Velocidade máxima
Como as fibras ópticas estão fazendo a capacidade de transmissão de informações aumentar astronomicamente
Renato Cruz
Quando minha filha Samanta, nascida na segunda semana de outubro deste ano, estiver crescidinha o bastante, talvez seja difícil explicar para ela o que a nossa geração queria dizer ao se referir às telecomunicações. Dentro de poucas décadas, será difícil imaginar quaisquer objetos ou aparelhos sem capacidade de se comunicar entre si, desde o seu terno novo até a torradeira da cozinha. Hoje, de modo geral, estamos pensando em telefones fixos, celulares, rádio, televisão, computadores. Samanta, no entanto, terá muito mais a dizer. No tempo em que ela vai viver, o mundo será envolvido por uma enorme teia de comunicação que poderá ligar tudo a todos, como gosta de dizer o pesquisador Arun Netravali, presidente dos Laboratórios Bell, o braço de pesquisa da Lucent, uma das mais avançadas empresas de tecnologia da informação do mundo.
O que, então, a palavra telecomunicações poderá dizer para a próxima geração? Talvez bem mais do que nós possamos imaginar no momento. O que se pode prever é que, em outras palavras, a teia descrita por Netravali poderá transmitir muito mais informações do que hoje. Os formatos serão diversos – texto, vídeos, sons e tudo o mais – para quem quer que seja em qualquer ponto da Terra. Será praticamente impossível não ser encontrado ou não encontrar alguém. Portanto, esqueça as desculpas de João-sem-braço que você está acostumado a contar. A palavra-chave será mobilidade. Veja o que vai estar por trás dela:
Uma infra-estrutura de microestações de rádio – versão compacta dos equipamentos que hoje ligam os celulares à rede de telefonia – poderá permitir que todos estejam conectados o tempo todo, não importa de onde estejam vindo nem para onde estejam indo. Essas pequenas estações seriam ligadas por fibra óptica, aliadas a sistemas de satélite.
A capacidade dos sistemas de comunicações sem fio tem aumentado 1 000 vezes a cada cinco anos. Isso deve contribuir para baratear e melhorar tecnicamente as conexões às redes de comunicação fora de casa ou do escritório. Os aparelhos de comunicação pessoal do futuro irão integrar celular, pager, rádio AM/FM, microcomputador e televisão. É o que se chama, hoje, convergência.
Sistemas compostos de um único chip permitirão que alguns aparelhos sejam do tamanho de broches, presos na lapela. Com o avanço do reconhecimento de voz, digitar será coisa do passado. A interação entre homem e máquina será cada vez mais próxima da linguagem natural.
Tecnicamente, o avanço dos chamados sistemas de banda larga – entenda-se comunicação em alta velocidade – é que vai permitir toda essa troca tremenda de bits. Para ter uma idéia, hoje uma conexão discada convencional à Internet tem velocidade de 56 000 bits por segundo. Mas a difusão de tecnologias, como a fibra óptica vai multiplicar esse potencial velozmente. Atualmente, tecnologias já em uso como o ADSL (Asynchronous Digital Subscriber Line), que utiliza os fios de cobre da telefonia convencional, e o cable modem, que usa a infra-estrutura de TV a cabo, permitem até 256 000 bits por segundo de velocidade.
Será por essas grandes vias de comunicação que circularão os pacotes de dados, conceito surgido na década de 60, cujo maior impulso veio com a explosão da Internet. Toda a informação que trafega na rede mundial é dividida em pequenos pacotes de dados, que viajam pelo mundo atrás de seus destinos. Quando chegam, os pacotes são recompostos, gerando novamente a informação. As redes de pacotes permitem integrar diferentes tipos de tráfego, como dados, voz e imagem. Além disso, possibilitam ter uma estrutura descentralizada, onde a rede possa crescer de acordo com as necessidades de seus usuários.
Os novos sistemas de satélite e o aumento da capacidade das fibras ópticas devem alimentar esse crescimento. As fibras ópticas dobram sua capacidade de transmissão a cada nove meses. Em laboratório, já é possível transmitir um trilhão de bits por segundo dentro de uma única fibra, o que equivale a 500 000 filmes simultâneos. Se a taxa de crescimento na capacidade de transmissão continuar crescendo no mesmo ritmo, o volume de dados sobre uma única fibra deve ultrapassar 1 quatrilhão de bits até o final da década.
Agora, segura estas: no setor de comunicações por satélite haverá, a partir do próximo ano, dois novos satélites geoestacionários, operando em freqüência superior a 20 GHz (banda Ka), desenvolvidos especialmente para a Internet interplanetária . Em 2002, o projeto ICO, combinando satélites de órbitas alta, média e baixa, oferecerá acesso à Internet em alta velocidade. Em 2005, deve entrar em operação o sistema Teledesic, com 288 satélites de órbita baixa, que permitirá acesso em banda larga e aplicações multimídia.
GHz, banda Ka, ICO… Parece complicado, não? Mas, para nossos filhos, talvez tudo isso se torne coisa corriqueira. É provável que, por trás de todas as siglas, números e termos técnicos aparentemente obscuros, eles descubram, na verdade, um jeito cada vez mais fácil de se comunicar e de levar o cotidiano. Difícil mesmo poderá ser, num dia qualquer daqui a alguns anos, responder a uma daquelas perguntas infantis do tipo “papai, o que era telefone?”
Renato Cruz é repórter da Revista Nacional de Telecomunicações