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Nada de ratinhos: foi uma mosca que ganhou seis prêmios Nobel

Conheça a Drosophila melanogaster e entenda como ela foi de inseto doméstico a rainha dos laboratórios

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
11 out 2017, 11h41

Qual é a semelhança entre você e uma mosca?

O DNA. Sim, parece piada. Mas não é.

A Drosophila melanogaster – inseto de olhos vermelhos e cara de poucos amigos – tem menos de um centímetro, seis patas, quatro cromossomos, duas asas e uma vontade incontrolável de voar na sua orelha enquanto você come. Mas, apesar das diferenças na aparência, 60% do seu genoma é idêntico ao nosso.

Isso a tornou a cobaia ideal para estudar nosso próprio corpo. 75% dos genes que causam doenças no ser humano têm equivalentes perfeitos no inseto. 50% de suas proteínas têm análogos nos mamíferos. Graças a ela, hoje nós entendemos melhor câncer, diabetes e doenças como as de Parkinson, Alzheimer e Huntington (famosa graças à personagem 13, do seriado House).  

Com esse currículo invejável, ela bateu Marie Curie – dona de dois prêmios Nobel – e levou nada mais nada menos que seis medalhas para casa ao longo do século 20. Além do Nobel de medicina mais recente – dado a cientistas que descobriram como funciona nosso relógio biológico usando o inseto como cobaia – outros cinco prêmios (2011, 2004, 1995, 1944, 1936) só foram possíveis graças ao sacrifício de centenas de mosquinhas.

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A D. melanogaster é veterana de guerra: começou a trabalhar com carteira assinada em 1910, quando o professor Thomas Morgan, da Universidade de Columbia, inaugurou a fly room – em português, “sala das moscas”. Era um cafofo apertado, de 35 m², em que oito estudantes de genética disputavam mesas e garrafas de vidro cheias de moscas. Eles usavam lupas (depois foram comprados microscópios) para observá-las e fazer anotações.

Esse é o tipo de pesquisa que costuma ser vista com ceticismo por quem acha uma besteira investir dinheiro público em ciência – “qual é a aplicação prática?” ou “criança passando fome na África e vocês olhando moscas?” são os comentários mais comuns.

Acontece que é justamente esse tipo o de pesquisa que rende mais frutos. Considere o seguinte: a mosquinha se reproduz feito um coelho a cada dez dias, o que significa que em um mês é possível estudar três gerações da família – avós, pais e filhos. Em dois meses, já há seis gerações à disposição dos pesquisadores. É como se toda sua árvore genealógica, dos antepassados que vieram da África, Ásia ou Europa até você, pudesse ser analisada de uma vez só, convenientemente contida em garrafas. Um verdadeiro parque de diversões para estudos de genética e hereditariedade, barato e prático.

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Trancados na sala abafada, vendo as moscas fabricarem filhotes a toque de caixa, Morgan e seus alunos descobriram que eram os cromossomos os responsáveis por transmitir características entre gerações, e que esses cromossomos podiam sofrer mutações aleatórias. Eles também notaram que algumas dessas mutações estavam associadas ao sexo dos pais e dos herdeiros, e outras não.

Essas ideias são tão fundamentais para a biologia contemporânea que hoje são conteúdo de prova no ensino médio. Resultado? Um prêmio Nobel para Morgan em 1933. E um caminho aberto para tantas coisas que o ser humano descobriria sobre si próprio ao longo do século 20 – como a descrição da estrutura de dupla hélice do DNA, em 1953, e o sucesso da técnica de edição genética CRISPR/Cas9, em 2015.

Daí em diante, a mosquinha virou lenda. Cada detalhe de sua biologia foi estudado e relatado, e ela foi adotada como um organismo padrão para estudos de laboratório – assim como os famosos ratinhos brancos. 

Ou seja: a D. melanogaster é mais do que uma cobaia que caiu do céu. Ela é símbolo de um jeito de fazer ciência. Um jeito que, na superfície, pode até parecer meio bobo, excessivamente teórico e alienado da realidade – mas que, com tempo e paciência, rende prêmios Nobel a rodo, e revoluções na medicina com que Morgan nem podia sonhar no começo do século passado.

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