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Até tu, Brutus?

Sabia que você pode estar inspirando moléculas exaladas por Júlio César quando disse a frase do título deste artigo?

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h54 - Publicado em 31 jan 1997, 22h00

Luiz Barco

Tenho sido convidado a falar para as mais diferentes platéias e não raro sou surpreendido por perguntas inesperadas. Uma delas foi feita recentemente por uma jovem estudante, em Suzano, na Grande São Paulo. Ela perguntou-me se é muito alta (cerca de 99%) a chance de você inalar, enquanto lê este artigo por exemplo, uma das moléculas que Júlio César exalou quando estava ferido de morte e disse “Até tu, Brutus”. Isso, claro, parte do pressuposto de que Shakespeare foi fiel no relato da última fala de Júlio César.

Confesso que não fiz as contas, mas percebi que ela lera (ou fora informada por alguém que leu) um livro muito bom e interessante que a editora Nova Fronteira, do Rio de Janeiro, publicou em 1994. Falo de Analfabetismo em Matemática e suas Conseqüências, de John Allen Paulos. De passagem, eu recomendaria que, se tiverem chance, leiam esse belo livro. Será uma maneira agradável e estimulante de melhorar a capacidade de pensar certos assuntos. Mas vamos à resposta.

Primeiro, me parece justo realçar que o autor, Paulos, está considerando que nesses mais de vinte séculos as moléculas exaladas por Júlio César estão uniformemente espalhadas pelo planeta e que, na sua maioria, continuam livres na atmosfera. É bom que você saiba que esses pressupostos são bastante razoáveis, segundo o conhecimento científico atual.

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Leve em conta também o fato de que um dado desses usados em jogos e não-viciado (um cubo homogêneo cujo centro de massa coincide com o centro geométrico) apresenta uma chance em seis (1/6) de exibir a face quatro num lançamento. Ora, se existem n moléculas de ar no mundo – e Paulos usa n valendo 1044, o que é uma decisão coerente – e se Júlio César exalou k moléculas, então a probabilidade de uma delas estar sendo inalada por você é de k/n. Conseqüentemente a probabilidade complementar, ou seja, a de você não estar inalando nenhuma daquelas moléculas é de 1 – k/n.

Vamos lembrar do princípio multiplicativo aplicado às probabilidades. Se é verdade que a chance de obtermos um quatro no lançamento de um dado é de 1/6, a de não obtermos um quatro será 5/6, pois 1 – 1/6 = 5/6. Se lançarmos tal dado duas vezes, a chance de não obtermos nenhum quatro será de 25/36, pois 5/6 X 5/6 = 25/36. Assim, em três lançamentos a probabilidade de não dar quatro é (5/6)3. E se forem feitos p lançamentos, a chance será (5/6)p.

Dessa forma, se a probabilidade de nenhuma das moléculas que você está inalando ser uma daquelas exaladas por Júlio César – ou mesmo por

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Goethe, que ao morrer disse “Mais luz”, ou por Jesus de Nazaré, que falou “Pai, perdoai-os, eles não sabem o que fazem” – é de 1 – k/n. Então, se você inalar p moléculas é razoável concluir que a chance de nenhuma delas provir de uma das famosas exaladas de celebridades no momento de suas mortes é da ordem de (1 – k/n)p. Saiba que é razoável considerarmos tanto k quanto p, isto é, o número de moléculas exaladas por alguém e o número de moléculas inaladas por você numa inspiração, como da ordem de 2,2 X 1022. Portanto, a probabilidade de você ter inalado pelo menos uma das moléculas exaladas pelo grande Júlio César é dada pela probabilidade do evento complementar. Ou seja: 1 – (1 – k/n)p e isso resulta em algo pouco maior do que 99%.

Genial, não? Só não é lá muito agradável pensar que o mesmo vale para as moléculas exaladas por todos os bárbaros que a História registra e até para alguns bem recentes e, infelizmente, nossos conhecidos.

Luiz Barco é professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo

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