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Do mundo para Caxambu, de Caxambu para o mundo

No final de agosto passado, a pacata cidade mineira, famosa por suas águas termais, foi invadida por mais de 1 500 cientistas do Brasil e do exterior. Eles participaram do grande encontro da Federação de Sociedades de Biologia Experimental, a Fesbe, dispostos a trocar mais de duas mil experiências

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h46 - Publicado em 30 set 1992, 22h00

O florido Parque das Águas, em que se espalham as famosas fontes locais, ficou praticamente vazio; os funcionários das termas, geralmente muito movimentadas, experimentaram cinco dias de sossego, entre 26 e 30 de agosto passado. Afinal, não havia vagas nos hotéis para os turistas típicos, que visitam Caxambu, em Minas Gerais, em busca de saunas, banhos medicinais e goles de água mineral: a cidade foi invadida por mais de 1 500 cientistas, que lotaram suas ruas. Eles andavam em bandos, atropelando as charretes e sempre discutindo variações sobre o mesmo tema — Biologia.

Há cinco anos, os pesquisadores vão ali para participar da reunião da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (Fesbe), que já está em sua sétima edição — as duas primeiras aconteceram em São Paulo e no Rio de Janeiro, respectivamente. O último evento juntou meia dúzia de congressos simultâneos, nas áreas de Biofísica, Farmacologia, Fisiologia, Imunologia, Investigação Clínica e Neurociências. “Sem contar a participação dos bioquímicos que, embora realizem um congresso à parte, sempre apresentam trabalhos”, chama a atenção a farmacologista Regina Markus, professora da Universidade de São Paulo e secretária da Fesbe. “A vantagem para todos nós é poder trocar experiências entre áreas diferentes, mas que, na realidade, se complementam.

“Como nos anos anteriores, a Fesbe trouxe cientistas do exterior, para apresentar conferências. “Por isso, a Fesbe acaba se transformando em um grande intercâmbio internacional”, diz o seu presidente, o farmacologista Sérgio Henrique Ferreira, professor da USP de Ribeirão Preto, São Paulo. “Muitos estudantes têm a chance de mostrar o seu trabalho e, assim, conseguir estágios no exterior.” Em palestras, conferências e painéis, que começavam todo dia pontualmente às 8 horas e só terminavam por volta das 22, foram apresentados mais de 2000 trabalhos, dos quais SUPERINTERESSANTE apresenta uma sugestiva amostra.

Para saber mais:

100 motivos para se orgulhar da ciência brasileira

(SUPER número 1, ano 10)

O sinal químico do autismo

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Um exame ajuda a apressar o início do tratamento dos autistas

No cérebro das crianças com autismo — distúrbio neurológico em que as vítimas parecem se desligar do mundo exterior —, há um excesso de serotonina. Entre outras coisas, a substância participa da transmissão de mensagens nervosas, nas áreas ligadas à percepção sensorial. “No Brasil, não havia nenhuma equipe dosando esse neurotransmissor”, conta a professora Maria da Graça Nafah-Mazzacoratti, chefe do setor de Neuroquímica, da Escola Paulista de Medicina, em São Paulo. Ela e seis colegas compararam a dosagem da serotonina em crianças normais e em autistas, com a chamada cromatografia líquida: “Uma amostra de sangue passa por uma coluna, repleta de um composto químico que tem uma afinidade diferente para cada substância”, descreve Maria da Graça. “Cada componente sangüíneo deve atravessar a coluna em certo período. Como sabemos o tempo em que a serotonina cumpre o percurso, fica fácil quantificá-la.” Com esse método, os pesquisadores estabeleceram o padrão de serotonina nos brasileiros. “Esperamos que os médicos usem logo esse teste. Quanto mais cedo for o diagnóstico do autismo, maiores as chances de se superar o problema”, diz Maria da Graça.

A happy-hour da mãe e a do filho

Não adianta o bebê chorar de fome depois de tomar um drinque, a mãe tem de esperar mais de uma hora, antes de dar-lhe o peito Coordenada pela médica Vilma Aparecida Da Silva, uma equipe da Universidade Federal Fluminense em Niterói, resolveu checar o velho conselho para as mulheres que estão amamentando de se manterem distantes das bebidas alcoólicas. “O álcool na circulação sangüínea passa para o leite e pode prejudicar o bebê”, reconhece o biólogo Marco Barzano. “Mas, desde que a mulher controle o horário da amamentação. não parece haver problemas”, diz ele, para alivio de muitas mães, que se julgavam proibidas de tomar um inocente drinque. Os pesquisadores mediram o álcool no sangue e no leite de doze mulheres que tomaram 120 mililitros de vinho — algo como um copo cheio. O perigo seria elas amamentarem 30 a 45 minutos depois de terem bebido, quando os níveis de álcool eram elevados”, diz Barzano. Mas esses níveis não são mais significantes 80 minutos após os goles de vinho — prazo que as mulheres devem aguardar antes de alimentar os filhos. “Vamos repetir os testes com vodca, uma bebida bem mais forte”, revela Barzano. “Pretendemos descobrir até que ponto a mulher lactante pode beber.

Ratinho maconheiros

Depois de receberem injeções com o principio ativo da maconha, os animais não pararam de bocejar. Será sinal de vicio? Em matéria de drogas, poucas são tão misteriosas quanto a maconha: não se sabe direito nem sequer a região onde ela age no cérebro. Assim como, por enquanto, ninguém consegue afirmar se o seu consumo causaria ou não uma síndrome de abstinência — algum tipo de reação do organismo à interrupção do uso. Persiste a dúvida: será que a maconha vicia? Os cientistas do setor de Psicobiologia da Escola Paulista de Medicina estavam pesquisando o local de ação do chamado delta-8-THC (componente da maconha, considerado um de seus mais importantes princípios ativos), quando observaram um fenômeno curioso: um grupo de ratos, que tomou injeções da substância durante trinta dias, começou a bocejar espontaneamente, depois de serem interrompidas as doses da droga.

