Luiz Dal Monte Neto
Em 1915, em Hannover, Alemanha, um certo G. Capellen publicou um livreto chamado Zwei Neue Kriegspiele (Dois novos jogos de guerra). A época, convenhamos, não era propícia para o lazer associado a temas bélicos. Afinal, estava em curso a Primeira Guerra Mundial. Talvez por isso ele tenha sido esquecido. Décadas mais tarde, o americano Sidney Sackson, um dos maiores especialistas mundiais em jogos, garimpando raridades num sebo, descobriu o trabalho de Capellen e o divulgou em seu livro A gamut of games (Uma série de jogos). Na verdade, o livreto continha simplesmente dois jogos inofensivos: o primeiro, uma variedade do xadrez; o segundo, um curioso jogo de cartas chamado Mate, em que não intervém a sorte, ao contrário da imensa maioria dos jogos com baralho.
Mate é praticado por dois participantes, usando um baralho comum, do qual se eliminam todas as cartas, exceto os ases, os reis, as damas, os dez e os setes.
Á uma hierarquia entre as cartas. Assim, por exemplo, um dez de copas é mais valioso que uma dama de copas, mais é inferior a um dez de paus. Primeiro, escolhe-se o carteado por sorteio. Ele deve embaralhar as vinte cartas e distribuir dez para cada um. Em seguida, inicia o jogo descartando uma de suas certas com a face para cima, à sua frente. Então, será a vez do adversário, que deverá descartar uma carta do mesmo naipe, à sua escolha.
A carta é colocada na frente da primeira, também com a face para cima. Essas duas cartas constituem o que Capellen chamava de movimento. Aquele que descartou a carta mais valiosa num movimento deve descartar a primeira carta do movimento seguinte, e assim por diante. Se um jogador não tiver cartas do naipe descartado pelo oponente, ele tem que descartado uma do mesmo valor, de qualquer naipe. Exemplificando: o jogador A descarta um rei de outro, o B, uma dama de ouro; portanto, o A ganhou o movimento e inicia o próximo com qualquer carta. Outro exemplo: o jogador A descarta um dez de espadas e o B, por não possuir nenhuma carta de espadas, descarta um dez de paus, ganhando o movimento, pois paus é superior a espadas.
As cartas vão compondo duas fileiras a frente dos jogadores, cada qual formada com os descartes de um deles. O jogo prossegue desse modo, até que um dos competidores inicie um movimento com uma carta que o oponente não tenha condições de seguir, nem em naipe, nem em valor. Diz-se, nesse caso, que o jogador deu mate no adversário. É possível que as cartas se esgotem, sem que ninguém dê mate, situação de empate em que não se contam os pontos. Quando alguém dá mate, ganha um número de pontos igual o valor da última carta descartada multiplicado pela quantidade de movimentos. Para efeito da pontuação, as cartas têm os seguintes valores: às = 11:10 = 10; rei = 4; dama = 3; e 7 = 7 pontos. Isso encerra a primeira mão.
Uma partida completa de Mate consiste em quatro mãos, divididas em duas fases. Após se anotarem os pontos relativos à primeira mão, cada jogador recolhe as cartas que pertenciam ao adversário e disputa-se a segunda mão com as cartas trocadas. Quem inicia é o perdedor da primeira mão (se houve empate, inicia quem não o fez anteriormente). Após o término da segunda mão, as cartas são recolhidas e, dessa vez, embaralhadas para a segunda fase. Nessa, disputa-se a terceira mão e, após trocar novamente as cartas, a quarta e última. O vencedor da partida será quem totalizar o maior número de pontos, depois de somados os resultados parciais.
É essa troca de cartas que elimina o fator sorte, obrigando os jogadores a tentar superar a performance adversária, pois ambos têm a ocasião de experimentar as mesmas distribuições de cartas, sejam elas favoráveis ou não. As regras básicas do jogo são essas, mas existe ainda um recurso à disposição dos jogadores: o descarte prévio. Esse recurso consiste em fazer um descarte anterior ao primeiro movimento, antes de a mão começar. Qualquer um dos jogadores pode optar por fazê-lo, todavia quem inicia a mão deve sempre dizer antes do oponente se optará pelo descarte prévio. Quem opta em segundo lugar não pode fazer um descarte prévio com o mesmo naipe ou com o mesmo valor daquele que precedeu.
A vantagem de se fazer um descarte prévio reside na possibilidade de aumentar o valor dos pontos em caso de vitória, uma vez que ele acrescentará um ponto, por definição, no número final de movimentos. Se os dois fizerem o descarte prévio, a moção terá apenas nove movimentos. Se apenas um o fizer, ele ficará com nove cartas contra dez do oponente. Por isso, se a mão se estender até o décimo movimento, ele usará nele a mesma carta utilizada no nono descarte. Se um participante jogar com nove cartas contra dez do adversário e conseguir da mate com a décima carta (a nona repetida), diz-se que houve um supermate, e os pontos são contados em dobro.