Texto Marina Bessa e Rodrigo Ratier
Se o lucro das novas reservas de petróleo for mesmo investido em educação, como sinalizou o presidente Lula, seria uma ajuda considerável. Claro que tudo depende da quantidade de petróleo existente, de quanto será possível extrair e do modelo de exploração escolhido.
Estima-se que haja entre 40 bilhões e 80 bilhões de barris de petróleo nos campos pré-sal, que ficam entre 4,5 mil e 7 mil metros abaixo do nível do mar. Esse óleo deve começar a ser explorado para valer em 2015, quando, segundo José Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras, a produção brasileira deve passar de 1,9 milhão de barris por dia para 4,1 milhões de barris por dia. Com esses 2,2 milhões de barris extras, o governo poderia lucrar de R$ 45 bilhões a R$ 107 bilhões ao ano, dependendo do modelo de exploração a ser adotado. Na pior das hipóteses, o lucro, somado aos 3% do PIB já destinados à educação básica, seria capaz, logo no primeiro ano, de erradicar o analfabetismo (cerca de 15 milhões de brasileiros com mais de 15 anos não sabem ler nem escrever) e garantir que todo mundo em idade escolar tenha acesso a todos os níveis da educação básica (por enquanto, apenas o ensino fundamental, de 6 a 14 anos, está praticamente universalizado). Mas não daria para melhorar a qualidade do ensino.
Esse desafio exige mais investimento por estudante. Atualmente, o governo gasta R$ 1 072 por aluno por ano. Países da OCDE, o clube das 30 nações mais desenvolvidas, gastam 5 vezes mais. Se quisermos alcançá-los, com o modelo compartilhado, o gasto anual terá de ser de R$ 450 bilhões – R$ 390 bilhões saídos do pré-sal. Nesse caso, seria preciso ser muito otimista e contar com mais de 8 milhões de barris por dia, o equivalente à produção da Arábia Saudita, a número 1 em produção no ranking da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Aí, sim, viveríamos por pelo menos algumas décadas o milagre da educação.
O buraco é mais embaixo
Se 100% do lucro do pré-sal for somado ao orçamento da educação, será possível colocar todo mundo na escola. Mas melhorar a qualidade é outra história
1. Nível de qualidade Brasil
Todas as pessoas em idade escolar teriam acesso a escola, mas a qualidade do ensino se manteria como ela é hoje. O investimento do governo é de R$ 1 072 por aluno por ano.
2. Nível de qualidade do INEP
Nível de qualidade de ensino semelhante ao do Chile (o melhor da América Latina), considerado o mínimo aceitável pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. Seria necessário investir mais R$ 100 bilhões por ano ou R$ 1 901 por aluno.
3. Nível de qualidade OCDE
Padrão de qualidade digno do clube dos 30 países mais desenvolvidos do mundo, como Finlândia, Nova Zelândia e Canadá. O investimento anual, de cerca de R$ 5 300 por aluno, garantiria boa formação dos professores e estrutura escolar ideal.
Previsão realista de extração
Estima-se que o pré-sal possa aumentar a produção brasileira de 1,9 milhão para 4,1 milhões de barris diários. Seriam 2,2 milhões de barris a mais por dia. Portanto, esse é o limite entre realidade e sonho.
Situação 1: Modelo atual
O governo cede o direito de explorar áreas de extração em troca do pagamento de royalties e taxas especiais sobre produção. Margem de lucro: R$ 56 por barril**.
Nível 1 – 1,50
É só querer
Para chegar aqui, bastaria o comprometimento do governo: o Brasil já produz esta quantidade de barris por dia.
Nível 2 – 4,90
Não custa sonhar
Se produzíssimos mais petróleo que o Irã, o segundo no ranking da Opep, alcançaríamos este patamar.
Nível 3 – 19,11
Sonho impossível
Seria preciso um investimento correspondente a 62% da extração de petróleo de todos os países membros da Opep juntos.
Situação 2: Modelo compartilhado
Os riscos e os custos de investimento são divididos entre governo e empresa, mas as proporções de distribuição dos lucros são predefinidas. Margem de lucro: R$ 133 por barril**.
Nível 1 – 0,60
Obrigatório
Com menos da metade da produção prevista, todo mundo estaria alfabetizado e na escola.
Nível 2 – 2,05
Possível
Basta as estimativas de extração serem confirmadas e o governo investir 100% dos lucros.
Nível 3 – 8,03
Muito otimista
Precisaríamos encostar na produção de petróleo da Arábia Saudita, a número 1 do ranking da Opep.
Por que é tão difícil?
Nenhuma destas realidades será possível antes de 2015, quando a Petrobras espera começar a exploração do pré-sal. É que extrair esse petróleo não é tarefa fácil. Antes de chegar ao óleo, é preciso vencer 2 mil metros de água, 2 mil metros de rochas e terra e pelo menos outros 2 quilômetros de sal. Além de impor condições extremas de pressão e temperatura, essa última camada é especialmente complicada: sua característica fluida dificulta a perfuração. Chegar lá sem o risco de desmoronamento é dos maiores desafios tecnológicos já enfrentados no Brasil.