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Mais um, dois, três e menos sete, oito e nove

Observação mostra uma curiosa teimosia dos dados numéricos

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h50 - Publicado em 4 jul 2009, 22h00

Luis Barco

Depois de ler um interessante artigo do matemático inglês Ian Stewart publicado na revista inglesa New Scientist, cujo titulo pode ser traduzido como “A meia vida de um livro sujo”, não resisti e propus aos meus alunos a seguinte questão: certo livro tem as primeiras páginas bastantes sujas, relevando que foram muito manuseadas, enquanto as últimas estão totalmente limpas. Suponha que esse livro seja uma tabela de logaritmos e dê uma explicação lógica para isso. È claro que ninguém, em juízo perfeito, apanha uma tábua de logaritmo com a intenção de lê-la até o fim. Como explicar, então, o manuseio mais intenso das primeiras pagina?
A explicação mais plausível para isso foi dada em 1938 pelo físico Franck Benford e virou lei. Ele não estava pensando num livro, mas nos números encontrados pelos físicos e engenheiros no desenvolvimento de seus cálculos. Benford argumentava que eles tinham uma acentuada tendência a começar com o digito 1 (um) e raramente iniciavam com o digito 9 (nove). Na realidade, ele dizia que a probabilidade de um determinado digito ocorreu no inicio de um dado diminuía quando se percorria 1 até 9. o senso comum indica que todos os dígitos deveriam apresentar a mesma tendência, ou seja, aparecer no inicio dos dados.

Dessa forma, a lei de Benford parecia ridícula. Acontece que o físico analisou 10 grupos de dados numéricos, incluindo áreas de superfícies de lagos e pesos moleculares de compostos e sempre obteve o mesmo resultado: mais 1 e menos 9. E, de tempos em tempos, a lei de Benford tem recebido nova confirmação. Uma das mais recentes apareceu no Jornal Europeu de Física: é um estudo de B.buck e A.C. Merchant da Universidade de Oxford e S. M Peres da Universidade de Capetown, África do Sul, sobre o tempo que leva um núcleo atômico para perder metade de sua radioatividade pela emissão de partículas alfa. A regra parece valer tanto para as meias-vidas dos livros quanto para aquelas calculadas pelos físicos. Buch e seus colegas alertam para o fato de que comportamento semelhante foi observado nas contas de luz de cientistas americanos residentes nas Ilhas Salomão e nos dígitos iniciais de vinte das mais importantes físicas.

Só por curiosidade, apanhei o caderno de Economia do Jornal O Estado de São Paulo do dia 12 de setembro de 1993. Na página B-7 encontrei uma tabela com os preços mínimos dos leiloes das estatais privatizadas mais disputadas e o percentual de ágio da quantidade de ações em ofertas em milhões de dólares. Obtive o número de ocorrências (mostrado entre parênteses) de um dado digito inicial: 1(14), 2(9), 3(3), 4(4), 5(2), 6(2), 7(2), 8(1), 9(3). Apesar de ser uma tabela pequena, ela obedece razoavelmente à lei de Benford. Na verdade, seria apenas uma curiosidade não fosse uma surpreendente propriedade que ela apresenta: se listarmos as áreas dos lagos de uma região, por exemplo, veremos que os números que registram essas medidas se enquadram na lei. Isto é, seus dígitos 1, 2,3 são bem mais freqüentes que os dígitos 7, 8,9. Se expressarmos tal fato em metros quadrados, ou jardas quadradas ou palmos quadrados os dados continuam a obedecer à lei. Ou seja, ela é invariável para diferentes medidas.

Assim, se uma tabela tomada ao acaso se encaixa nas regras de Benford, é grande a probabilidade de que tal concordância continue, quer multipliquemos todos os valores da tabela por 7 ou por 93. O mesmo ocorre se contarmos a “meia-vida” da partícula alfa em segundos ou em séculos. O professor Pinkhan da Universidade de Rutgers, nos Estados Unidos, Provou que a lei de Benford é a única lei distributiva invariável para diferentes medidas. Isso quer dizer que ela pode ser vista como evidencia para vários fenômenos da natureza que também sejam invariáveis em relação às medidas. A invariabilidade quanto à medida que a lei de Benford apresenta parece muito boa para a meia-vida das partículas, para as áreas dos lagos, para as contas de luz ou para as taxas de câmbio. Mas ainda resta uma indagação: por que a natureza escolheu operar dessa curiosa maneira? Os especialistas em sistemas dinâmicos acreditam que tal lei faz parte da moderna e surpreendente Geometria do Caos e ela pode estar nos dizendo que a numerologia da natureza resulta de seu caos dinâmico básico. Ou, como diz Ian Stewart em seu artigo, “é uma grande conclusão para se tirar de uma teoria que se originou da atenta leitura de livros com paginas um tanto sujas”.

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