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Uns blefam, outros silenciam

Só os fortes sobrevivem. Ou os espertos. No reino animal, há bichos que se defendem dos predadores ostentando cores que sinalizam perigo. Outros fingem imitando espécies ameçadoras. Os dissimulados esforçam-se para não serem percebidos.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h36 - Publicado em 31 jan 2000, 22h00

André Santoro

Quem leva uma picada de marimbondo nunca mais se descuida quando torna a encontrar um pela frente. Os animais também não. Eles memorizam as experiências malsucedidas e evitam repeti-las. Quando são predadores, a experiência e a cautela podem livrar o algoz de uma vítima venenosa. Para as vítimas, por sua vez, alardear a periculosidade pode ser a salvação.

Só que muitas presas simplesmente blefam. Assim, como os bichos que produzem toxinas geralmente têm cores vistosas, como vermelho e amarelo, diversas espécies evoluem até adquirir colorações “perigosas”. Outras copiam não só o colorido como também a forma dos colegas enfezados. É o caso das inofensivas esperanças – insetos do grupo dos grilos e dos gafanhotos –, que imitam vespas venenosas. Puro fingimento.

“Existem duas boas maneiras de não ser comido na natureza: anunciar-se como algo ameaçador ou tentar passar despercebido na mata”, diz o biólogo João Vasconcellos-Neto, da Universidade Estadual de Campinas. Ele estuda as artimanhas do reino animal desde 1976. Muita gente pensa que esses dois comportamentos defensivos são uma coisa só, o mimetismo. “É um erro, essa palavra só se aplica às espécies que imitam outras”, explica o pesquisador. “As que se disfarçam estão recorrendo a uma estratégia chamada cripsis. São crípticas.” Cada um, afinal, se vira como pode.

O que os olhos não conseguem ver

Quem não tem veneno imita outro bicho ou finge-se de pedra, galho ou folhagem. “Para se camuflar, vários animais adotaram uma coloração capaz de confundi-los com o pano de fundo”, afirma João Vasconcellos-Neto. Esconder-se é a solução.

A dissimulação é geralmente impecável – você mesmo pode ver nas fotos destas páginas. Mas não é infalível. Depois de observar com atenção, o predador acaba fixando uma imagem da presa, por mais misturada que ela esteja aos desenhos e às tonalidades do ambiente. Daí em diante, não se engana mais. Os disfarçados, por isso, procuram não ficar no mesmo lugar e evitar aglomerações. “Quanto mais indivíduos há num local, mais chances eles têm de ser encontrados”, ressalta o pesquisador da Unicamp.

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E tem mais. Os disfarces não devem permanecer idênticos para que a camuflagem seja mais eficiente. O ideal é que eles sofram pequenas mutações com o tempo. Quando os bichos de um grupo se mantêm exatamente iguais por longo período, os predadores aprendem mais rápido o que procurar. Tirou-se a prova numa experiência em que pombos foram confrontados com imagens de insetos geradas por computador. Quanto menos variações apresentassem, mais imediatamente eram atacadas pelas aves. “Na natureza, a evolução favorece a raridade, não a abundância”, filosofa Vasconcellos-Neto. Em outras palavras, mesmo quando o disfarce é bom, é melhor não abusar.

asantoro@abril.com.br

Algo mais

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Este sapo amazônico usa duas táticas para escapar. A primeira é a camuflagem – seu dorso parece estar coberto por liquens, o que permite que se esconda entre folhas e pedras. Mas, uma vez descoberto, ele vira a barriga para cima, pois a cor do seu ventre indica que ele é tóxico.

Pensa que é uma vespa?

De fato, trata-se de uma inofensiva esperança, uma prima dos grilos. A mesma espécie pode evoluir e adquirir cores e formatos diferentes de vespa para que os predadores não a ataquem. Esta aqui, chamada Scaphura nigra, foi fotografada na Serra do Japi, no interior de São Paulo

Arrrgh!

Os besouros da familia Chrysomelidae não são coloridos à toa. O pigmento amarelo é um aviso – na linguagem da selva, quer dizer “eu sou venenoso”. Esses insetos fabricam substâncias tóxicas insuportáveis ao paladar de seus predadores, os pássaros

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Falta de personalidade

A cor desta barata, fotografada no Parque Nacional de Itatiaia, no Rio de Janeiro, dá a entender que ela tem gosto ruim. É que, sem conseguir produzir o mesmo veneno do besouro acima, ela o imita

A cor do veneno

Este sapinho intimida os predadores com sua cor intensa. O amarelo mostra que ele é tóxico. Assim, pode se dar ao luxo de chamar atenção na folhagem desse jeito

Modelo vivo

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Como o besouro acima, esta borboleta, da espécie Mechanitis polymnia, produz uma droga que torna seu gosto extremamente desagradável. Outras borboletas copiam seu padrão de cores, tentando se proteger por tabela

Casulo ou folha?

O casulo da borboleta Phoebis sp. seria uma presa fácil para qualquer pássaro se não fosse pela aparência enganadora de folha que a evolução lhe assegurou

O coaxar das folhas

Além de interpretar brilhantemente o papel de folhagem, as rãs do gênero Eleutherodactylus sp. ainda têm um risco no dorso que confunde mais os predadores

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Falso detrito

Esta esperança, fotografada no Acre, adotou as formas do seu hábitat para ficar invisível. Tente encontrá-la na imagem acima, entre os detritos vegetais nos quais se esconde

Pedra que se move

Você achou fácil encontrar a esperança? Então que tal localizar uma perereca na foto acima? Ela se chama Hyla alvarengai, vive na Serra do Cipó, em Minas Gerais, e se disfarça em rochas cheias de líquens

Fantasia campeã

Você pode não acreditar, mas o graveto aqui à direita é uma aranha. O outro, do lado dele, é um graveto mesmo. Ela pertence à família Thomisadae e fica assim, paradona, pendurada pela teia, logo após pôr os ovos. Eles ficam num saco existente em seu abdômen

Como um mineral

Os gafanhotos da família Acrididae devoram arbustos na pedregosa Serra do Cipó, em Minas Gerais. Nada melhor, então, do que misturar-se ao mosaico de pedras da região para não virar almoço de pássaro

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