A gente usa apenas 10% do nosso cérebro
Embora algumas áreas cerebrais fiquem ociosas de vez em quando, todo mundo utiliza 100% do órgão para viver
Texto Reinaldo José Lopes
Eis aqui uma cascata de origem para lá de duvidosa. Ninguém sabe direito como surgiu o mito de que a maioria das pessoas usa só 10% do cérebro ao longo da vida. Há quem atribua essa ideia ao psicólogo americano William James. No final do século 19, ele escreveu: “Estamos fazendo uso de apenas uma pequena parte de nossos recursos mentais e físicos”. Outros preferem atribuí-la a um dos maiores gênios da história, o físico alemão Albert Einstein – embora nenhum historiador ou biógrafo assine embaixo.
Seja lá quem tenha inventado essa história, o fato é que muitos picaretas à solta por aí vivem prometendo ajuda para desenvolver os “90% adormecidos” da mente. Usando a totalidade do seu poder cerebral, você ganharia superpoderes. Seria capaz, por exemplo, de mover objetos usando apenas a força da mente. Conquistaria com a maior facilidade a mulher que quisesse. Ou descobriria como ficar milionário. Quanta besteira.
Potencial oculto?
A ciência já comprovou: todo mundo com funções cerebrais normais utiliza 100% do cérebro diariamente, ao longo de toda a vida. O órgão está sempre ativo, mesmo em situações aparentemente ociosas, como dormir ou assistir à TV. O que muda de pessoa para pessoa não é a atividade geral das grandes regiões cerebrais, mas a maneira como as conexões entre determinados conjuntos de neurônios (células nervosas) vão sendo ativadas e fortalecidas. É a estrutura dinâmica dessas conexões que influi em processos como a memória e o aprendizado.
A prova de que não existe uma grande área de potencial oculto no cérebro humano vem dos estudos funcionais desse órgão, feitos com a ajuda de aparelhos de ressonância magnética ou de tomógrafos. Essas engenhocas, indispensáveis para os neurologista de hoje, conseguem medir o fluxo de sangue e nutrientes que passa pela massa de neurônios num ritmo que se aproxima do tempo real. Mais ou menos como um carro, as áreas cerebrais em atividade “bebem” mais combustível para manter seu funcionamento. O resultado é que a circulação dessas substâncias, acompanhada pelos cientistas em monitores digitais, revela em detalhes quais pedaços do cérebro estão ativos.
Lógica da evolução
Além dos dados obtidos nos estudos funcionais, outro forte argumento em favor da ideia de que usamos 100% do órgão é a lógica da evolução. Nosso cérebro chega a consumir 20% de toda a energia de que precisamos para continuar vivos. Isso é uma enormidade! Por que a natureza passaria milhões de anos tornando-o maior e mais complexo se o homem só utilizasse 10% dele? O cérebro consome toda essa energia justamente porque trabalha muito, sem parar – cada pedaço com as suas funções.
É por isso que uma das piores coisas que podem acontecer a qualquer pessoa é uma lesão que inutilize parte do cérebro. Muita gente consegue compensar ao menos parcialmente esse tipo de problema, com outras regiões do órgão assumindo as funções da que foi danificada. Mas é relativamente raro que esse efeito compensatório seja completo.
100% humano
A evolução não teria nos dado um cérebro tão grande e complexo se fosse para usarmos apenas um décimo de sua capacidade.
CENTRAL DE COMANDO
O cérebro é o órgão mais complexo do corpo humano. Como cada parte controla uma ou mais funções do nosso organismo, não faz sentido a ideia de que usamos apenas 10% dele.
MASSA ENCEFÁLICA
Num homem adulto, o cérebro pesa, em média, 1,4 quilo. Ou seja: se reduzíssemos seu tamanho em 90%, restariam só 140 gramas de massa encefálica.
OVELHA NA CABEÇA
Reduzido a 10% de seu tamanho, nosso cérebro seria equivalente ao de uma monótona ovelha – talvez um dos bichos mais estúpidos do reino animal. Ou, na melhor das hipóteses, ao de um macaco babuíno.
FONTE: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE (UFF).
A todo vapor
O cérebro humano trabalha sem parar, até quando estamos dormindo, e cada parte responde por uma ou mais funções do nosso corpo
LOBO FRONTAL
Habilidades motoras e voluntárias (incluindo a fala); funções cognitivas como percepção e juízo.
CÓRTEX MOTOR
Coordena a motricidade voluntária (movimentos de face, boca, braços, mãos, tronco, pernas e pés).
CÓRTEX SENSITIVO
Interpreta dados sensoriais; controla sensações de toque, pressão, dor, temperatura, vibração.
LOBO PARIETAL
Responsável pela sensibilidade somática (dor, temperatura, tato), orientação espacial e noção de profundidade.
LOBO OCCIPITAL
Recebe e processa informações visuais enviadas diretamente dos olhos.
ÁREA DE BROCA
Processa a linguagem por meio do controle dos músculos que criam os sons (boca, lábios e laringe).
LOBO TEMPORAL
Audição, compreensão da linguagem falada, olfato, memória, comportamento emotivo.
MEDULA OBLONGA
Respiração, batimento cardíaco e quase todas as demais funções involuntárias do corpo humano
CEREBELO
Manutenção do equilíbrio e da postura corporal; controle de movimentos voluntários; aprendizagem motora (andar, correr, pular).
ÁREA DE WERNICKE
Compreensão de informações sensoriais – visuais e auditivas – associadas à linguagem.