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Este coelho só anda com as patas dianteiras – e agora cientistas sabem o porquê

Estudos envolvendo o gene mutante que altera a marcha destes animais podem ajudar pesquisadores a entenderem déficits motores humanos.

Por Carolina Fioratti
2 abr 2021, 16h08

Os coelhos saltadores de Alfort, de saltadores, só tem o nome. Quando querem se locomover de lentamente, estes animais marcham sobre as quatro patas – como qualquer outro coelho. Mas, para correr, os roedores franceses se sustentam sobre as duas patas dianteiras e projetam o resto do corpo para cima, plantando uma bananeira. 

Essa peculiaridade foi observada pela primeira vez por veterinários franceses em 1935. Até então, ninguém sabia explicar o que levava os coelhos a adotar esse curioso caminhar, mas parece que o mistério foi finalmente solucionado. Um estudo publicado no periódico científico Plos Genetics mostrou que a característica está ligada a uma mutação genética que atrapalha a comunicação entre as células nervosas e os músculos do animal, causando um problema motor. 

Em 2014, geneticistas da Universidade de Uppsala, na Suécia, e da Universidade do Porto, em Portugal, sequenciaram o genoma da espécie. Então, os pesquisadores cruzaram um macho saltador de Alfort com uma fêmea sem déficits motores, chegando a uma prole de 52 filhotes (eles fizeram juz à fama reprodutiva). Todos os novos animais também tiveram seus genomas sequenciados, e os pesquisadores encontraram o gene mutante, igual ao do pai, em 23% deles.

A mutação em questão está em um gene chamado RORB. Ele interfere na produção de uma proteína de mesmo nome em um grupo específico de interneurônios – células nervosas que transmitem informações sensoriais para os neurônios motores que controlam os músculos.

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Essa proteína RORB é responsável por neutralizar a atividade de outras células nervosas presentes na medula espinhal. Sem a sua ação, os coelhos acabam flexionando demais certos músculos e tem sua coordenação motora dificultada, o que faz com que o animal levante as patas traseiras mais do que o necessário.

O estudo deste gene não ajuda a compreender apenas a marcha dos coelhos saltadores de Alfort, mas sim de todos os mamíferos. Em pesquisas anteriores, cientistas observaram camundongos que também caminhavam desta forma acrobática e apresentavam uma mutação no gene RORB. Além disso, os estudos envolvendo ratos mostraram que estes animais são mais propensos a ter problemas de visão – o que foi observado também nos coelhos, que costumam nascer cegos ou desenvolvem catarata ainda no primeiro ano de vida.

Os autores explicam que “além de sua importância na medula espinhal, o RORB também é expresso em muitas regiões do cérebro, como os córtices somatossensoriais primário, auditivo, visual e motor, em alguns núcleos do tálamo e hipotálamo, na glândula pituitária e no colículo superior”. 

Os pesquisadores enxergam a descoberta como uma possibilidade de entender melhor alguns déficits motores em humanos, como a doença de Charcot-Marie-Tooth, que causa o enfraquecimento do tônus muscular. Nesta condição, o gene RORB do paciente também é atípico, e pesquisas futuras podem mostrar como ele está influenciando nos centros de comunicação da medula espinhal de pessoas afetadas. 

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