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A geometria do cafezinho na ausência de gravidade

Numa nave espacial, os líquidos podem se rebelar e assumir formas estranhas

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h50 - Publicado em 22 jul 2009, 22h00

Luiz Barco

Tempos atrás, ao tomar um cafezinho com alguns de meus alunos, propus que transformássemos a cantina da universidade em uma nave espacial a caminho de Marte. Supondo que naquele momento estivéssemos sujeitos a uma quase ausência de gravidade, perguntei:

– Nessa situação, o que vocês acham que aconteceria com este cafezinho?

Ao fazer a pergunta, eu tinha na cabeça uma questão colocada por Ivars Peterson em um artigo para a revista americana de divulgação científica Science News. Ele imaginava alguém num ônibus espacial ou numa futura estação orbital, diante de uma convidativa xícara de café quente. O líquido em seu recipiente mostrava uma superfície tranqüila, plácida, quase plana. Mas se não houvesse gravidade, o comportamento do líquido entraria num domínio estranho e inexplorado.

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Um estudo das equações matemáticas definindo formas de superfícies de líquidos na ausência de gravidade sugere que, dependendo da geometria do recipiente, o líquido pode desenvolver uma curiosa superfície curva que reproduz em miniatura o contorno abrupto de uma rampa de esqui. Em alguns recipientes, prevê-se que o líquido pode se arrastar ao longo das paredes até conseguir se escoar. No caso do café, quem sabe, até saltar direto para a boca do consumidor (veja figura 1).
Peterson conta que, em 1992, os matemáticos Paul Concus, do Laboratório Lawrence Berkeley, na Califórnia, Robert Finn, da Universidade Stanford, também na Califórnia, se juntaram ao engenheiro Mark Weislogel, do Centro de Pesquisas Lewis da NASA, em Cleveland, esperando obter uma resposta parcial sobre o comportamento dos líquidos na ausência de gravidade.

Entre vários experimentos feitos a bordo do ônibus espacial Columbia, um se referia a superfícies líquidas. Essa é, de fato, uma área de estudo valiosa para o programa espacial. Os engenheiros espaciais precisam entender de que maneira os fluidos – como os combustíveis líquidos armazenados em tanques de geometrias variadas – se comportam em situações de baixa gravidade. Também querem saber se a teoria matemática prevê adequadamente esse comportamento.

Concus e Finn começaram a trabalhar juntos, procurando a forma da superfície que se obteria quando um certo volume de líquido ocupasse parcialmente um recipiente com um determinado tipo de geometria. A busca depende de um dado denominado “ângulo de contato”, que mede como a superfície do líquido encontra a superfície interna do recipiente. Problemas como esse são complicados e ainda não existem respostas precisas, a não ser para algumas formas simples como cilindros e esferas. É claro que isso deixa uma enorme variedade de formas geométricas de fora, disponíveis para futuras investigações. Os testes indicam que os pesquisadores estão no caminho certo. Mas as previsões da Matemática e as simulações feitas em computadores têm levado a resultados intrigantes. Confirmá-los na prática exige muita imaginação.

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Um bom exemplo de imaginação foi fazer uma seqüência de fotos de um recipiente de base hexagonal, em queda livre, com um líquido dentro. Em queda livre, o líquido não sofria a ação da força da gravidade para segurá-lo dentro do recipiente. Graças a essa seqüência de fotos, os cientistas comprovaram as equações que previam que os líquidos podem fluir em recipientes com cantos agudos ou quinas.

Concus e Finn descobriram que, quando a gravidade é deixada de lado, o comportamento de superfícies de líquidos confinados em recipientes de diversos formatos assume enorme variedade de formas. Uma das mais estranhas ocorre se imaginarmos um recipiente cilíndrico com uma espécie de cintura abaulada (veja figura 2). Ao atingir esse bojo, há uma mudança de “ângulo de contato”, propiciando uma grande variedade de superfícies do líquido.

Isso mostra que não tem sido fácil a tarefa dos engenheiros de cavar o interior de blocos plásticos acrílicos para obter com precisão os recipientes cuja forma havia sido projetada pelos matemáticos. E muito menos obter líquidos com viscosidade adequada para filmar seu comportamento dentro dos recipientes. São esses homens que constroem uma ciência de primeira qualidade com o auxílio de alta matemática, mais próxima da imaginação das crianças do que certos currículos escolares.

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