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Fósseis revelam a violência do impacto que dizimou os dinossauros

Sítio paleontológico nos EUA, que contém animais terrestres e aquáticos, é a primeira evidência direta de como a tragédia afetou a vida na Terra.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 12 mar 2024, 12h43 - Publicado em 1 abr 2019, 18h28

Há 66 milhões de anos, um asteroide de aproximadamente 10 quilômetros de diâmetro atingiu a península de Yucatán, no México. Os dinossauros, que haviam predominado na Terra por 200 milhões de anos, foram extintos. Mas não só eles. Algo entre 64% a 85% de todas as espécies existentes (inclua aí vegetais e fungos, não só animais) partiram desta para a melhor. Das cinco grandes extinções em massa que ocorreram na história do planeta, esta é a única que faz parte do imaginário popular – graças, é claro, ao sucesso de “bichinhos” como o T. Rex.

Agora, paleontólogos da Universidade do Kansas, nos EUA, afirmam ter encontrado um conjunto de fósseis que representam criaturas pré-históricas mortas no momento exato do impacto. O sítio se chama Tanis e fica na formação geológica de Hell’s Creek, no estado da Dakota do Norte. Ele contém “uma massa amorfa de peixes de água doce, vertebrados terrestres, árvores, galhos, troncos, amonitas [um animal aquático de concha espiralada] e outras criaturas marinhas”, nas palavras Robert DePalma, um dos autores do artigo científico – que foi publicado hoje (1º de abril) no periódico PNAS.

Essa descoberta é extremamente importante: embora seja quase consenso na comunidade científica que a extinção ocorrida entre os períodos Cretáceo e Paleogeno (conhecida como K-Pg no jargão de geologia) foi responsabilidade do pedregulho alienígena, ainda não havíamos encontrado vítimas diretas do impacto.

A mistura de animais aquáticos de água doce e salgada com animais terrestres é um atestado da violência da colisão: eles foram embaralhados por um tsunami monumental, e então recobertos rapidamente por uma espessa camada de destroços – o que permitiu a preservação dos cadáveres e sua posterior fossilização.

Pequenas esferas de vidro – que caíram feito granizo após a rocha vaporizada pelo calor voltar a se solidificar nas camadas mais altas da atmosfera – ficaram presas nas guelras dos peixes. Muitos provavelmente morreram sufocados antes do soterramento.

O tsunami em questão não pode ter sido desencadeado pelo asteroide em si – segundo os cálculos de DePalma e seus colegas, ondas formadas no epicentro teriam demorado 17 horas para viajar pela água até Dakota da Norte, um intervalo que não condiz com as evidências encontradas na “cena do crime”. Tudo indica que os animais foram mortos 30 ou 40 minutos após o impacto de Chicxulub.

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Por isso, os pesquisadores especulam que lagos, rios e outros corpos d’água relativamente distantes do México foram agitados tão bruscamente por ondas sísmicas (vibrações que se propagam pelo interior da Terra e atingem velocidades entre 2 km/s e 8 km/s na crosta) que a água balançou do zero, sem influência direta do impacto.

Para entender, imagine que você e seus amigos pulam ao mesmo tempo no chão da sala – fazendo o refrigerante dentro de um copo em cima da mesa se mexer. Ninguém encostou no copo, mas a vibração chega lá do mesmo jeito.

Esse fenômeno não só é possível como já foi verificado: em 2011, o terremoto de Tohoku, no Japão, fez a água se agitar na Noruega, a 8 mil quilômetros do epicentro, apenas meia hora após o impacto.

Disputa meteórica

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A extinção dos dinos e seus contemporâneos não foi produto só da colisão em si, mas principalmente da sequência de desequilíbrios que ela desencadeou em ecossistemas de toda a Terra – mesmo os mais distantes da cratera de Chicxulub. As florestas se incendiaram, e a fuligem liberada na atmosfera transformou o dia em noite por 500 dias. As plantas, incapazes de fazer fotossíntese, morreram. Então pereceram os animais herbívoros, que comiam as plantas. Depois, os carnívoros que comiam os herbívoros.

Hoje, a teoria do asteroide é praticamente consenso entre os cientistas. Até a década de 1980, porém, era tratada com a mesma seriedade que uma novela da Record. O problema em aceitá-la, grosso modo, é que a maior parte dos geólogos era fiel à tradição do gradualismo, fundada na obra de James Hutton, no século 17, e Charles Lyell, no século 18.

É o seguinte: no berço da ciência como a conhecemos hoje – a virada do século 17 para o 18 – os geólogos eram em sua maioria catastrofistas. Eles acreditavam que o passado da Terra havia sido marcado por fenômenos impensavelmente violentos, que hoje não ocorrem mais nas mesmas proporções. Havia erupções vulcânicas violentas, terremotos homéricos e inundações – incluindo, é claro, o dilúvio de Noé, relatado na Bíblia.

Hutton e Lyell, cada um a seu tempo, perceberam que tratar o passado como um filme do Michael Bay não dava certo. A Terra era extremamente antiga, e os mesmos processos geológicos lentos e tediosos que atuam hoje – erosão, por exemplo – já atuavam na época dos dinossauros. Montanhas não precisavam se erguer do chão de uma vez, num passe de mágica divino. Era muito mais simples explicá-las se partíssemos do princípio de que elas ganham corpo aos poucos.

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Essa parcimônia toda pegou bem. Com o tempo, ficou claro que o catastrofismo era uma abordagem infantil. As coisas não explodem o tempo todo. Assim, a geologia do século 20 construiu um corpo sólido de conhecimentos partindo do princípio de que explicações lentas e graduais para explicar o relevo são mais adequadas que as bruscas.

É por isso que, na década de 1980, quando o geólogo Walter Alvarez propôs que os dinossauros haviam sido extintos por um asteroide, toda a comunidade o recebeu de cara virada. Parecia um retorno aos dias de catastrofismo, e não uma proposta séria.

Alvarez não estava de brincadeira: ele havia encontrado, em uma formação rochosa na Itália, uma camada de argila rica em irídio – um elemento da tabela periódica que é raríssimo na Terra, mas bastante comum em asteroides e outros corpos extraterrestres.

Essa camada de argila ficava prensada justamente entre as camadas de rocha que se acumularam no período Cretáceo (o último dos dinossauros) e o Paleogeno (o primeiro após os dinossauros), e aparecia em diversos lugares da Terra – inclusive no Nordeste brasileiro. Uma indicação inequívoca de que nós fomos visitados por um pedregulho cósmico na época perfeita para explicar a extinção K-Pg.

Com o tempo, a comunidade geológica abandonou o preconceito catastrofista e abraçou a teoria de Alvarez: às vezes, as coisas explodem mesmo. A descoberta de animais mortos graças ao evento reforça essa explicação ainda mais – e nos ajuda a reconstruir em detalhes inéditos o que ocorreu no momento exato em que o asteroide chegou. Nas palavras de Derek Auger, “A história de qualquer parte da Terra, como a vida de um soldado, consiste em longos períodos de tédio e curtos períodos de terror”.

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