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Que história é essa de universo paralelo descoberto pela Nasa? Entenda.

Calma: não há um portal aberto para outro cosmos. Foi só um raio cósmico que atingiu um detector na Antártica de um jeito estranho. O que também é legal.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 13 mar 2024, 10h10 - Publicado em 21 Maio 2020, 14h59

Um universo paralelo está mandando recadinhos para nós, terráqueos, na forma de partículas de altíssima energia. E a Anita (não seria a Pablo Vittar?) tem algo a ver com a história. Ou pelo menos isso é o que você entendeu se andou lendo as notícias de astronomia nas últimas 24 horas. Estão rolando por aí chamadas do tipo “Nasa descobre possível universo paralelo onde tempo passa ao contrário”, que deixaram leigos fãs de Asimov ouriçados.

A gente aqui da SUPER sente muito, mas não é bem isso. Vamos explicar melhor, com a honra, glória e auxílio dos astrônomos e físicos que estão no Twitter esclarecendo a situação.

Começando do começo. Aperte os cintos que o papo é longo. O primeiro passo é entender o que é um neutrino:

Você é feito de átomos. Átomos de hidrogênio, oxigênio, carbono. Esses átomos, por sua vez, têm um núcleo que consiste em prótons e nêutrons. E esses prótons e nêutrons são feitos de partículas ainda menores, os quarks. Moral da história: um quark é algo menor do que a menor coisa que você é capaz de imaginar. É tão pequeno que nem pode ser subdividido.

Há outras partículas que gozam do mesmo status do quark – isto é, partículas fundamentais, que não são feitas de outras partículas. Elas são, ao todo, 17. Algumas são bem familiares para você: os elétrons que correm na rede elétrica da sua casa, por exemplo. Ou os fótons, as partículas da radiação eletromagnética. Sem fótons, não há luz nem rádio, nem TV, nem telefone, nem 3G.

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Há uma teoria chamada Modelo Padrão que descreve essas 17 partículas fundamentais – e as forças igualmente fundamentais que regem a interação entre elas. Basicamente tudo o que você pode ver ou tocar pode ser explicado pelo Modelo Padrão.

E é lá, num cantinho meio desanimado do Modelo Padrão, que ficam os neutrinos. Ao contrário dos quarks, elétrons e fótons, os neutrinos não têm função nenhuma na nossa vida. Passam batido por tudo: uma parede de chumbo de 10 cm de espessura é capaz de proteger você dos resíduos radioativos de uma bomba nuclear, mas você precisaria de dois anos-luz de chumbo se quisesse impedir um feixe de neutrinos de te atingir.

Os neutrinos, porém. são capazes de fazer um negócio legal. Quando um neutrino de energia altíssima está viajando dentro de um meio como o gelo, por exemplo, ela acaba atingindo uma velocidade superior à da luz naquele meio.

Você talvez se lembre de que nada é mais rápido do que a luz – é a primeira informação que vem à mente quando falamos de Einstein –, mas há um detalhe aqui: nada é mais rápido que a luz no vácuo, onde ela alcança 299 milhões de metros por segundo. A luz, no gelo, alcança “só” 229 milhões de metros por segundo. E aí dá para ganhar a corrida. Se você for, por exemplo, um neutrino de altíssima energia.

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Quando o neutrino ultrapassa a luz no gelo – como acontece dentro da camada de 2 km de gelo que forra a Antártica –, rola algo chamado efeito Askaryan.

Efeito Askaryan é o nome bonito para quando um neutrino extremamente rápido faz um rebuliço de outras partículas – como uma bola de sinuca branca batendo nas coloridas. Isso libera radiação eletromagnética (o que nós chamamos de luz se as ondas forem do comprimento que os olhos humanos são capazes de ver, mas chamamos de rádio ou microondas quando são maiores do que esse comprimento).

Existe um instrumento chamado Anita (sigla de Antarctic Impulsive Transient Antenna) cujo objetivo é justamente detectar as ondas de rádio ou microondas produzidas por um neutrino de altíssima energia quando ele penetra no gelo e sofre o efeito Askaryan.

Normalmente o neutrino vem do espaço e entra no gelo. O Anita, por sua vez, fica pendurado em um balão de hélio a 35 mil metros de altitude. Lá de cima, ele é capaz de pegar as ondas eletromagnéticas que estão saindo da superfície gelada da Antártida lá embaixo. E, a partir dessas ondas, os cientistas são capazes de saber qual foi a energia do neutrino e de qual direção do céu ele veio.

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Agora você deve estar se perguntando: qual é a finalidade de fazer esse retrato falado dos neutrinos de altíssima energia que batem aqui na Terra? Bem, esses neutrinos, nas palavras do pessoal da Universidade da Califórnia em Irvine, “são criados por colisões entre raios cósmicos e os fótons da radiação cósmica de fundo que permeia o Universo”.

Pausa para o glosário: um raio cósmico é um próton ou um núcleo atômico – um pedacinho de átomo, em resumo – que viaja pelo cosmos quase na velocidade da luz. Os raios cósmicos são produzidos em coisas como o Sol (que é quente e explosivo) ou em fenômenos como supernovas: a morte de uma estrela com massa até dezenas de vezes maiores que a do Sol (o que é ainda mais quente e ainda mais explosivo).

Os raios cósmicos podem interagir com a radiação cósmica de fundo. Trata-se de uma radiação eletromagnética muito sutil e cansada, remasnescente da origem do Universo, na qual todo o cosmos está mergulhado até hoje. Uma parcela da interferência na tela de uma TV analógica é radiação cósmica de fundo.

Durante essa interação, os raios cósmicos produzem neutrinos de alta energia. Que então entram no gelo e produzem radiação eletromagnética pelo efeito Askaryan. E só aí o Anita detecta. Pois é, meio difícil.

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Mas deu para sacar que o Anita existe para detectar, da maneira mais indireta possível, raios cósmicos.

E o que rolou no Anita, em 12 de dezembro de 2014 (a descoberta só foi publicada agora), é que um raio cósmico alcançou a Terra vindo de dentro dela. Como se ele tivesse entrado pela Sibéria, atravessado o planeta e saído pela Antártida, em vez de chegar direto do espaço, como os raios cósmicos geralmente fazem.

Isso pode significar, por exemplo, que esse raio cósmico foi gerado por uma supernova (a já mencionada morte de uma estrela massiva). O fenômeno é tão violento que, em princípio, poderia produzir um raio com energia suficiente para atravessar o nosso planeta e sair pelo outro lado. Mas também pode haver alguma explicação mais maluca. Por exemplo: o fenômeno pode sinalizar a existência de uma partícula ainda desconhecida pelo Modelo Padrão.

Mas a verdade é que ainda não há dados suficientes para cravar nada. Muito menos que exista um universo paralelo em que o tempo passa ao contrário – que nem de longe é a favorita dentre as explicações possíveis. Tanto é que ela sequer é citada no artigo original.

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