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Tuataras são “mistura” de répteis e mamíferos, revela sequenciamento genético

Ele é considerado um "fóssil vivo": trata-se da última espécie viva do seu grupo; e preserva características do ancestral comum entre dinossauros, aves, mamíferos e outros répteis.

Por Bruno Carbinatto
10 ago 2020, 20h09

À primeira vista, o animal da foto pode parecer um lagarto ou algum tipo de iguana, mas a aparência engana. Na verdade, se trata de um tuatara, o último réptil existente da ordem dos Rhynchocephalia. Vários representantes desse grupo existiam na época dos dinossauros, mas agora apenas os tuataras ainda resistem, e encontram-se extensamente ameaçados de extinção. Por estar totalmente isolado na árvore genealógica da vida, o animal é bastante peculiar – e muito valioso para a ciência.

Agora, pela primeira vez, cientistas conseguiram sequenciar e estudar o genoma completo dos tuataras, o que revelou que o animal é único à nível genético, e apresenta uma mistura de características de répteis, aves e mamíferos. Como eles só são encontrado em algumas ilhas da Nova Zelândia – em meio a rigorosas legislações ambientais para evitar sua extinção –, o estudo dos tuataras não é algo fácil. A nova pesquisa só foi possível em parceria com a etnia Ngātiwai dos Māori – os nativos da Nova Zelândia –, que possuem o papel de guardiões da espécie em partes do país.

Assim como os ornitorrincos, os tuataras são às vezes considerados “fósseis vivos” por preservarem características antigas e não encontradas em nenhum outro animal. Os parentes mais próximos dos bichos são os da ordem Squamata, que inclui lagartos e cobras, mas mesmo assim há uma grande distância entre esses primos: estima-se que os dois grupos se separaram há 250 milhões de anos. Em termos de comparação, os primatas surgiram há “apenas” 65 milhões de anos, e os hominídeos, que deram origem a nós, só há 6 milhões. Ou seja, mesmo que lembre visualmente, os lagartos e os tuataras são bem diferentes e separados por centenas de milhões de anos de evolução. Todas as outras espécies do grupo dos tuataras foram extintas mais ou menos na mesma época dos dinossauros, mas esses pequenos répteis permaneceram.

Como se não bastasse essa bela história de vida, esses animais também tem características físicas bastante peculiares. Eles podem ultrapassar os 100 anos de vida, possuem características morfológicas (como a disposição de alguns ossos) parecidas com a de algumas aves, conseguem suportar temperaturas frias sem hibernar e possuem outros comportamentos ainda pouco compreendidos. Ou seja: a espécie é realmente intrigante para a ciência.

Com o novo estudo, publicado na revista Nature, pesquisadores australianos conseguiram entender melhor o que torna esses animais únicos. Ao sequenciar o genoma dos tuataras (que é relativamente grande, 50% maior que dos humanos), a equipe encontrou “transposons” que são comuns em outros grupos de animais. Transposons, também chamados de “genes saltadores”, são pedaços do material genético que conseguem se mover no genoma, “pulando” de um cromossomo para outro. Analisando esses pedaços específicos de genes dos tuataras, os cientistas descobriram que alguns pareciam genes de mamíferos, enquanto outros pareciam de répteis.

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“O genoma do tuatara continha cerca de 4% de genes saltadores que são comuns em répteis, cerca de 10% que são comuns em monotremados (como ornitorrincos e equidnas) e menos de 1% que são comuns em mamíferos placentários, como humanos”, explica David Adelson, primeiro autor no novo artigo. “Esta foi uma observação altamente incomum, e indica que o genoma de tuatara é uma estranha combinação de componentes de mamíferos e de répteis.”

Estudar o genoma desse fóssil vivo ajuda a entender como era o ancestral comum que deu origem aos amniotas, grupo que se refere a todo animal que cujos embriões são rodeados por uma membrana amniótica, que incluem dinossauros, aves, mamíferos e os répteis atuais, segundo os autores. A equipe também descobriu que o tuatara é a espécie de réptil conhecida que evolui mais lentamente, ou seja, é o que temos de mais preservado desse extinto ancestral comum de vários animais terrestres.

Infelizmente, além de extremamente raro, o tuatara também está altamente ameaçado de extinção, correndo o risco de ser o ponto final de toda uma ordem de animais. É verdade que, nas últimas décadas, o número de espécimes de tuataras tem se mantido estável e até crescido graças ao esforço do governo da Nova Zelândia em proteger a espécie, já que ele só existe em algumas ilhas do país. Nesse processo, os Māori têm um papel importante, já que consideram o animal um “Taonga” – palavra sem tradução específica que significa algo como um “tesouro natural” que deve ser preservado.

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Mesmo assim, a pequena distribuição geográfica dos animais e o aquecimento global ameaçam a espécie. Assim como acontece com outros répteis (como a tartaruga), o clima influencia na reprodução desses bichos: dependendo da temperatura, os tuataras se diferenciam entre macho e fêmea ainda no ovo. Uma temperatura média maior do planeta pode fazer com que nasçam mais machos do que fêmeas, causando um desequilibro na população que já é pequena e vulnerável. Por isso, os autores do estudo chamam a atenção sobre a necessidade de se preservar ainda mais a espécie.

Tuataras “permanecem em perigo por causa da sua distribuição altamente restrita, das ameaças impostas por doenças e pelas mudanças na proporção entre os sexos induzidas por mudanças climáticas que podem afetar significativamente sua sobrevivência”, escreveram no estudo.

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