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Inquilinos do corpo

Bilhões de seres minúsculos fazem do organismo humano um gigantesco condomínio. Mesmo contra a vontade do proprietário, entram, ficam à vontade e fazem de conta que a casa é deles.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h53 - Publicado em 31 ago 1999, 22h00

José Roberto Torero e Cecilia Lopes

O homem domina a Terra, certo? Errado. Diante dos mais de 6 bilhões de indivíduos espalhados em praticamente cada canto do mundo, é compreensível que se tenha essa impressão. Mas não é nada disso. Os microorganismos são os verdadeiros donos do planeta. Eles não só o controlam como também colonizam os seres humanos. Por dentro e por fora, da cabeça aos pés, seu corpo é um condomínio de bilhões de bichos. Na verdade, há mais micróbios do que células no organismo. Essa legião de invasores põe o sistema imunológico em permanente estado de guerra. Mas nem todos os inquilinos são detestáveis. Muitos são até suportáveis, pois não conseguem causar nenhuma doença grave, e, em alguns casos, amigáveis, pois fazem bem. Só no aparelho digestivo, existem mais de 400 tipos de bactérias. Os bichos ocuparam o prédio tão discretamente que até parecem os donos da casa. Deixe a gente apresentá-los a você nestas páginas.

Algo mais

Os lactobacilos são as mais conhecidas bactérias entre as que ajudam o organismo. Moradoras naturais da boca, do estômago e do intestino, fazem bem porque produzem ácido lático. Deixam o ambiente tão ácido que impedem a proliferação de bactérias nocivas.

Moram de graça e ainda estragam tudo

É melhor não se iludir com os bichinhos quase bonzinhos que você viu na página anterior. “Há certos fatores, como remédios ou álcool, que desencadeiam a quebra do equilíbrio que transforma uma bactéria suportável em detestável”, explicou à SUPER Pedro Paulo Chieffi, professor de Parasitologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo (USP).

Um bom exemplo disso é o Staphylococcus aureus. Ele parece até boa gente. Mora na fachada do edifício em todos os andares, aos bilhões. Passa o dia limpando a parede externa, a pele. Ajuda a deixá-la mais bonita, já que se alimenta das impurezas. Mas, se a resistência do corpo estiver em baixa e houver uma brecha, como um ferimento, ele se joga na corrente sanguínea. Multiplica-se tão rapidamente que, no caso de septicemia, uma infecção generalizada, pode até matar (veja SUPER ano 13, número 1, página 56).

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Nem mesmo aqueles bichos que fazem parte da flora natural do organismo são flor que se cheire. “Esses seres suportáveis, que existem normalmente em determinados órgãos, não podem ser considerados parte integrante do corpo”, disse à SUPER Marcos Boulos, professor de Doenças Infecciosas e Parasitárias da USP. “O que algumas bactérias apresentam é uma correlação adequada com o ambiente em que se encontram.” Ou seja, dão-se bem com o hospedeiro, isto é, com o proprietário.

Já com os detestáveis não há negócio. Esse inquilino é do tipo que estraga o lugar em que vive: quebra janelas, danifica o encanamento e compromete as fundações. Quando se trata de vermes, a situação fica ainda pior, já que eles podem, literalmente, se alimentar das paredes que os abrigam. “Uma grande parte dos microorganismos que vivem em nosso corpo pode ser perniciosa e muitos chegam a levar o indivíduo à morte”, disse à SUPER Maria Stela Branquinho, pesquisadora científica da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen). Ela está terminando uma tese de doutorado na USP sobre a malária, doença que pode ser fatal e que é provocada pelo plasmódio, um bicho que vive no organismo de 500 000 brasileiros. “Assim como um prédio precisa ser vistoriado por fiscais regularmente, é bom fazer um exame periódico no organismo. Às vezes, um inquilino merece ser despejado.”

Para saber mais

Almanaque de Bichos Que Dão em Gente. Sônia Hirsch, Rio de Janeiro, Corre Cotia, 1998.

Na Internet:

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Commtechlab.msu.edu/sites/dlc-me

Algo mais

Estudar bactérias só é possível com a ajuda de um microscópio. Embora a invenção seja do final do século XVI, foi o naturalista holandês Antoine van Leeuwenhoek que, em 1674, desenvolveu o primeiro modelo capaz de permitir a visualização de uma bactéria. O microscópio eletrônico, inventado em 1924, pode aumentar uma imagem até 250 000 vezes.

Locatários razoáveis

Bichos que incomodam, mas não derrubam o prédio.

