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África: do genocídio à AIDS

Por Redação Planeta Sustentável
Atualizado em 19 ago 2024, 10h41 - Publicado em 18 dez 2008, 19h15

Em 2004, a história de um genocídio em um país africano tomou proporções mundiais graças a um filme hollywoodiano chamado Hotel Ruanda. Nele, a terrível guerra entre hutus e tutsis foi difundida por todos os continentes. Paul Rusesabagina, gerente do Hotel des Milles Collines, conseguiu salvar a vida de cerca de mil pessoas, escondendo-as em seu trabalho e negociando com diversas autoridades para que, pelo menos, aquelas vidas fossem poupadas do genocídio que acontecia fora das paredes da propriedade.

O genocídio aconteceu em 1994, logo após o presidente do país, que tinha acabado de assinar um acordo de paz entre as duas etnias, morreu em um atentado. O conflito entre os dois grupos, então, que estava latente, assolou o país, culminando no quase extermínio da minoria tutsi. À época, as autoridades mundiais, como a ONU, fizeram pouco para proteger o grupo étnico, tornando as ruas da capital Kigali, por exemplo, em grandes cemitérios abertos.

O escritor Philip Gourevitch retratou o período em que o massacre aconteceu no livro Gostaríamos de informá-lo de que amanhã seremos mortos com nossas famílias. Antes de começar a narrativa de suas entrevistas e andadas pelo país, Gourevitch escreveu um parágrafo introdutório:

“Dizimação significa o assassinato de uma em cada dez pessoas de uma população. Na primavera e no verão de 1994, um programa de massacres dizimou a população da República de Ruanda. Embora os assassinatos tenham sido executados com baixa tecnologia – geralmente com facão -, eles se consumaram com vertiginosa rapidez: de uma população original de cerca de 7,5 milhões, pelo menos 800 mil pessoas foram mortas em apenas cem dias. Os mortos de Ruanda se acumularam numa velocidade de quase três vezes maior que a dos judeus mortos durante o Holocausto. Foi o mais eficiente assassinato em massa desde os bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki.”

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Esses dados, porém, demoraram para chegar à grande mídia. Talvez porque a África não esteja entre os continentes mais ricos, talvez pelo descaso que as autoridades governamentais têm com alguns países pobres. Mas, de qualquer forma, uma cena do filme que pode demonstrar uma certa explicação é quando o coronel Oliver explica a Paul o motivo do mundo não intervir na situação caótica do país: “Você é negro. Você não é nem um preto. Você é um africano”.

Quando se lê a situação de Ruanda no livro de Gourevitch, a primeira idéia que se passa é que tudo aconteceu por causa de uma alucinação coletiva. Por que um grupo étnico decide exterminar outro, que só é identificável pelos documentos governamentais? O que faz um tutsi ser inferior a um hutu? Qual a diferença entre ter o nariz um pouco mais achatado ou uma cara mais arredondada? E tudo isso é motivo para se exterminar um outro povo?

Líderes do grupo hutu usavam os meios de comunicação para estimular ainda mais o ódio e incitar mais massacres:

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“Com o incentivo de tais mensagens e de líderes em todas as camadas da sociedade, a matança de tutsis e o assassinato de oposicionistas hutus espalhavam-se de uma região a outra. Seguindo o exemplo das milícias, jovens e velhos hutus engajaram-se na tarefa. Vizinhos matavam vizinhos a facadas em suas casas, colegas matavam colegas a facadas em seus locais de trabalho. Médicos matavam seus pacientes e professores matavam seus alunos. Em poucos dias, as populações tutsis de muitas aldeias estavam praticamente eliminadas, e em Kigali prisioneiros eram soltos para integrar equipes de trabalho encarregadas de recolher cadáveres das sarjetas. Por toda Ruanda, estupros e saques em massa acompanharam a matança. Bandos de milicianos bêbados, estimulados por drogas das farmácias saqueadas, eram levados de ônibus de massacre em massacre. Locutores de rádio lembravam aos ouvintes que não tivessem pena de mulheres e crianças. Como um incentivo extra aos assassinos, os pertences dos tutsis eram loteados antecipadamente – o rádio, o sofá, a cabra, a oportunidade de estuprar uma garota. Conta-se que uma mulher que participava de um conselho de bairro oferecia cinqüenta francos ruandeses (cerca de trinta centavos de dólar, na época) por cabeça de tutsi rachada, uma prática conhecida como ‘venda de repolho’.” (pág. 112)

A história de Paul não foi escolhida para ser mostrada nas telonas à toa. Paul fez o que quase ninguém teve coragem: ajudar um povo assustado que, da noite para o dia, deveria ser eliminado. Ele usou todos os seus contatos e a sua influência para proteger, pelo menos, algumas centenas de pessoas. Parece pouco? Talvez não.

“Pegue a estimativa mais acurada: 800 mil mortos em cem dias. Isso dá 333,3 assassinatos por hora, ou 5,5 vidas exterminadas por minuto. Considere também que a maior parte dessa matança ocorreu de fato nas primeiras três ou quatro semanas, e acrescente à taxa de mortos as legiões não computadas de mutilados que não morreram em decorrência de seus ferimentos, bem como a contínua e sistemática violação de mulheres tutsis – e então você terá uma idéia do que significou o fato de o Hotel des Milles Collines ser o único lugar em Ruanda em que nada menos que mil pessoas marcadas para morrer se concentraram e, como disse Paul com toda a calma, “ninguém foi morto; ninguém foi aprisionado; ninguém foi espancado”. (Pág. 130)

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Embora mais de 14 anos tenham se passado, o continente africano ainda passa por problemas que, muitas vezes, não chegam à população de outros países. É por isso que o site The Hub, que já comentamos aqui, entrou como parceiro à Association des Jeunes pour le Developpement Integre-Kalundu para mostrar a situação dos soropositivos da República Democrático do Congo.

A campanha Awaiting Tomorrow (esperando o amanhã, em tradução livre) nasceu para conscientizar o mundo das condições precárias que os cerca de 1,3 milhão de portadores do HIV do país passam. Para se ter uma idéia, aproximadamente 100 mil pessoas já morreram em decorrência da AIDS e mais de 930 mil crianças já perderam, pelo menos, um dos pais. Apenas 5% dos portadores estão recebendo os medicamentos adequados.

Vale assistir a entrevista com Jean-Jacques, de 25 anos, que tem AIDS há um ano, e sofre as conseqüências de não ter assistência médica do governo para tratar a doença.

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Se antes a informação não chegava, agora é a falta de ação que prejudica a vida dos cidadãos de um país africano.

blogcoletiva-africa Este post faz parte da blogagem coletiva sobre a África. Para ver os demais posts sobre o tema, clique aqui
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