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Escala nanométrica: O futuro é invisível

Eric Drexler, o homem que inventou a nanotecnologia, está insatisfeito com os rumos que sua idéia tomou. Mas aposta que ela ainda transformará o mundo.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h50 - Publicado em 30 set 2004, 22h00

João Paulo Gomes

A próxima grande revolução na ciência será tão pequena que você não vai enxergá-la nem com microscópio. Os efeitos, porém, serão devastadores. Quem garante é o físico americano Eric Drexler, cientista que batizou a tal revolução de “nanotecnologia”, na década de 80. Drexler inventou o termo para identificar um conhecimento ainda por ser gerado, que consistiria no desenvolvimento de uma linha de produção industrial em escala nanométrica, ou seja, igual ou inferior a um bilionésimo de metro. Uma fábrica inteira menor que o diâmetro de um fio de cabelo, capaz de montar produtos átomo por átomo. Descrever algo que não existe é tarefa difícil, mas o nome inventado por Drexler caiu no gosto popular – até ter seu significado alterado por pesquisadores nos últimos 20 anos.

Hoje, trata-se por nanotecnologia o desenvolvimento de produtos com tamanho inferior a 100 nanômetros, enquanto o termo original referia-se a miniaturizar o processo produtivo como um todo. Para Drexler, a mudança esvaziou parte do conceito. De um jeito ou de outro, o investimento em pesquisas cresce em tamanho inversamente proporcional aos objetos produzidos: saltaram de 825 milhões de dólares, em 2000, para 3 bilhões de dólares, em 2003. Gigantes como Kodak, General Electric e 3M saíram na frente e já tocam projetos de satélites mais leves a televisores de altíssima qualidade. Não chega a ser o futuro imaginado por Drexler. E a distância a percorrer ainda é longa. Mas a ciência já caminha rumo à gigantesca revolução microscópica.

Você afirma que o termo “nanotecnologia” é usado em excesso e perdeu parte do seu sentido original. O que mudou?

A idéia de “nanotecnologia” apareceu pela primeira vez em meu livro Engines of Creation (“Motores da Criação”, sem tradução em português) para descrever a visão do cientista Richard Feynman baseada no uso de máquinas em escala nanométrica que construiriam produtos atomicamente precisos. Com isso, referia-me a um novo e revolucionário processo de produção que implica um grau de eficiência e produtividade maior que qualquer outro método atual. Nos laboratórios de pesquisa espalhados pelo mundo, o termo “nanotecnologia” hoje faz referência a produtos ou materiais que contenham peças na escala nanométrica, normalmente definida em 100 nanômetros ou menos. Essa é, provavelmente, a distinção-chave: originalmente o termo era ligado a um processo produtivo específico, enquanto hoje ele é cada vez mais utilizado para descrever produtos finais que contenham componentes de escala pequena. Muitos projetos valiosos estão em andamento sob o rótulo de “nanotecnologia”. Mas as pessoas estão usando o termo “nano” em excesso, como uma ferramenta de marketing.

A nanotecnologia vai mudar o mundo?

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Às vezes, o futuro da tecnologia é fácil de se prever. Por exemplo: sabemos que os computadores ficarão cada vez mais rápidos e os materiais mais fortes e que a medicina vai curar mais doenças. A nanotecnologia será responsável por grande parte desse futuro, possibilitando avanços em todos esses campos. Uma enorme gama de produtos que são impossíveis de serem fabricados atualmente poderá ser desenvolvida. O trabalho experimental nesse campo continua. Uma área interessante é a engenharia de proteínas, que modifica geneticamente essas moléculas para, entre outras coisas, produzir remédios. Cientistas já são capazes de construir novas proteínas com precisão atômica.

Como isso irá afetar nossas vidas?