Pés na cabeça

Muito privilegiado, o Pediculus humanus capitis, o piolho, habita a cobertura, isto é, a cabeça. É uma criatura muito popular entre crianças, cujas cabeleiras infesta. Dona piolha põe até dez ovos por dia, chamadas lêndeas, que ficam grudadas nos fios de cabelo. Em nove dias já são adultos, donos do próprio nariz – e dos cabelos dos outros. Uma boa faxina, com o produto de limpeza adequado, basta para espantá-los em três tempos.

Boa de bico

Apesar do nome, a Candida albicans não tem nada de cândida, isto é, de boazinha. É um dos fungos que infectam os seres humanos com maior freqüência. Mora principalmente na boca e na pele, nos andares mais altos e nos mais baixos do edifício. É também a culpada pelo sapinho, pela frieira e pelas assaduras no bumbum dos nenês.

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Exibicionista

Aqui o sobrenome já diz tudo: Propionibacterium acne. Locatária muito vaidosa, a acne faz questão de se exibir em prédios jovens, recém-construídos, bem na fachada. Condomínios adultos também estão sujeitos a essa incômoda bactéria, que não causa dor, exceto a do constrangimento.

Na porta de casa

O vírus da herpes (Herpes simplex) gosta muito daqueles que você mais ama. Adora morar na sua boca. Apesar de aí não causar grandes problemas, é altamente contagioso. Pode viver 48 horas em uma escova de dentes seca e até uma semana se ela estiver úmida. Depois de instalado, gosta de dar as caras quando o porteiro, ou melhor, as defesas do organismo, dormem em serviço. E demora muito a ir embora.

Antivazamentos

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No intestino, há bilhões de Lactobacillus acidophillus. Lá, essa multidão ocupa o espaço de micróbios indesejáveis, impedindo-os de crescer. Dessa forma, ajuda a evitar vazamento no edifício, ou seja, a diarréia. Eles também moram em outros andares do prédio. Na foto, estão na vagina, pondo no olho da rua o bicho que causa a sífilis (em amarelo).

Sangue ruim

Apesar de ser a menor espécie de pulga conhecida (tem apenas 1 milímetro de comprimento), a Tunga penetrans causa grandes estragos no alicerce do edifício: os pés. Responsável pelo bicho-de-pé, esse bichinho se alimenta de sangue, mas não permanece no local por muito tempo: a fêmea morre quinze dias depois de botar mais ou menos 100 ovos.

Turma da pesada

Locatários que estragam o imóvel e não pagam aluguel.

Múltiplos males

Oportunista, a Pseudomonas aeruginosa gosta da garganta – o elevador do edifício. Em condições favoráveis (para ela), também infecta feridas, queimaduras e o trato urinário. Perigosa, a ela estão associadas também doenças como pneumonia e meningite.

Trem fantasma

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Cada esfera vermelha que você vê na foto é um Streptococcus pneumoniae. Essa bactéria detesta ficar sozinha e acaba encostando em outra, como vagões em um trem, formando esses colares. Gosta muito de apartamentos bem ventilados, mas depois que se instala e se multiplica estraga todo o sistema com uma doença bem conhecida, chamada pneumonia.

Vizinho inconveniente

A Fasciola hepatica gosta de conhecer os vizinhos. Quando seus ovos se abrem no organismo, faz questão de viajar pela corrente sanguínea e, assim, ir até o fígado, onde causa a hepatite. Típico exemplar de inquilino importuno, sua presença no prédio faz o hospedeiro ficar fraco. Os zeladores do edifício deviram barra sua entrada.

Gosto pelo esgoto

Como a maioria dos vermes, a Escherichia coli não é muito afeita a higiene. É encontrada em qualquer parte do sistema digestivo, mas é mais comum nos esgotos do corpo, o intestino. Nos adultos não chega a fazer muito mal. Em edifícios mais novos, porém, provoca diarréias.

Alta temperatura

A inflamação causada pela Chlamydia trachomatis aparece em todo o sistema genital e urinário do homem e da mulher – uretra, vulva, vagina, útero e seu colo, trompas e ovários, pênis e testículos. Passa por contato genital e prospera com o calor. Em casos extremos, pode provocar impotência sexual em homens.

Malhadores

O Trichinella spiralis entra no corpo com a carne de porco mal cozida (incluindo salsichas) e vai morar na sala de ginástica do prédio – ou seja, nos músculos. Pode causar uma dor tão aguda que exige até hospitalização. Mede 4 milímetros de comprimento. Apesar do atlético lugar em que moram, as fêmeas duram no máximo dezesseis semanas. Os machos são ainda menos vigorosos: morrem logo depois da cópula.

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