Qual é a diferença entre hipótese, teoria e fato na ciência?
Dizer que uma coisa é "só uma teoria" é um baita elogio. Para demonstrar desprezo genuíno, diga que o pitaco de alguém é "apenas uma hipótese".
Um fato é um dado objetivo sobre o mundo – uma coisa que continua lá mesmo quando ninguém está olhando. Parece óbvio falando assim, mas ainda há quem discuta (rs) o fato de que a Terra é redonda, então é sempre bom revisar.
A evolução biológica também é um fato, e isso é menos óbvio.
Sabemos que as espécies mudam com o passar dos milênios, que os dinossauros, trilobitas ou mamutes existiam antigamente e não existem mais. “Evolução” é só o nome que se dá a esse ir e vir de espécies (não tem a ver necessariamente com a seleção natural de Darwin, que é um dos mecanismos que causa essa mudança. Já havia acadêmicos que discutiam a evolução antes de Darwin nascer).
Hipótese também é fácil de explicar: trata-se de um palpite, um chute. Você vê algo acontecer e propõe que aconteceu por um motivo.
É claro que qualquer um pode bolar uma hipótese sobre qualquer acontecimento, mas também é claro que, se você é um cientista especializado em uma área, você terá muito mais conhecimentos e ferramentas para levantar suas hipóteses.
Deixei a teoria por último porque ela é algo mais cabeludo de explicar. No cotidiano, a pobrezinha é tratada e desprezada como sinônimo de hipótese, o que não poderia estar mais longe da verdade. Um teoria é um jeito testado e aprovado de explicar uma coisa. Portanto, ela só pode aparecer depois que você testou e aprovou (ou não) um monte de hipóteses.
As equações da teoria da relatividade geral de Einstein, por exemplo, permitem calcular a órbita de qualquer planeta, ao redor de qualquer estrela, em qualquer lugar do Universo. Para quem sabe usá-las, essas equações são como robozinhos que engolem fatos (o planeta tal tem o tamanho tal, a massa tal, a velocidade de rotação tal) e cospem um outro fato (ele estará em tal lugar no futuro).
Nem toda teoria nasceu com uma infraestrutura matemática. Darwin deduziu que as adaptações dos seres vivos a seus habitats são produto da seleção natural. Hoje, há equações que descrevem o fluxo de genes de geração para geração, mas elas só nasceram nos anos 1930, décadas depois. O importante é que a ideia de Darwin tem grande poder explicativo e preditivo.
Antes de Darwin, cada bicho ou planta era um mistério à parte. Depois de Darwin, descobrimos que toda a biodiversidade é um fenômeno só, unificado. Sabemos que, se você expor um conjunto de bactérias a um antibiótico, a maioria delas vai morrer, e vão se reproduzir apenas algumas que são resistentes ao remédio. Logo, toda a população será de bactérias resistentes.
Perceba: o raciocínio da seleção natural é capaz de prever corretamente o que acontecerá em um experimento de laboratório (e o que está acontecendo hoje nos hospitais). Ou seja, ele dá estofo para levantar hipóteses. Fica muito mais fácil dar um chute sobre o que vai acontecer se esse chute é baseado em uma teoria.
“Teorias e fatos são coisas diferentes, não degraus em uma hierarquia de menor certeza para maior certeza”, escreveu o paleontólogo Stephen Jay Gould. “Fatos são dados sobre o mundo. Teorias são estruturas de ideias para explicar e interpretar os fatos. Os fatos não vão embora quando os cientistas debatem teorias rivais para explicá-los. A teoria da gravitação de Einstein entrou no lugar da de Newton, mas as maçãs não ficaram suspensas no ar, esperam a resolução desse debate para cair.”