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Análise de genomas revela como os primeiros cães acompanharam migrações humanas

Um estudo sobre a evolução dos cachorros traçou as rotas migratórias dos primeiros pais de pet – e descobriu os locais de origem do genoma de algumas raças contemporâneas. Os samoiedas, por exemplo, têm genes europeus, americanos e siberianos.

Por Carolina Fioratti
30 out 2020, 17h23

Que o cão é o melhor amigo do homem, já estamos cansados de ouvir. Esses bichinhos domesticados se tornaram membros de nossas famílias, mas nós sabemos muito pouco sobre a origem pré-histórica e o posterior fortalecimento desse vínculo. Qual era a aparência das primeiras raças? Todos os cachorros evoluíram a partir de um único ancestral comum ou houve mais de um evento de domesticação? Um artigo publicado nesta quinta-feira (29) no periódico Science joga uma luz inédita sobre o tema. 

A equipe de pesquisadores analisou amostras de DNA extraídas de mais de dois mil ossos e dentes de cães da Europa, da Sibéria e do Oriente Médio. Esses genomas, que tinham no máximo 10.900 anos, foram obtidos em diversas escavações arqueológicas e fornecidos por pesquisadores e curadores de museus envolvidos no estudo.

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Crânio de um cão que viveu há 10.900 anos, encontrado no noroeste da Rússia. Essa foi a amostra mais antiga analisada pelos pesquisadores. O crânio ao lado pertence a um lobo contemporâneo das estepes russas, e foi inserido na montagem para fins de comparação.  (E.E. Antipina/Divulgação)

 

Feita a coleta, os pesquisadores comparam o DNA canino com o genoma de 17 humanos que viveram nos mesmos lugares e épocas que os mascotess. Anders Bergstrom, autor do estudo e pesquisador do Instituto Francis Crick, na Inglaterra, explica que, “ao estudar como os genomas de diferentes partes do mundo são semelhantes entre si – e como essas relações mudam com o tempo –, podemos aprender sobre os movimentos e mudanças passadas dos cães e como eles se relacionam com a história humana”.

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Bergstrom exemplifica com os próprios resultados: “sabemos que, depois que a agricultura foi adotada na Mesopotâmia e no Levante, houve um movimento de pessoas para a Europa. Em nosso estudo, verificamos que mudanças semelhantes ocorreram nas populações de cães, sugerindo que esses primeiros criadores trouxeram seus animais com eles quando migraram para a Europa”. 

Nem sempre, porém, os cães chegavam a novas terras como companheiros de viagem. Também era comum que os primeiros humanos agricultores, conforme se espalhavam do atual território do Iraque para o mundo, adotassem pets locais, domesticados previamente pelos povos caçadores-coletores nativos de cada região. Por exemplo: humanos imigrantes que alcançaram o território alemão há 7 mil anos dividiram espaço com cães de DNA europeu e siberiano, que já estavam lá de antemão. 

De onde vem? 

Tudo indica que os cães evoluíram dos lobos. Em um momento indeterminado do passado, um grupo de lobos mais tranquilos se aproximou de caçadores em busca de restos de alimento. Os humanos, por sua vez, viram vantagens em ter carnívoros ferozes protegendo-os. Óbvio que isso não aconteceu da noite para o dia. Foi seleção natural: lobos que nasciam mais dóceis tinham mais chance de conseguir sobras, e assim prosperavam. Com o tempo, a estratégia deu origem aos animais simpáticos que conhecemos.

Nossas melhores evidências arqueológicas sugerem que isso ocorreu há pouco mais de 15 mil anos. Os fósseis de cachorro mais antigos que se conhece foram encontrados na Alemanha e datam dessa época, alguns milênios antes da invenção da agricultura. “Cães e lobos ainda são muito próximos geneticamente, mas os cães evoluíram rapidamente para uma vida ao lado dos humanos”, diz Bergstrom.

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Essa mudança acelerada no comportamento e na aparência – um alienígena não acreditaria que um pug e um lobo são essencialmente o mesmo animal – foi fruto de duas forças. Uma é a seleção artificial: os seres humanos se esforçam ativamente para selecionar (e então reproduzir) os exemplares de cachorro que fossem mais habilidosos em certas tarefas ou que tivessem certos traços físicos.

Antes disso, porém, houve uma seleção mais inconsciente contra a agressão, que manteve apenas os pets mais dóceis e companheiros. Greger Larson, co-autor do estudo, explicou à Science que, nos primeiros milênios de aproximação entre lobos e pessoas, qualquer demonstração de agressividade seria suficiente para que os humanos expulsassem os cães de seu convívio. Apenas os mais fofos sobreviviam. 

Há 11 mil anos, já existiam cinco linhagens distintas de cachorros, as quais deram origem aos mascotes do Oriente Médio, da Europa, da Sibéria, da Nova Guiné e das Américas. Um gráfico elaborado pelos pesquisadores mostra as regiões “de origem” de algumas raças e quais assinaturas genéticas elas trazem. Veja abaixo:

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Mapa mostra as fontes de ancestralidade dos cães domésticos modernos. (BERGSTROM ET AL., SCIENCE/Divulgação)

A equipe pretende continuar analisando o genoma dos cães. Em conjunto, devem estudar crânios antigos e marcadores genéticos que podem indicar a aparência destes primeiros animais. 

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