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A próxima pandemia já chegou para os animais

Nos últimos três anos, a cepa H1N5 – a gripe aviária – matou milhões de aves e conseguiu saltar para várias espécies de mamíferos. Entenda essa ameaça.

Por Diana Bell
Atualizado em 1 abr 2024, 12h28 - Publicado em 29 mar 2024, 18h00

Diana Ross é especialista em biologia da conservação na Universidade de East Anglia. O texto abaixo saiu originalmente no site The Conversation, que publica artigos escritos por pesquisadores. Vale a visita.

Sou uma bióloga conservacionista que estuda doenças infecciosas emergentes. Quando as pessoas me perguntam qual será a próxima pandemia, costumo dizer que já estamos no meio de uma, mas que ela está afetando muitas espécies além da nossa.

Estou me referindo à cepa altamente patogênica da influenza H5N1 (HPAI H5N1), também conhecida como gripe aviária, que matou milhões de aves e um número desconhecido de mamíferos, particularmente nos últimos três anos.

Essa cepa surgiu em gansos domésticos na China em 1997 e rapidamente passou para os seres humanos no Sudeste da Ásia, com uma taxa de mortalidade de cerca de 40-50%. Meu grupo de pesquisa encontrou o vírus quando ele matou um mamífero, um civeta de palmeira de Owston (Chrotogale owstoni, uma espécie de carnívoro parecida com um gato selvagem), ameaçado de extinção, em um programa de reprodução em cativeiro no Parque Nacional Cuc Phuong, no Vietnã, em 2005.

Nunca foi confirmado como esses animais contraíram a gripe aviária. Sua dieta é composta principalmente de minhocas, portanto, eles não foram infectados pela ingestão de aves doentes, como muitos tigres em cativeiro na região.

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Essa descoberta nos levou a reunir todos os relatos confirmados de infecção fatal por gripe aviária para avaliar o quão ampla é a ameaça que esse vírus pode representar para a vida selvagem.

Foi assim que um vírus recém-descoberto em aves domésticas chinesas passou a ameaçar grande parte da biodiversidade do mundo.

Os primeiros sinais

Até dezembro de 2005, a maioria das infecções confirmadas havia sido encontrada em alguns zoológicos e centros de resgate de animais na Tailândia e no Camboja. Nossa análise em 2006 mostrou que quase metade (48%) de todos os diferentes grupos de aves (conhecidos pelos taxonomistas como “ordens”) tinha uma espécie na qual uma infecção fatal de gripe aviária havia sido relatada. Essas 13 ordens compreendem 84% de todas as espécies de aves.

Há 20 anos, concluímos que as cepas de H5N1 em circulação provavelmente eram altamente patogênicas para todas as ordens de aves. Mostramos também que a lista de espécies infectadas confirmadas incluía aquelas que estavam globalmente ameaçadas e que habitats importantes, como o delta do Rio Mekong, no Vietnã, ficavam próximos aos surtos de aves relatados.

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Os mamíferos conhecidos por serem suscetíveis à gripe aviária no início dos anos 2000 incluíam primatas, roedores, porcos e coelhos. Foi relatado que grandes carnívoros, como tigres-de-bengala e leopardos-nebulosos, foram mortos, bem como gatos domésticos.

Nosso estudo de 2006 mostrou a facilidade com que esse vírus cruzou as barreiras entre espécies e sugeriu que ele poderia um dia produzir uma ameaça em escala pandêmica à biodiversidade global.

Infelizmente, nossos alertas estavam corretos.

Uma doença itinerante

Duas décadas depois, a gripe aviária está matando espécies do alto Ártico à Antártica continental.

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Nos últimos dois anos, a gripe aviária se espalhou rapidamente pela Europa e se infiltrou nas Américas do Norte e do Sul, matando milhões de aves domésticas e uma variedade de espécies de aves e mamíferos. Um artigo recente constatou que 26 países relataram pelo menos 48 espécies de mamíferos que morreram devido ao vírus desde 2020, quando começou o último aumento de infecções relatadas.

Nem mesmo o oceano está a salvo. Desde 2020, 13 espécies de mamíferos aquáticos sucumbiram, incluindo leões-marinhos, botos e golfinhos americanos, muitas vezes morrendo aos milhares na América do Sul. Uma grande variedade de mamíferos predadores e necrófagos que vivem em terra agora também são confirmados como suscetíveis, incluindo leões da montanha, linces, ursos marrons, negros e polares.

Só o Reino Unido perdeu mais de 75% de seus grandes mandriões e registrou um declínio de 25% nos gansos-patola do norte (também conhecidos como atobá-boreal). Os declínios recentes nas populações de andorinhas-do-mar-de-sanduíche (35%) e das andorinhas-do-mar-comuns (42%) também foram em grande parte causados pelo vírus.

Os cientistas ainda não conseguiram sequenciar completamente o vírus em todas as espécies afetadas. A pesquisa e a vigilância sanitária contínua podem nos dizer o quão adaptável ele se tornará e se poderá atingir ainda mais espécies. Sabemos que ele já pode infectar humanos – mas uma ou mais mutações genéticas podem torná-lo ainda mais infeccioso.

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Na encruzilhada

Entre 1º de janeiro de 2003 e 21 de dezembro de 2023, foram registrados 882 casos de infecção humana pelo vírus H5N1 em 23 países, dos quais 461 (52%) foram fatais.

Desses casos fatais, mais da metade ocorreu no Vietnã, China, Camboja e Laos. As transmissões do vírus de aves para humanos foram registradas pela primeira vez no Camboja em dezembro de 2003. Casos intermitentes foram registrados até 2014, seguidos por um intervalo até 2023, resultando em 41 mortes em 64 casos. O subtipo do vírus H5N1 responsável foi detectado em aves domésticas no Camboja desde 2014. No início dos anos 2000, o vírus H5N1 que circulava tinha uma alta taxa de mortalidade entre seres humanos. Portanto, é preocupante que agora estejamos começando a ver pessoas morrendo após o contato com aves novamente.

Não são apenas os subtipos H5 da gripe aviária que preocupam os seres humanos. O vírus H10N1 foi originalmente isolado de aves selvagens na Coreia do Sul, mas também foi relatado em amostras da China e da Mongólia.

Pesquisas recentes descobriram que esses subtipos específicos de vírus podem ser capazes de passar para os seres humanos depois de terem sido considerados patogênicos em camundongos de laboratório e furões. A primeira pessoa confirmada como infectada pelo H10N5 morreu na China em 27 de janeiro de 2024, mas esse paciente também estava sofrendo de gripe sazonal (H3N2). Ele havia sido exposto a aves domésticas vivas que também testaram positivo para H10N5.

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Espécies ameaçadas de extinção estão entre as que morreram devido à gripe aviária nos últimos três anos. As primeiras mortes causadas pelo vírus na Antártica continental acabaram de ser confirmadas em mandriões, destacando uma ameaça iminente às colônias de pinguins, cujos ovos e filhotes são predados pelos mandriões. Pinguins de Humboldt também já foram mortos pelo vírus no Chile.

Como podemos conter esse tsunami de H5N1 e outras gripes aviárias? Reformular completamente a produção de aves em escala global. Tornar as granjas autossuficientes na criação de ovos e pintinhos, em vez de exportá-los internacionalmente. A tendência de criação de megagranjas com mais de um milhão de aves deve ser interrompida imediatamente.

Para evitar os piores impactos deste vírus precisamos revisitar sua origem principal: as incubadoras de granjas de criação intensiva de aves.The Conversation

Este artigo foi republicado do The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original.

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