A nanotecnologia que descrevi trará enormes conseqüências para a economia, a medicina, o ambiente e a segurança. Sistemas poderão ser usados para construir produtos complexos de maneira limpa, eficiente e a baixo custo. Trabalhando com precisão atômica produziremos computadores pessoais com 1 bilhão de processadores, sistemas de energia solar eficientes e baratos e aparelhos médicos capazes de destruir organismos que provocam doenças e reconstruir tecidos humanos, materiais 100 vezes mais fortes que o aço e sistemas militares mais poderosos.

Você descreve montadores moleculares como peças-chave da nanotecnologia. Como eles funcionarão?

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A idéia é simples: enquanto químicos misturam moléculas em uma solução, permitindo que elas vaguem e colidam aleatoriamente, os montadores moleculares irão posicionar as moléculas, trazendo-as para um local específico no momento desejado. Deixar moléculas baterem umas contra as outras de maneira aleatória pode levar a reações indesejadas – um problema que aumenta à medida que os produtos crescem de tamanho. Segurando e posicionando moléculas, os montadores irão controlar a maneira como elas reagem, construindo estruturas complexas com precisão atômica. Imagine uma linha de produção, com aqueles braços robóticos montando um produto. Esse braço é abastecido de peças que chegam por uma esteira. Passo a passo, a esteira avança e o robô pega uma nova peça e a adiciona ao produto em montagem. Eventualmente, o produto fica pronto e é levado por uma outra esteira, enquanto um novo produto interminado entra em seu lugar. Para ter noção do funcionamento de um montador molecular, imagine que todos os elementos envolvidos nesse processo são medidos em nanômetros, ou seja, um bilionésimo de metro, e que as peças a serem montadas são alguns átomos, passando da alça para o produto por uma reação química num local específico. O montador funciona como parte de um sistema maior que prepara ferramentas, coloca-as na esteira e controla o mecanismo de posicionamento robótico. É um sistema complexo que ninguém conseguirá construir no futuro próximo. Aliás, ninguém está tentando construir montadores moleculares hoje, porque a nanotecnologia ainda está na infância. Vemos um caminho para esses montadores como os pioneiros que desenvolveram foguetes nos anos 30 e 40 viam um caminho para a Lua. Mas, como eles, ainda não estamos prontos para o objetivo final. Eles sabiam que antes precisariam lançar vários satélites, como nós sabemos que primeiro teremos de construir várias máquinas moleculares.

Qual nossa distância para a utilização de máquinas moleculares?

Previsões sobre o tempo que levará para alcançarmos novos desenvolvimentos tecnológicos normalmente são erradas. O trabalho em direção à nanotecnologia avançada está acontecendo em diversas frentes e novas conquistas serão alcançadas, provavelmente nos próximos anos. Conquistas que muitas pessoas esperam que ocorram nas próximas décadas. Geralmente digo que estamos a duas décadas da nanotecnologia molecular avançada.

Você escreveu sobre os perigos de montadores descontrolados, que poderiam se auto-replicar indefinidamente. Esse é um risco realmente possível?

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Quando escrevi Engines of Creation achei importante que o público percebesse que em todas as tecnologias poderosas existem perigos tremendos, tanto quanto boas oportunidades. Minha preocupação era de que os leitores ficariam entusiasmados demais com as possíveis vantagens da nanotecnologia, sem considerar seu potencial lado negativo. Em relação aos montadores descontrolados e auto-reprodutores, a existência deles é certamente viável de acordo com as leis da física. Porém, eles não apareceriam por acidente. Alguém teria que projetá-los e construí-los, o que seria uma tarefa difícil e sem utilidade. Hoje em dia, o que mais me preocupa é a ênfase exagerada com que essa possibilidade é tratada. Isso acaba tirando a atenção de questões mais importantes, como o uso deliberado de tecnologias poderosas em sistemas de armamento. É aí que os cientistas e formuladores de políticas públicas deveriam se concentrar.

Eric Drexler

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• Tem 49 anos e nasceu em Alameda, na Califórnia

• Foi o primeiro cientista a tornar-se doutor em nanotecnologia molecular pelo MIT.

• É casado com a cientista Christine Peterson, uma das criadoras do termo “open-source” em informática

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