em crise desde que o país da Oceania começou a liderar um esforço para instaurar uma investigação independente sobre a resposta da China à Covid-19. Por diversas vezes, o governo australiano criticou a postura do governo chinês e o acusou de censurar e esconder do mundo informações importantes sobre o problema no início da pandemia, o que poderia ter evitado uma crise maior.

Isso levou os dois países a trocarem farpas em forma de medidas, como maiores taxas em importações de um país para o outro. A Austrália chegou ao ponto de avisar seus cidadãos que era perigoso viajar para a China nesta época por medo de retaliação devido à tensão diplomática entre os países. Recentemente, a China fez o mesmo alerta para seus cidadãos.

 

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