Flora nordestina para inglês ver
Projeto do Real Jardim Botânico Britânico vai fazer um estudo sobre a flora nordestina.
Um projeto que surpreende pela simplicidade, embora sua prática exija uma perseverança de sertanejo, vai associar pesquisadores de várias universidades brasileiras aos cientistas de Kew Gargens, como é conhecido o Real Jardim Botânico, criado em 1959. O alvo do estudo é o Nordeste. Ocupando 1,2 Km² nas cercanias de Londres, a instituição contém o maior acervo da flora tropical do mundo na coleção de 30 000 espécies vivas e 6 milhões de plantas secas que formam seu herbário, uma espécie de biblioteca vegetal.
“O Projeto Nordeste tem objetivos muitos claros”, informa o taxiólogo (especialista em classificação de formas vivas) Brian Stannard, do Kew, ouvido por Gisela Heymann, para SUPERINTERESSANTE. “Trata – se de organizar um estudo sem precedentes sobre a flora local, um passo indispensável para qualquer tentativa de reabilitação dos ecossistemas destruídos na região.” Ao contrário do que pode sugerir a clássica imagem do sertão calcinado, no Nordeste viceja nada menos de 40% da flora brasileira. De 15 a 20 000 espécies vegetais brotam em 1,5 milhão de km², que compreende nove Estados e a população mais pobre do país. “O Nordeste é uma das mais importantes áreas de diversidade vegetal em regiões semi – áridas, como a caatinga, e de concentração de plantas economicamente importantes para o homem”, esclarece o botânico Stannard, um inglês que já visitou a região várias vezes e esbanja um português impecável.
O Projeto Nordeste pretende catalogar o maior número de plantas passíveis de exploração comercial e úteis à revitalização do meio ambiente local. Na prática, isso significa identificar as plantas que podem servir de alimento, remédio ou fonte de energia e as que ajudam a proteger os lençóis freáticos e a fertilizar o solo. Para tanto, uma centena de ingleses e brasileiros vão gastar cerca de 10 milhões de libras (6 milhões de cruzeiros ao câmbio de julho último) numa investigação prevista para durar dez anos. A conta será paga por muitas mãos – Kew Gardens, empresas privadas e pela Overseas Development Association, uma agência do governo britânico.
Livros e folhetos com explicações sobre as propriedades das plantas catalogadas e sua utilização prática serão publicados para distribuição no Nordeste. Prevê – se também a criação de um banco de sementes, com a colaboração do Centro Nacional de Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargem), de Brasília. “O Projeto Nordeste poderá propiciar, a longo prazo, o restabelecimento das florestas de brejo, a criação de florestas artificiais para fornecer madeira de uso doméstico e o reaproveitamento de terras marginais de caatinga”, diz Brian Stannard.
O interesse do Jardim Botânico Britânico pela flora brasileira não é de hoje. No último andar do prédio da administração do parque, outro inglês Martin Pendred, um ex-bancário cujo português nada deve ao de Stannard, dirige a Fundação Margaret Mee, em homenagem à botânica e desenhista especializada na flora amazônica, falecida em 1986. A Fundação proporciona bolsas de estudo para botânicos e artistas plásticos brasileiros interessados no assunto. “Uma excelente oportunidade”, rejubila – se Dulce Terezinha do Nascimento, uma dos oito bolsistas brasileiros em Kew. A Fundação também deverá oferecer ajuda a pesquisadores interessados no Projeto Nordeste. “Não vamos nos restringir aos desenhos”, anuncia Pendred. “A tendência agora será concentrar esforços nesta missão.”