Se um buraco negro é um buraco, por que ele não fecha?
Mal dá para imaginar como seria abrir um rombo no tecido cósmico. Por isso, há quem prefira achar que a abertura é só aparente
Texto Salvador Nogueira
Os buracos negros são o maior amigo, e ao mesmo tempo o maior inimigo, da famosa Teoria da Relatividade Geral. Formulada por Albert Einstein, ela basicamente trata espaço, tempo e gravidade como elementos de um todo: o continuum espaço-tempo.
Uma das mais incríveis previsões dessa teoria é que, se a massa de um objeto é suficientemente compactada, amassada, a gravidade se torna tão intensa que nem a luz (composta de partículas que viajam na velocidade máxima permitida pelas leis da física) consegue escapar desses astros – daí o adequado nome de buraco negro.
Interpretando essa idéia em termos da geometria do espaço-tempo, seria como se o objeto tivesse dado lugar a um rombo no tecido do Universo. Mas um rombo para onde? Que diabos isso quer dizer?
Coisa da sua cabeça
Durante muito tempo, ninguém se preocupou em achar respostas a essas perguntas – a idéia de que um objeto desses pudesse realmente existir parecia fantasiosa, na melhor das hipóteses. “Einstein rejeitava os buracos negros, tendo declarado em um famoso trabalho publicado em 1939 que eles não existiam”, conta o físico Freeman Dyson, do Instituto de Estudos Avançados, em Princeton (nordeste dos EUA).
Doce ilusão. O estudo da morte das estrelas mostraria que situações assim podem de fato surgir. O que acontece é que uma estrela é basicamente uma bola de gás comprimido em que a gravidade (uma força de fora para dentro) faz com que os átomos de hidrogênio no núcleo estelar comecem a grudar uns nos outros, processo conhecido como fusão nuclear, produzindo grande quantidade de energia (de dentro para fora). O equilíbrio desses dois processos mantém o astro estável.
E o que acontece quando acaba o combustível para a fusão? A gravidade não quer nem saber. Sem nada para contrabalançá-la, ela começa a espremer o núcleo estelar. Se a estrela tiver uma massa relativamente pequena, como o nosso Sol, ela se torna apenas um cadáver estelar muito denso, conhecido como anã branca, em que a força dos elétrons contrabalança a gravidade e estabiliza a compactação.
Mas, se a massa for suficientemente grande (e há várias estrelas que possuem porte suficiente para isso), a gravidade continua seu ataque de forma ainda mais agressiva e cola os elétrons nos prótons, convertendo todas as partículas ali presentes em nêutrons – dando, assim, origem às chamadas estrelas de nêutrons.
Agora, se a coisa for realmente feia e a estrela original for mesmo muito grande (coisa de 20 vezes a massa do Sol, ou mais), nem mesmo os nêutrons resistem, passam por um estado em que são convertidos em quarks – suas subpartículas componentes – e, finalmente, acabam se transformando em… bem, alguma coisa, digamos.
Esse é o processo que cria um buraco negro. A partir de determinada distância dele, tudo que ali entrar (inclusive a luz) não sairá mais. Essa fronteira matemática é chamada de horizonte de eventos.
Além do horizonte
No interior do horizonte dos eventos está escondida a matéria que originalmente compunha a estrela. Segundo a relatividade, não há força que poderá conter a compactação. Em tese, a matéria iria encolher, encolher, encolher, até atingir um ponto infinitamente pequeno e denso. “Todas essas curiosas e belas características seriam inimagináveis na ausência da teoria de Einstein para orientar nosso raciocínio”, afirma Freeman Dyson.
Só que, quando alguma coisa se torna “infinita” numa equação, isso quer dizer na verdade que a teoria, para aquela si-tuação, não presta. Por isso o buraco negro é, ao mesmo tempo, um grande triunfo e um grande inimigo da relatividade.
Para saber o que é essa “alguma coisa” que fica no interior do buraco negro, só mesmo quando os físicos desenvolverem uma teoria que reúna a relatividade e os efeitos quânticos, ligados ao mundo das partículas, no mesmo pacote. Enquanto esse arcabouço matemático mais seguro não fica pronto, há até quem proponha que os buracos negros são uma porta para outro Universo (leia mais sobre essa idéia ousada na página 32).
2,6 milhões de vezes o tamanho do Sol é o tamanho estimado do superburaco negro que existe bem no centro da nossa galáxia.
Verdades sobre a ida a um buraco negro
O ambiente não é muito aconchegante dentro desses astros misteriosos
Primeira verdade
Você, muito provavelmente, não sobrevive para contar a história. A gravidade, cada vez mais intensa, exerce forças irresistíveis. A matéria é desmanchada de forma muito agressiva. Se você tivesse um corpo ultra-resistente, seria esticado como massa de macarrão ao chegar perto da entidade.
Segunda verdade
A gravidade altera o ritmo do tempo. Na borda de um buraco negro, um visitante hipotético não sentiria diferença, mas quem o visse de fora teria a impressão de que ele está congelado no tempo.
Terceira verdade
Você, ou qualquer coisa que se aproxime de um objeto desse tipo, vira uma máquina de radiografia ambulante. A emissão de poderosos raios X é um dos “sintomas” da destruição da matéria lá.
Quarta verdade
Você ainda pode aproveitar para fazer uma das maiores descobertas da história: a detecção da radiação Hawking, que faria com que os buracos negros, ao longo de zilhões de anos, evaporassem no espaço.