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Ideia 88: Polícia para quem precisa

A ação das autoridades nas manifestações dos últimos meses expôs um problema que há muito tempo preocupa especialistas: o despreparo da polícia para proteger e servir o cidadão. Veja o que precisa mudar para que ela cumpra melhor esse papel

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h52 - Publicado em 6 jan 2014, 22h00

Tarso Araújo

Bombas de gás lacrimogênio nos pulmões de pedestres, pimenta nos olhos de manifestantes pacíficos, balas de borracha na imprensa, uso de armas não letais em pessoas já imobilizadas, policiais mascarados e sem identificação, prisões arbitrárias. A ação da polícia nos protestos dos últimos meses deu a impressão de que ela estava contra o povo nas ruas. Em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin precisou dar entrevista para dizer que não era bem assim: “Ela atua até para proteger os próprios manifestantes”, disse. O problema, porém, não é novo nem restrito aos protestos. “A classe média ficou assustada com a violência da PM nas manifestações, mas é assim que funciona há muito tempo no dia a dia das periferias. A diferença é que na favela a bala não é de borracha”, diz o sociólogo Luiz Felipe Zilli, do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência da UFRJ. Especialistas consultados pela SUPER são unânimes: é preciso fazer uma profunda reforma na polícia. Uma pesquisa de 2010 feita em todo o Brasil pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) revela que a população também não está satisfeita: 67% dos entrevistados acham que a polícia não trata as pessoas com respeito e 63% acham que ela é incompetente. Apesar dos problemas, a polícia é uma instituição fundamental para a democracia, quando garante ao cidadão sua integridade física e a de seu patrimônio, mas também seus direitos humanos e civis. O que fazer para que ela cumpra esse papel? “Não existe solução mágica”, diz Luciana Guimarães, diretora do Instituto Sou da Paz. “É preciso repensar todo o sistema para criar uma polícia mais inteligente, eficaz e próxima da sociedade.” É difícil, mas não impossível. A seguir, conheça algumas ideias para reinventar a polícia – e colocá-la mais perto do cidadão.

Ideia 89: Unificar as forças
O Brasil é um dos únicos países em que a Constituição prevê a existência de duas polícias em cada Estado: uma civil, responsável por investigar crimes, e outra militar, encarregada de “preservar a ordem pública”. O ideal seria unificar as duas, para especialistas civis (os militares discordam). “Precisamos de uma polícia que cuide do ciclo completo, da prevenção à investigação. Hoje, um mesmo caso é tratado por duas corporações que muitas vezes não se comunicam e não raramente se enfrentam”, diz Luiz Felipe Zilli. Para unificar as polícias, seria preciso mudar a Constituição. “Mas investir em gestão para integrar o trabalho das duas já ajudaria muito”, diz Luciana Guimarães.

Ideia 90: Acabar com a PM
Até 1964, a Polícia Militar era uma força auxiliar do exército. Com o início da ditadura, ela se tornou um instrumento de vigilância nas cidades. E a Constituição de 1988 pouco mudou essa orientação. “A polícia que tem mais contato com a população é militarizada, isso é complicado”, diz Viviane Cubas, do Núcleo de Estudos da Violência da USP. “É um modelo que coloca todos os outros como possíveis inimigos, incentiva uma postura mais violenta da polícia contra uma comunidade de quem ela deveria estar próxima.” Desmilitarizar não significa, porém, abrir mão de hierarquia, uso de farda e da força, inclusive armada, quando necessário. A polícia de Nova York, referência mundial, funciona assim, apesar de ser civil.

Ideia 88: Polícia para quem precisa

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Ideia 91: Fiscalizar a patrulha
“A polícia está autorizada a usar força proporcional ao enfrentamento que ela encontra. Mas quando usa essa autorização sem regra, sem que se saiba a finalidade e sem punir os excessos, complica”, diz Viviane Cubas. A polícia é fiscalizada por ouvidorias, corregedorias e pelo Ministério Público (MP). Mas, apesar de esses instrumentos terem evoluído nas últimas décadas, ainda deixam a desejar. A maioria dos desvios de conduta e mesmo crimes cometidos por policiais são apurados internamente – no caso da PM, em tribunais militares. E isso é um problema. “Quando há troca de tiros e morte, quase nenhuma perícia é feita, o processo é baseado no depoimento dos policiais e o MP geralmente confirma a versão deles”, diz a socióloga. “É preciso ter mais prestação de contas, um controle externo maior e melhor.”

Ideia 92: Guardas que dão bom dia
Um levantamento feito em Belo Horizonte mostrou que as ocorrências criminais representam uma pequena parte do trabalho da PM. Mais de 90% do tempo dos policiais é gasto resolvendo outras coisas – brigas de vizinhos, pedidos de informação e até ajuda em partos. “Nascem cerca de 60 crianças por ano em viaturas”, diz Álvaro Camilo, vereador e ex-comandante da PM de São Paulo. Apesar disso, o treinamento da maioria das escolas de formação de policiais é voltado para a “guerra ao crime”. Resultado: 60% das pessoas que têm contato com a polícia consideram seu atendimento regular a péssimo, segundo o Ipea – sendo que 11% delas dizem ter sido agredidas verbalmente pelos policiais. “Há Estados em que a formação [do policial] dura apenas três meses. Precisamos buscar melhores práticas e atender melhor as pessoas”, diz Camilo.

Ideia 93: Delegacias informatizadas
“A Polícia Civil no Brasil é um cartório”, diz Luciana Guimarães, do Sou da Paz. “Na polícia ainda existe a figura do escrivão, que registra os crimes num livro”. A socióloga contaque, na maioria das delegacias, tudo é feito em papel e à mão. Polícias com algum nível de informatização e ferramentas de análise de dados são exceções. O uso de tecnologia ajuda a identificar padrões e conexões de crimes, a distribuir melhor os recursos e a alimentar os serviços de inteligência. Com diagnósticos mais precisos dos problemas, seria mais fácil prevenir e resolver os crimes. “A situação é tão desesperadora que pequenas mudanças nessa área poderiam ter um impacto enorme na eficiência da polícia”, diz Luciana.

Imagens: GettyImages

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