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“O efeito sugere que, ao menos em ratos, pode existir uma reação à abstinência”, explica a pesquisadora paulista Ester Nakamura-Palacios, que hoje leciona na Universidade Federal do Espírito Santo. É verdade que os animais receberam doses elevadíssimas da substância ativa — eqüivaleriam às de uma pessoa que fumasse vinte baseados por dia. “É preciso saber ainda se a maconha foi realmente a culpada pelos bocejos”, explica Ester. “Para isso, vou repetir o experimento. Passada uma semana sem a droga. darei novamente as injeções nos ratos. Daí, vai dar para conferir se eles param ou não de bocejar com a volta ao vicio”, diz a pesquisadora. em tom de brincadeira

Num simples piscar de olhos Às vezes, as mãos são quase tão ligeiras quanto o olhar Durante três dias, oito pessoas com visão perfeita freqüentaram a Universidade Federal Fluminense, em Niterói, RJ, para serem voluntárias em uma experiência sobre atenção visual Os resultados do trabalho se aduziram em diversos gráficos, aos visitantes da Fesbe: “Queríamos medir o intervalo que a mão leva para reagir com maior rapidez a um estimulo visual” explica o neurologista Walter Machado-Pinheiro, que representou o grupo de pesquisadores de Niterói. “Para isso, os voluntários deviam fixar os olhos numa cruz luminosa, que aparecia no centro de uma tela”, descreve. “Ao lado da cruz, por sua vez, surgia um pontinho luminoso. que permanecia aceso durante 700 milissegundos. Quando este se apagava, tocava um sinal de bip e, então, acendia-se um segundo ponto. Nesse instante, a pessoa apertava uma tecla.

O tempo que ela demorava para ter essa reação era registrado e analisado por um computador.” Os cientistas testaram intervalos diversos, de 0 (portanto. simultaneamente) e 2 000 milissegundos, entre o apagar do primeiro ponto e o acender do segundo alvo luminoso. Assim, perceberam que as mãos costumam ser muitíssimo rápidas quando o segundo estímulo aparece entre 100 e 200 milissegundos depois de apagar-se a primeira luzinha. “Isso significa que durante esse período a pessoa fica com o que chamamos de atenção solta”, interpreta o pesquisador. “Ou seja, ela está apta a realizar qualquer movimento do corpo na maior velocidade possível. Depois de 200 milissegundos, se não aparece nada que chame a atenção de seus olhos, é como se o cérebro se concentrasse em outras coisas. E, daí, as mãos já não conseguem reagir com a mesma rapidez.

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Inquietos genes do câncer

Se os oncogenes trocam sua seqüência de DNA, pode ser pior para o paciente Pacientes com leucemia podem ter chances de sobrevivência diferentes, conforme as mutações do oncogene N-Ras, um dos genes acusados pela doença. “A seqüência das moléculas de DNA que compõem esses genes pode se alterar ou não”, explica a pesquisadora Mônica Barbosa de Melo, que realizou uma cuidadosa investigação, na Universidade de Campinas, São Paulo. Ela usou a técnica chamada polimerase, ou PCR, capaz de amplificar determinada seqüência genética, tornando possível a sua identificação. “Analisei o oncogene N-Ras de cinqüenta pacientes”, revela. “Há uma incidência de mutação de 15,4%.” Estudos americanos levantam a suspeita de que a leucemia avança mais depressa nesses pacientes, cujos oncogenes se modificaram em relação ao seu modelo original. “No futuro, os médicos vão examinar essas mutações para prever a evolução de um caso de leucemia”, aposta Mônica.

Computador com dor no peito Para ser usado como lição nos cursos de Medicina, um softwar simula atendimentos completas O paciente, 23 anos, se queixa de falta de ar e dor no lado direito do tórax. Diz que se sentia bem, até dois dias atrás, quando começou a tossir sem parar. O médico pode tomar algumas atitudes: iniciar o exame físico dar-lhe um remédio para aliviar a dor, receitar um xarope para tosse ou prosseguir fazendo perguntas. Se fizer a última opção, receberá parabéns — “você precisa conhecer mais detalhes sobre os hábitos dessa pessoa”, aparecerá na tela do computador. A consulta, afinal, faz parte de um programa de simulação, criado por dois alunos do quarto ano de Medicina, na Universidade de Campinas, interior de São Paulo. No Canadá e nos Estados Unidos, os médicos são chamados a cada três anos para consultas simuladas como essa, para provar que se mantêm atualizados.

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A idéia dos campineiros Newton César de Freitas e Renato Torresan porém, é treinar estudantes, como eles, no atendimento de doentes pulmonares — existem grupos na Unicamp trabalhando com a simulação de outros distúrbios. “Selecionamos cinco exemplos típicos de problemas nos pulmões”, conta Freitas. “Mas queremos acrescentar mais casos, além de desenhos para a pessoa apontar na tela o ponto exato em que deve auscultar ou apalpar o paciente, se deseja saber determinada coisa.” Para toda pergunta do estudante-médico, a máquina-paciente tem uma resposta. A simulação acaba durando o tempo real de uma consulta, que passa pelo exame físico e pelo diagnóstico, até o instante de se tomar uma conduta, como receitar um medicamento ou internar. Feito em um videogame, há um score — a pessoa perde ou ganha pontos conforme as respostas. Existem erros, porém, que podem ser fatais: “Se, no final, você prescreve um remédio errado”, diz Torresan “o paciente pode morrer.”

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