Escrito pela autora Gillian Flynn e publicado no Brasil pela editora Intrínseca, Garota Exemplar (448 pgs., R$ 39,90) traz a história de um casamento conturbado. De um lado temos Nick, marido avoado e com problemas familiares, que acha que sua vida é boa do jeito que estiver. Do outro está Amy, uma mulher decidida, forte, angustiada e independente, mas que quer um bom marido acima de tudo.
Tudo anda normalmente na vida dos dois até que, no quinto aniversário de casamento, Amy desaparece. Os indícios de uma briga na casa, os lugares suspeitos frequentados por Nick momentos antes e, acima de tudo, o comportamento estranho dele diante do desaparecimento fazem com que todos acreditem que o marido é o culpado. Mas ele jura ao leitor que não sequestrou sua mulher.
A narrativa do livro é contada pelo ponto de vista dos dois personagens principais. Nick é responsável por narrar o presente, a partir do dia do desaparecimento. Amy tem seu ponto de vista contado a partir de páginas do seu diário, ficando responsável por nos relatar o passado dos dois: como se conheceram, como se casaram, como foram os primeiros anos de casamento e como o relacionamento estava difícil.
Com capítulos intercalados, a autora desvia a atenção do leitor para fatos importantes de cada personagem, fazendo sua lealdade alternar entre os dois. Uma hora você está do lado de Nick, logo depois você acredita apenas em Amy. O livro é dividido em três partes, uma separação essencial para a história. Em cada uma delas, a autora foca algum acontecimento maior e importante, o que enriquece a narrativa e permite um bom desenrolar da história.
Os personagens criados são todos muito complexos. Amy é, de longe, uma das melhores protagonistas femininas já lidas por mim, com sua bipolaridade extrema e personalidade forte. Já Nick tem uma personalidade um tanto quanto difícil e, em alguns momentos, irritante.
Os dois personagens principais conseguem ter uma relação muito completa em todos os sentidos: amor, raiva, traição, cumplicidade etc. Os secundários não se deixam apagar: os pais de Amy podem gerar identificação com o leitor e Go, irmã de Nick, consegue ser um bom alívio cômico em momentos tensos da história.
É uma trama densa, que precisa de uma grande construção para o clímax, mas que peca na sua introdução. Boa parte do começo é cheia de enrolação. Por mais que a história seja instigante, essa primeira parte do livro passa devagar e, em alguns momentos, se arrasta. São 200 páginas de muita investigação e certas informações irrelevantes.
Tudo muda na segunda parte, com uma grande revelação que faz com que o leitor vire as outras 250 páginas furiosamente em busca do final. Diga-se de passagem: foi um excelente desfecho dado pela autora.
Gillian Flynn criou uma história incrível. Com uma escrita inteligente, ela nos dá mistérios um tanto quanto difíceis para resolver: até onde vai a crueldade humana? Quanta maldade cada um tem dentro de si? Quais são as consequências de um crime para seu praticante, se esse for mais inteligente que a polícia? E por fim: um relacionamento pode ter tantas camadas de falsidade, amor, angústia, frustração, desejo e vingança e, ainda assim, sobreviver?