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Humanidade (quase) instantânea

De macacos um pouco menos peludos a artistas de primeira classe, parece que viramos humanos plenos de uma hora pra outra.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h48 - Publicado em 31 out 2007, 22h00

Texto Reinaldo José Lopes

A relativa juventude da nossa espécie é um fato incontestável. O Homo sapiens existe há no máximo uns 200 mil anos, não mais que o proverbial piscar de olhos na história de cerca de 4,5 bilhões de anos do nosso planeta. E olha que estamos contando todo o tempo durante o qual a anatomia do nosso corpo parece ter ficado mais ou menos igual. A coisa fica muito pior se só levarmos em consideração o período durante o qual nós nos comportamos feito seres humanos de verdade, fabricando ferramentas complexas, participando de rituais elaborados e criando arte. Nesse caso, as melhores pistas achadas até hoje sugerem que “viramos gente” de forma relativamente repentina, entre 80 mil e 50 mil anos atrás.

Diversas variantes dessa idéia circulam na comunidade científica hoje. Mas, de uma forma ou de outra, todas fazem jus ao apelido de Grande Explosão Criativa, usado para designar uma fronteira cultural que, por um motivo ou outro, a nossa espécie demorou para atravessar. De fato, trata-se de uma enrolação tão grande que parece exigir uma desculpa das boas. Tudo indica que os primeiros Homo sapiens surgiram na África Oriental, em algum lugar entre a Etiópia e a Tanzânia, e logo se espalharam por todo o continente. Mas pareciam ter ficado “trancados” em território africano, usando ferramentas relativamente simples de pedra que eram praticamente idênticas às de seus ancestrais africanos ou às dos neandertais da Europa. E eles já vinham se virando com esse kit tosco por centenas de milhares de anos.

Um dos primeiros sinais de mudança veio há 77 mil anos, numa caverna da África do Sul chamada de Blombos. Nela, arqueólogos encontraram uma pedrinha cheia de estranhos rabiscos geométricos, feitos intencionalmente por uma mão humana. Ninguém sabe o significado dos riscos na pedra, mas todos concordam que se trata de uma das primeiras formas de arte, ou representação simbólica, da história da humanidade. Também de Blombos, dessa mesma época, vieram pequenas conchas perfuradas que, originalmente, parecem ter formado um colar. Ou seja, essas pessoas (quem quer que fossem elas) não só faziam arte como se enfeitavam.

A partir daí, parece que as coisas tomam um ritmo vertiginoso perto do marasmo anterior. É quase certo que, 60 mil anos antes do presente, os primeiros Homo sapiens tenham deixado seu continente natal e se embrenhado no litoral asiático, avançando pelo Irã, pelo Paquistão e pela Índia. Há 45 mil anos, chegavam à Austrália – quase certamente de barco, outra tecnologia nova – e pouco depois atingiam a Europa. A fronteira final, a América, demoraria um pouco mais (só foi alcançada há cerca de 15 mil anos). No entanto, em todo o Velho Mundo, os humanos modernos criavam esculturas e sofisticadas pinturas em cavernas, elaborando ferramentas multipeças que podiam misturar pedra, osso, madeira e marfim.

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Genes ou sociedade?

Foi uma vitória rápida, sem dúvida. Resta saber quais as razões dela. Os que defendem uma mudança realmente repentina apostam que uma mutação – ainda não identificada – alterou o cérebro de nossos ancestrais e permitiu o surgimento de uma forma mais complexa de linguagem, que os ajudou a planejar e coordenar suas ações com uma eficiência sem precedentes. Outros pesquisadores apostam num fenômeno mais coletivo. Por volta de 70 mil anos atrás, as condições climáticas da África teriam favorecido o crescimento da população Homo sapiens. Essa massa crítica de gente teria sido o fermento ideal para novas organizações sociais, novas idéias – e um plano inconsciente de dominação global que, pelo visto, deu muito certo.

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