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Cientistas brasileiros decidem o “indecidível”

Artigo de Luiz Barco sobre estudos notáveis de dois matemáticos brasileiros.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h49 - Publicado em 31 Maio 1992, 22h00

Luiz Barco

Freqüentemente, tenho escrito para SUPERINTERESSANTE inspirado em notas e artigos publicados em revistas científicas de renome internacional. Não raro, cito come fonte inspiradora o matemático inglês Ian Stewart, especializado na área dos sistemas dinâmicos, do caos e das catástrofes, que costuma escrever para a célebre revista inglesa Nature. Folheando números antigos dessa revista, deparei com um artigo de Stewart, de agosto do ano passado, sobre investigações recentes de dois brasileiros: Newton C. A. da Costa, da Universidade de São Paulo, e Francisco A. Dória, da Universidade Federal do Riu de Janeiro.

Sempre que se faz uma descoberta importante, de repercussão internacional, nu domínio de qualquer ciência, a revista Nature registra. Isso significa não só uma grande honra para qualquer pesquisador, mas também lhe confere prestígio e reconhecimento — e foi a primeira, vez que dois brasileiros, na área de ciências exatas., mereceram esse destaque. Por coincidência, Ian Stewart trabalhava no mesmo tema que os dois brasileiros e buscava os mesmos resultados. Newton da Casta é um lógico de prestígio internacional, especialmente conhecido por ter criado a lógica para consistente, ou seja, um novo tipo de lógica não-clássica na qual as contradições não são excluídas a priori. Dória, por sua vez, é um físico que tem trabalhado com questões de Física Teórica e Matemática.

Nos últimos anos, ambos têm se dedicado principalmente aos fundamentos da Física, á metateoria dos sistemas dinâmicos e à teoria do caos. Seus trabalhos já tinham sido publicados em revistas internacionais especializadas em Física e, desde o princípio, seus resultados nessas áreas chamaram a atenção de especialistas come M. Hirsch, l. Bloon e o próprio Stewart. Essencialmente, os brasileiros descobriram novos métodos para provar que teorias em princípio formalizáveis são indecidiveis e incompletas. Na verdade, eles generalizaram e estenderam métodos que se originaram nas obras de lógicos ou matemáticos como o austríaco Kurt Gõdel (1906-1978), ou o inglês Alan Mathison Turing (1912-1954).

Os resultados a que chegaram da Costa e Dória são demasiadamente técnicos e difíceis para serem relatados aqui. Porém, pode-se apresentar uma idéia ainda que vaga de algumas das coisas que eles obtiveram. Um dos grandes problemas que resolveram é conhecido na literatura especializada como “problema de Hirsch”. Um sistema físico é definido normalmente por um conjunto de equações diferenciais. Tais sistemas podem ser caóticos (praticamente imprevisíveis) ou não. O problema de Hirsch é, então, o seguinte: exista um algoritmo (processo de cálculo ou resolução de problemas semelhantes em que se estipulam regras para a obtenção do resultado) que pode nos dizer, dadas as equações que definem um sistema físico qualquer, se o sistema é caótico ou não? Dória e da Costa provaram que a solução é negativa.

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Outro resultado surpreendente foi a generalização que os cientistas brasileiros demonstraram do teorema de Gödel. Em termos não muito precisos, eles provaram chie qualquer teoria física forte, satisfazendo certas condições hem simples, contém proposições com sentido físico (mesmo que seja apenas teórico) que não são demonstráveis nem refutáveis na teoria. Em compensação, eles estenderam os limites usuais da teoria da computação—baseada nas idéias de Turing e outros — e provaram que, na nova concepção da teoria da computação desenvolvida por eles, praticamente todas as teorias matemáticas usuais são decidíveis. Isto é, existe um método algorítmico generalizado, ou máquina generalizada mais forte que as máquinas comuns de Turing, que pode decidir se uma proposição qualquer da teoria é demonstrável ou não. Ao lado da natural alegria de ver dois brasileiros serem reconhecidos internacionalmente, a nota da revista Nature me devolve um pouco da fé nos nossos cientistas, que, sem dúvida, estão a merecer mais atenção dos governantes deste país em construção.

Luiz Barco é professor da Escola de Comunicação de São Paulo

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