Junte os cacos
Com o tangram, o quebra-cabeça das infinitas formas, você brinca até solucionando problemas geométricos.
Luiz Dal Monte Neto
Como o filósofo chinês de uma antiga lenda, maravilhado ao descobrir que podia recriar o mundo com as sete partes em que havia se despedaçado seu ladrilho quadrado, o leitor pode se divertir compondo silhuetas de objetos, bichos e pessoas com grande expressividade. Basta usar as peças do tangram.
Para começar, você pode construir seu próprio quebra-cabeça. É fácil. Num pedaço quadrado de cartão com aproximadamente 12 centímetros de lado desenhe o esquema da figura abaixo e depois recorte as partes. A regra de ouro do jogo consiste em utilizar para cada figura as sete peças, nem mais, nem menos, dispostas sem sobreposição. Elas podem, porém, ser viradas com a face para baixo, o que faz diferença no caso da peça em forma de paralelogramo – razão pela qual é conveniente que o cartão tenha a mesma cor em ambos os lados. (Se procurar, talvez você encontre à venda jogos prontos, industrializados ou artesanais.)
Abaixo, à esquerda, você também vê duas silhuetas que podem ser montadas com as peças. Existem milhares delas, criadas tanto por grandes nomes do mundo dos quebra-cabeças como por aficionados anônimos. Mais divertido que reproduzi-las é criar suas próprias imagens. Boa memória visual, sensibilidade e um certo senso de humor ajudam a obter ótimos resultados.
Um lado menos conhecido do tangram é o dos problemas geométricos. Um exemplo clássico é o dos polígonos convexos: quantas dessas figuras, essencialmente diferentes entre si, podem ser construídas com o tangram e quais são elas? Por essencialmente diferentes queremos dizer: não valem as duplicatas obtidas mediante simples rotação ou inversão da figura, ou por meio de arranjos alternativos dentro dela. (Só para reforçar a memória: o polígono convexo não tem ângulos internos maiores do que 180 graus. Assim, escolhidos dois pontos em lados diferentes do polígono convexo, estejam eles onde estiverem, o segmento de reta que os une estará sempre contido dentro dela.) O leitor quer tentar descobri-las? Dou-lhe a boa notícia de que elas são em pequeno número. A má notícia é ter que encontrá-las todas, para vencer o desafio.
Sugiro ao bravo leitor do Superdivertido que interrompa neste ponto, momentaneamente, a leitura do artigo, para pôr as mãos na massa e trabalhar na solução. É bom também evitar olhar no final do artigo, onde estão as respostas.
A quantidade de polígonos possíveis é de apenas treze. Isso foi provado em 1942 por Fu Traing Wang e Chuan-Chih Hsiung, da Universidade Nacional de Chekiang, na China. Segundo nos conta Joost
Elffers em seu livro Tangram – The Ancient Chinese Shapes Game (Penguin Books, Londres, 1976), a demonstração converte engenhosamente a questão geométrica em termos algébricos.
Partindo da premissa de que o tangram pode ser decomposto em dezesseis triângulos pequenos, iguais à menor peça do quebra-cabeça, Fu Traing Wang e Chuan-Chih analisaram as possibilidades de combinações entre eles, chegando a deduzir que podem formar exatamente vinte polígonos convexos com eles, dos quais treze podem ser compostos pelas peças do tangram. O livro de Elffers apresenta resumidamente a demonstração.
Mas quais são os polígonos? Certamente o leitor não esqueceu o próprio quadrado original, o mais óbvio deles e o único regular. A partir de ligeiras modificações, movendo-se apenas as duas peças maiores, pode-se obter um triângulo, um retângulo, um paralelogramo e um trapézio isósceles (na seção de soluções optei por apresentar essas formas com arranjos internos diferentes). Há mais dois trapézios, retos; dois pentágonos, sendo um deles com os cinco lados diferentes entre si; e, finalmente, quatro hexágonos, um deles representando a silhueta de uma casinha. Esse tangram não perde mesmo a mania de inventar formas.
Luiz Dal Monte Neto é arquiteto e designer de jogos e brinquedos