Bruno Romani
Para convencer uma pessoa, não precisa dizer a verdade, mas usar os argumentos certos. Ou recorrer a uma falácia lógica, como são chamados erros de raciocínio que não sustentam a conclusão, mas que enganam bem. Saiba quando alguém tenta enrolar você.
Correlação de coincidência
“Ontem teve uma tempestade solar e hoje meu celular não está funcionando. Há alguma dúvida de que isso tenha causado o problema?”
Há, sim. Uma infinidade de causas pode ter afetado o funcionamento do telefone, além da tempestade solar. Mas há quem se apresse para concluir que um evento causou o outro por terem ocorrido em sequência. E coincidências acontecem. É o mesmo que uma pessoa dizer que perdeu o emprego porque passou por debaixo da escada horas antes – e ignorar que a empresa estava em reestruturação.
Declive escorregadio
“Se legalizarmos a maconha, logo vamos ter que legalizar a cocaína e, depois, o crack. Por fim, viveremos em um mundo de drogados.”
Esse tipo de falácia é como escorregar numa casquinha de banana bem numa ladeira. Para validar o que pensa, o argumentador apresenta uma consequência inaceitável para um dado inicial. A partir daí, engancha uma série de eventos, um pior que o outro. Para deixar mais plausível seu argumento, o autor pode colocar algumas premissas válidas depois da falsa.
Insinuação
“Eu não falei que a carne estava dura. Só disse que o gato que fica lá fora desapareceu.”
Quando nos comunicamos uns com os outros, temos expectativas e fazemos suposições que nos ajudam a simplificar a conversa. Com essas ferramentas, ficamos livres de ter que explicar todos os detalhes daquilo que falamos. Ao selecionar palavras, a insinuação usa as suposições para sugerir coisas depreciativas sobre algo ou alguém para as quais não há provas.
Apelo à pessoa
“Dieta macrobiótica é a melhor; afinal, é o que a Madonna come.”
A fama de uma pessoa não torna magicamente algo válido. Quem sabe qual a melhor dieta é um nutricionista, e não uma pop-star, por mais que ela consiga fazer estripulias no palco aos 53 anos. Esse tipo de falácia serve também para o oposto – usar a má fama para invalidar a palavra de alguém. É o que acontece se alguém disser que não dá para confiar nos conselhos de uma nutricionista que vive comendo coxinha na padaria.
Omissão de provas
“Em 11 jogos este ano, o Íbis Sport Club não perdeu um!”
Certo, mas quantos jogos o time empatou? Se empatou todos os 11, a campanha do Íbis não foi tão boa quanto o argumento sugere. Como diz o próprio nome, nessa falácia o argumentador deixa de apresentar dados que poderiam comprometer o que ele tenta provar. Para derrubar o autor de falácias assim, basta exigir aquilo que ficou de fora na primeira tentativa.
Pergunta complexa
“Você acha que uma mãe tem direito de matar a vida em seu ventre?”
A questão parece simples – “sim” ou “não”. Mas, se quem responder for a favor do aborto, vai ter que se passar por homicida ou negar sua posição. Isso porque, antes de jogar essa pergunta, deveria ter-se perguntado quando ele considera o início da vida. Se for só depois do parto ou de certo tempo de gestação, a pergunta perde o sentido.
Apelo à ignorância
“Não existem fenômenos sobrenaturais. Afinal, jamais alguém conseguiu prová-los.”
Essa estratégia é bem simples e parte da premissa de que uma coisa ou é verdadeira ou é falsa. Isto é, se não está provado que algo é verdadeiro, logo é falso – ou, se não está provado que é falso, logo é verdadeiro. O que esse sujeito tem que entender, no entanto, é que a ausência de prova não é a prova de ausência. Como deveria ser óbvio, se não há prova, resta a dúvida. O que o autor desse tipo de falácia na verdade faz é passar para o interlocutor a responsabilidade pela prova, enquanto ela deveria ficar com quem faz a afirmação.
Falso Dilema
“Brasil, ame-o ou deixe-o.”
Ser ou não ser? Essa não é a questão. Um falso dilema nasce quando quem faz o argumento oferece um número limitado de perspectivas em um assunto que permitiria várias opções. Foi o que aconteceu no slogan mais famoso da ditadura militar brasileira no final dos anos 1960. Os militares desejavam um país sem questionamentos, e amar o Brasil significava aceitar passivamente tudo o que acontecia. A falha do argumento é clara. Da mesma forma que é possível amar o país e questioná-lo por querer que ele mude, dá para mudar-se para o exterior e continuar a amar a pátria. O dilema nunca existiu.