Retrospectiva SUPER 2014: 10 personalidades do ano
Por Karin Hueck
10. Gabriela Lemos, física
Gabriela Lemos é uma mineira de 32 anos que conseguiu demonstrar com uma clareza inédita o mais misterioso de todos os fenômenos físicos: o emaranhamento quântico. Graças a um experimento liderado por ela, foi possível visualizar como dois fótons “gêmeos”, originados da mesma fonte de energia, passam informações entre si instantaneamente – sem estar em contato um com o outro. Para deixar a história ainda mais legal, a informação que Gabriela resolveu passar entre os dois fótons foi a imagem de um gatinho – uma singela homenagem a um dos pais da mecânica quântica, Erwin Schrödinger, que definiu aquele famoso paradoxo do gato. O trabalho foi publicado na Nature e rendeu a Gabriela, que está fazendo um pós-doutorado em Viena, reconhecimento internacional.
9. Valesca Popozuda, funkeira
Quando Valesca Popozuda lançou o primeiro single de sua carreira solo, “Beijinho no ombro”, no finzinho de 2013, não imaginava o furor que causaria. A música virou hit, mas quem estourou mesmo foi a funkeira. Graças às declarações que deu em seguida, Valesca acabou alçada à ídola feminista. “Deu vontade de fazer, faça!” e “Sonho com o dia que vão parar de rotular as mulheres de puta ou piranha por causa de sua postura de vida. Por que a mulher que beija dois é piranha e o cara que beija duas é garanhão?”, disse. Para melhorar, a cantora, que já havia selecionado uma transexual como sua bailarina, entrou em campanhas contra o estupro e o assédio sexual. É isso aí, Valesca.
8. Thomas Piketty, economista
Até um autor de livro de economia entrou no ranking. Foi neste ano que o francês Thomas Piketty virou best-seller com seu O Capital no Século XXI, um calhamaço de 672 páginas. Nele, o economista explicou o que já andava visível na lista dos homens mais ricos do mundo: que o de cima sobe e o de baixo desce. Baseado em quinze anos de pesquisa, Piketty concluiu que o acúmulo de renda é parte inerente do capitalismo e mostrou que a desigualdade social não para de crescer desde os anos 1970. Isso, por sua vez, traria instabilidade social e só poderia ser revertido com a intervenção dos Estados. O livro foi bem recebido entre especialistas. Liberais do mundo agora vão ter de se unir para reagir.
7. Christopher Nolan, cineasta
O diretor americano sempre gostou de filmar histórias com algum fundo “científico”: foi assim com Amnésia (sobre a memória) e Inception (sobre sonhos lúcidos). Mas em Interestelar ele viajou ainda mais longe. O longa, sobre a busca humana por um novo lar quando acabarmos com os recursos da Terra, mostra conceitos que todo astrônomo amador sonhava em ver de perto: a Teoria da Relatividade agindo, os buracos de minhoca, viagens por buracos negros, e um mundo de cinco dimensões. Tudo em imagens cientificamente precisas, exibidas em um telão de apenas duas dimensões. Haja abstração.
6. Malala Yousafzai, Nobel da Paz
Malala tinha 15 anos, quando tomou três tiros à queima-roupa – um deles na cara – dentro do ônibus que a levava para a escola em outubro de 2012. A menina paquistanesa foi atacada por membros do Talibã depois de relatar em seu blog como era a vida em uma região dominada pelo grupo. Malala também lutava pelo direito de garotas de frequentarem a escola. Para sua grande sorte – e a do mundo -, a adolescente sobreviveu. Não só continuou a luta, como acabou virando a mais nova pessoa a receber um prêmio Nobel na história. O uniforme escolar que ela vestia no dia em que foi atacada, todo ensaguentado, agora está em exposição na Noruega.
5. Sheik Umar Khan, virologista
Em 2014, depois de quase 40 anos adormecido, o ebola voltou com tudo. Até agora, a crise se espalhou por cinco países da África Ocidental, e matou mais de 6500 pessoas, com uma taxa de mortalidade de até assustadores 90%. No meio desse cenário, no coração de Serra Leoa, trabalhava o mais importante virologista do país, Sheik Umar Khan. Especialista em febres hemorrágicas como o ebola, Khan tinha o hábito de abraçar os pacientes que conseguia curar. Tratou pessoalmente de mais de 100 doentes este ano. No final de julho, porém, o próprio médico acabou contaminado, e morreu aos 39 anos. “Preciso dizer que estou com medo, porque eu valorizo a minha vida”, havia dito poucas semanas antes. Nós também valorizamos, dr. Khan.
4. Lukas Podolski, atacante da seleção alemã
A seleção alemã chegou ao Brasil para ganhar: a Copa e a simpatia dos brasileiros. Assim que desembarcou por aqui resolveu conquistar nossa torcida: cantou o hino do Bahia, dançou o lepo-lepo e doou dinheiro para comunidades indígenas. Entre a escalação, o mais aclimatado era o atacante Lukas Podolski, que no dia 10 de julho tuitou que andava até assistindo novela. Foi o que bastou para virar meme. Logo o twitter inundou: “Podolski tão brasileiro que sai com cabelo pingando creme na rua pra fofocar”, “Podolski comendo pastelzinho na fila do kilo antes de pesar o prato”, “Podolski tão brasileiro que quando compra presente de aniversário fala: ‘é só uma lembrancinha’”. Foi a sensação da Copa, depois daquele outro evento.
3. Tim Cook, CEO da Apple
Não deveria ser notícia, mas foi. Quando Tim Cook, CEO da toda-poderosa Apple, saiu do armário num artigo na revista Bloomberg Businessweek, o mundo parou para ouvir. Foi aplaudido, mas também repudiado (por malucos, como um político russo que propôs bani-lo da Rússia). Cook decidiu se assumir porque acredita que a informação poderia inspirar quem está tentando se aceitar, e tornar mais fácil a vida de gays e lésbicas ao redor do mundo. Pela comoção que gerou, ele está certinho. “Tenho orgulho de ser gay”, escreveu. Ponto pra ele.
2. Roberto Bolaños, o Chaves
Atire o primeiro sanduíche de presunto quem nunca citou infamemente um “sem querer querendo” ou um “isso, isso, isso” no meio de uma conversa séria. O mexicano Roberto Bolaños, que interpretou Chaves e Chapolin Colorado ao longo de duas décadas na TV, morreu em dezembro de 2014, comovendo gerações de atentos espectadores e mostrando que não é preciso cenários extravagantes ou roteiros mirabolantes para fazer bom entretenimento. Sua morte deixou o Brasil, o México e o SBT órfãos – e o mundo um pouco mais sem graça.
1. Artur Avila, matemático
Quem sempre chorou a ausência do Brasil nas nomeações do prêmio Nobel, pôde se sentir vingado em 2014. Artur Avila, de apenas 35 anos, ganhou a Medalha Fields, a mais importante premiação de matemática do mundo, por suas “contribuições na teoria dos sistemas dinâmicos”. O carioca é reconhecido por lidar com problemas de diversas áreas da matemática (como tentar prever de que lado da mesa de sinuca uma bola específica vai bater) e por publicar trabalhos com dezenas de colegas (cerca de 30). Foi o maior prêmio científico já condecorado a um brasileiro, e a primeira vez que a Fields foi para um cientista do hemisfério sul. Não é pouca coisa, não.