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Por Alexandre Versignassi
Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.
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O conceito de “país” é uma ilusão. Aproveitemos

Não apenas o esporte é um exercício de ludismo. A ideia de que identidade nacional também é ilusória. E isso é ótimo.

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Atualizado em 27 jul 2018, 17h48 - Publicado em 25 jul 2018, 14h19

A ideia era levar um pedaço de carne recém-caçada até o outro lado de um descampado. Eram dez, onze caras com esse intuito. No meio do caminho, porém, havia uma pedra. Mais do que uma pedra: era outro bando, igualmente numeroso, de homens secos para roubar a comida. Os membros do grupo, então, passavam a carne um para o outro, de modo a confundir os ladrões.

Mais hora, menos hora, porém, a outra turma lograva surrupiar o alimento, e os papéis se invertiam: agora era o segundo bando que tentava levar a carne na direção oposta, enquanto o primeiro fazia de tudo para tê-la de volta. Nesse vaivém, às vezes um grupo conseguia frustrar todas as tentativas de assalto do outro, atravessava magistralmente o campo e depositava a carne do outro lado. Aí começavam tudo de novo, com outro pedaço de carne.

Aconteceram 64 contendas desse tipo na Rússia entre junho e julho. Eram 32 bandos. Cada um vestindo a camisa de uma nação diferente. No papel do pedaço de carne, uma bola. Um jogo de futebol, afinal, não passa de um simulacro de conflitos ancestrais – por alimento, por território, por sobrevivência. Quando o futebol é o americano, nem há tanta simulação assim: a “caça” corre de mão em mão, e o objetivo é chegar ao fim do campo abraçado a ela. No nosso futebol, há a sofisticação de usar só os pés, e o objetivo um tanto mais complexo de depositar a bola dentro de uma rede. A essência, porém, é a mesma: emular batalhas. Batalhas tão profundamente gravadas em nosso DNA que só o ato de assistir às simulações delas basta para bombar a produção de adrenalina, cortisol, endorfinas. Mas claro: tudo não passa de um exercício de imaginação.

Só que o futebol em si não é a única coisa imaginária numa Copa. O próprio conceito de “nação” é uma ilusão coletiva. Sim. Como lembra o historiador Yuval Harari, em seu livro Sapiens: “É impossível que cada um dos membros de uma nação conheça uns aos outros da mesma maneira que os aldeães se conheciam no passado. [O conceito de nação] nos leva a imaginar que milhões de estranhos pertencem à mesma comunidade que nós, que todos temos um passado em comum, interesses em comum e um futuro em comum. Não se trata de uma mentira. Trata-se de imaginação”.

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Um país, portanto, é só o simulacro de uma aldeia. Então podemos fazer de cada um o que bem entendermos. Um desses simulacros pode ter o nome de “França” e usar o sucesso de seu time de futebol multiétnico para dar um basta na xenofobia. Outro pode se chamar “Brasil”, e substituir a cultura da malandragem, do levar vantagem em tudo, por mais preocupação com o bem-estar alheio, não importando a cor ou a orientação sexual de cada um, e de cada outro. No fim, a construção de uma realidade melhor é o único jogo para valer. O resto é passatempo.

*Esta é a Carta ao Leitor da SUPER de agosto

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