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É hora de parar de ir ao zoológico?

Faz sentido deixar um outro ser vivo preso apenas para ser admirado?

Por Ana Luísa Fernandes
Atualizado em 20 jun 2017, 15h37 - Publicado em 7 ago 2015, 18h00

zebra

A vontade de ver de perto uma criatura silvestre tem origem antiga. O biólogo Sérgio Greif explica: “Há indícios de que alguns dos animais mantidos em comunidades pré-históricas não tinham propósitos alimentares, e sim, eram mantidos simplesmente pelo prazer de mantê-los”. Já naquela época os animais ficavam presos para a admiração. Na Idade Moderna, com as Grandes Navegações e a descoberta de novos continentes, as ricas famílias europeias ficaram interessadas nas espécies exóticas das terras distantes. Para completar suas coleções particulares, “importavam” os animais, utilizados como demonstração de riqueza e poder. Em 1515, o Rei D. Manuel, de Portugal, ordenou que levassem até o seu país um rinoceronte da Índia, que foi o primeiro da espécie a pisar em terras lusas desde a época do Império Romano. O bicho causou comoção, e cartas eram enviadas por todo o país, relatando como era a tal criatura “mítica” (achavam que rinocerontes poderiam estar relacionados com unicórinios). O animal foi oferecido como presente ao Papa Leão X, mas acabou morrendo no trajeto. Com o tempo, essas coleções se tornaram o que hoje conhecemos como zoológicos.

Como um peixe fora d’água

Uma das afirmações utilizadas para justificar o cativeiro ainda naquela época perdura até hoje, mais de 500 anos depois. O contato com os animais estreitaria a relação do ser humano com a natureza. Estimulados pelo conhecimento do que nos rodeia, estaríamos mais dispostos a preservar e respeitar a vida selvagem. Parece lógico, certo? Nem tanto. Sérgio completa: “Não acho realmente que aprendemos a respeitar os animais ou a natureza quando os vemos atrás de grades, reduzidos a uma fração do que os indivíduos de sua espécie representam. Acredito mais que uma visita aos zoológicos nos ensina que podemos subjugar, dominar e aprisionar animais”. As amostras que são retiradas da natureza e ficam em cativeiro (ou que já nascem lá) não correspondem à realidade e, mesmo sabendo disso, insistimos na criação de espaços artificiais para tentar reproduzir um comportamento que só pode ser percebido em espaços naturais. “O zoológico não é um meio para conhecer um animal em sua essência. A não ser que seja para estudar neuroses de cativeiro”, comenta a bióloga Marcela Godoy, professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa.

girafa

Se a intenção for estudar as neuroses de cativeiro, os zoológicos são bons centros de pesquisa. Dá para começar com os pinguins que tomam antidepressivos no Reino Unido, e depois passar para os elefantes confinados que vivem menos da metade que deveriam viver, graças ao estresse e à falta de exercícios. Sobre o assunto, Marcela relata: “Já tive oportunidade de visitar as áreas restritas ao público nos zoológicos. Essas áreas incluem os animais que ‘sobram’ ou que, por conveniência, não estão aptos à exposição ou aos olhos do público por estarem doentes, com transtornos gravíssimos, lesões, ou representarem algum tipo de perigo mesmo estando presos”. Alguns outros bichos apresentam comportamentos repetitivos e obsessivos, como elefantes que ficam balançando a cabeça ou pássaros que arrancam suas penas. Além de úlceras, atrofia de tecidos, aumento das adrenais e mais uma lista enorme de problemas. Em alguns casos, animais são sacrificados pelo zoológico mesmo sem apresentar agressividade ou doença: morrem só porque tinham a carga genética errada. Foi o caso de um zoológico dinamarquês, que no começo do ano passado sacrificou uma girafa saudável porque ela não tinha os genes apropriados para um programa de criação.

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Lobo em pele de cordeiro

É claro que existem zoos que tentam, ao máximo, reproduzir as condições naturais do ambiente para que os animais sejam menos afetados. O problema é que só isso não é suficiente. “Um zoológico pode melhorar as condições da exposição, substituindo as barras das grades por fossos, aumentando os recintos, praticando o enriquecimento ambiental, ou tomando outras medidas. Isso causará uma melhor impressão aos visitantes, mas para os animais o problema vai ser o mesmo. Continuarão expostos ao público, sem possibilidade de expressar grande parte de seus comportamentos naturais”, diz Sérgio.

Apesar de todos os problemas, verdade seja dita: alguns (e só alguns) zoológicos são importantes na preservação e resgate de espécies. Eles abrigam animais em extinção, realizando diversos programas de reprodução, que incluem congelamento de células e inseminação artificial. Uma parcela também resgata bichos que sofriam maus tratos em circos e parques. Mas a exposição e confinamento são desnecessários. Marcela expõe: “Os zoológicos que respeito são aqueles que cumprem seu papel de reprodução de espécies e reintrodução das mesmas na natureza. Sem exposição ao público. Esses, infelizmente, podemos contar nos dedos de uma mão só quantos existem no Brasil”. Em 2013, a Costa Rica percebeu que não fazia sentido defender a proteção da natureza se eles mesmos mantiam animais em cativeiro. O país, que concentra uma das iodiversidades mais complexas do mundo, tomou uma decisão radical: todos os zoológicos estatais foram abolidos.
rinoceronte
Mas a sua curiosidade pelo reino selvagem não precisa sumir, não. A tecnologia está aí para isso: documentários, vídeos, fotos. Agora, se você realmente quer ver de perto, pode ir a parques com animais silvestres. A visibilidade vai ser menor – e a adrenalina bem maior -, mas assim é possível enxergar a natureza como ela realmente é, o que é bem melhor que só ver o que ela não foi. Se você não estiver interessado, também não tem problema, como finaliza Marcela: “A maior contribuição que os seres humanos podem oferecer aos animais é deixá-los em paz”.

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