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Tempestades tropicais emitem mais radiação do que se imaginava, diz estudo

Entenda como o fenômeno ocorre – e por que não há motivo para preocupação.

Por Manuela Mourão
2 out 2024, 18h00

Satélites da NASA vêm identificando, desde os anos 1990, energias vindas de supernovas e outros elementos celestiais. Porém, quando foram construídos, os pesquisadores não imaginavam que essa energia estaria também dentro da Terra, em forma de raios de radiação gama. Hoje sabemos que esse fenômeno ocorre graças às tempestades tropicais.

Os satélites não foram criados para identificar energias vindas da própria Terra. Por isso, identificar a radiação que sai das trovoadas é um desafio. Os instrumentos precisariam estar no lugar exato e na hora certa para registrar e medir a intensidade do fenômeno.

Recentemente, um grupo de cientistas teve uma chance de averiguá-lo de perto. Em um voo feito em um avião de espionagem ER-2, da própria NASA, a equipe foi em direção ao olho da tempestade. O time descobriu que a radiação gama vinda das tempestades tropicais é muito mais comum do que se acreditava. Suas conclusões estão sintetizadas em dois estudos publicados hoje (2) na revista Nature.

As tempestades que ocorrem nos trópicos são consideravelmente maiores do que aquelas em outras regiões. Os pesquisadores sugerem que mais da metade dessas chuvas apresentam radiação. Eles propõem que essa emissão de radiação gama em níveis baixos age como o vapor que se libera de uma panela de pressão, limitando a quantidade de energia que pode ser acumulada dentro da tempestade.

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Steve Cummer, professor de engenharia na Duke University e coautor autor dos artigos, explica que existe muito mais acontecendo dentro das nuvens do que se pode imaginar. 

Enquanto  as chuvas estão se desenvolvendo, correntes de ar transformam as gotas de água, pedras de granizo e gelo em uma mistura eletricamente carregada – tipo quando você esfrega uma meia no tapete ou um balão no cabelo. A tempestade, então,  se “separa” em duas: a parte de cima, carregada positivamente, e a parte de baixo, com partículas negativas. Aquela carga se forma um campo elétrico com a mesma potência de 100 milhões de pilhas AA (a que você usa no controle remoto de TV). 

Não para por aí. Se elétrons estiverem presos em um campo elétrico como este, eles aceleram. Inquietos do jeito que são, os elétrons alcançam velocidades altas o suficiente para interagirem com moléculas de ar, que por resultado liberam mais partículas de alta energia. O processo vai inflando, até que as colisões tenham energia suficiente para criar reações nuclearesEssas chuvas têm energia o suficiente para gerar uma liberação constante e baixa de radiação gama.

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Com o apoio da NASA, os pesquisadores usaram um avião ER-2, veterano da Guerra Fria – que voa duas vezes mais alto que um avião comum e fica três vezes mais alto que a maioria das tempestades. Para dar uma emoção a mais ao experimento, o avião é extremamente rápido, o que ajudou na caça de chuvas prováveis em produzir radiação gama. Dessa maneira, eles conseguiram voar no topo direto das nuvens e o mais próximo possível das fontes de raios gama.

Os cientistas acreditavam que, por estarem basicamente seguindo as chuvas, seria extremamente difícil enxergar os raios de radiação. Mas aconteceu o contrário: eles encontraram raios até demais. Os voos ocorreram por um período de um mês, com um total de dez viagens nos trópicos do sul da Flórida. Dessas, em nove foi possível observar a radiação gama. 

Algumas dessas explosões eram semelhantes às que foram originalmente detectadas pelos satélites da NASA, quase sempre ocorrendo em conjunto com descargas elétricas ativas. Isso sugere que o grande campo elétrico gerado pelo relâmpago provavelmente intensifica os elétrons de alta energia, permitindo a ocorrência de reações nucleares.

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“A dinâmica das nuvens de tempestade que emitem radiação gama contrasta radicalmente com a antiga visão quase estacionária dos brilhos, assemelhando-se mais a um enorme caldeirão fervente em termos de padrão e comportamento”, comentou Martino Marisaldi, professor de física e tecnologia da Universidade de Bergen.

Também foram identificados pelo menos dois outros tipos de explosões curtas de radiação gama que nunca haviam sido observados antes. Um deles consiste em uma sequência de cerca de 10 explosões individuais, que se repetem ao longo de aproximadamente um décimo de segundo. O outro é incrivelmente breve, durando menos de um milésimo de segundo.

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“Essas duas novas formas de radiação gama são as que mais me intrigam”, disse Cummer. “Elas não parecem estar associadas a descargas de relâmpagos em desenvolvimento. Surgem espontaneamente de alguma forma. Existem indícios nos dados de que elas podem estar ligadas aos processos que iniciam as descargas, que continuam a ser um mistério para os cientistas.”

As mudanças climáticas podem tornar as tempestades que geram essa atividade de raios gama mais comuns, mas provavelmente não afetariam sua intensidade.

Sobre os impactos atmosféricos ou no clima, Cummer diz que não consegue pensar imediatamente em uma influência direta, mas que com certeza as partículas de alta energia deixam para trás algum tipo de química atípica.

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De acordo com os estudos, os satélites conseguem identificar os flashes de radiação em algumas tempestades fora dos trópicos, mas é essencial que esteja acontecendo um verdadeiro chuvaréu para o fenômeno ocorrer. Além disso, a maioria dos raios que vemos são raios comuns, de apenas reações elétricas, ou seja, que não emitem radiação.

E para quem está assustado com a possibilidade de encontrar uma chuva dessas, pode relaxar. Essa baixa quantidade de radiação só seria perigosa em uma situação em que você tivesse contato frequente com a fonte. 

“A radiação seria o menor dos seus problemas se você se encontrasse lá. Os aviões evitam voar em núcleos de tempestades ativas devido à turbulência extrema e aos ventos”, diz Cummer. 

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