Luiz Dal Monte Neto
Quantos lápis de cor o leitor usava para decorar seus cadernos de cartografia? Eu usava muitos e obtinha resultados que hoje me parecem bastante duvidosos. Atualmente, saberia me virar melhor com menos cores. Mas qual seria o número mínimo de lápis que me permitiria colorir qualquer mapa?
Em 1853, essa questão ocorreu a Francis Guthrie, um estudante londrino. Enquanto desenhava um mapa da Inglaterra, ele percebeu que era possível pintas todos os territórios, usando somente quatro cores. Será que elas seriam suficientes para colorir qualquer mapa? Francis passou o problema a seu irmão mais novo, que o remeteu ao matemático Augusto De Morgan, que se interessou por ele. Desde então muitas boas cabeças tentaram em vão demonstrar o teorema das quatro cores.
O problema consiste em provar que é possível colorir com quatro cores um mapa de uma região qualquer (um município, um estado, um país, um continente, etc.), dividido em territórios, de modo que dois territórios adjacentes não tenham a mesma cor. São considerados adjacentes apenas os territórios que têm uma linha comum como parte de suas fronteiras. Essa condição é necessária, para excluir aqueles que têm só um ponto em comum, já que, nesse caso, regiões organizadas em forma de fatias de bolo necessitariam tantas cores quantos fossem os territórios. Além disso, deve-se pressupor que cada território seja uma região continua, isto é, não pode estar fragmentado (por exemplo, não valem casos como o de Fernando de Noronha, relativamente a Pernambuco).
Embora haja mapas que possam ser pintados com apenas duas cores (caso de um tabuleiro de xadrez), é evidente que somente três cores ainda não seriam suficientes na paleta do cartógrafo. Mas seriam elas suficientes para qualquer caso? O curioso é que, se formos desenhando um mapa, território por território, pintando-os conforme vão surgindo, podemos facilmente ferrar situações em que a inclusão de mais dois ou três exija uma quinta cor. Mas, depois de pronto o desenho, se iniciarmos novamente a pintura, rearranjando as cores, sempre conseguiremos solucionar o mapa com quatro tintas mesmo incluindo os territórios antes problemáticos.
Finalmente, em 1976, dois professores de Matemática, Kenneth Appel e Wolfgang Haken, da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, demonstraram o teorema. Fatos como esse eralmente agitam bastante os círculos matemáticos, envolvendo-os num clima de celebração e curiosidade. Desta vez, porém, a esses sentimentos somou-se uma certa perplexidade, pois a demonstração era distinta de qualquer outra já formulada. Além de ocupar centenas de páginas com diagramas e textos complexos, a prova de Appel e Haken utilizava pela primeira vez o recurso de um computador para verificar certos aspectos necessários à demonstração. Sem ele, não seria possível analisar a enorme quantidade de casos possíveis, suficientes para provar o teorema (o trabalho ocupou 1200 horas de um equipamento veloz). Pior: sem um computador, não é possível verificar a exatidão da prova. Isso abriu uma grande polêmica sobre a validade da demonstração de Appel e Haken, envolvendo até aspectos filosóficos. Embora a maior parte dos matemáticos aceite o método deles, alguns o questionam.
Enquanto a discussão prossegue e outra demonstração mais elegante é procurada coisa que pode muito bem não existir – é possível nos divertimos com o jogo das quatro cores. Para isso o leitor precisará de quatro lápis ou canetas de cores diferentes, uma folha de papel e um amigo. A partida se desenvolve em duas etapas, o mapeamento e a pintura. Na primeira, um dos participantes delimita uma grande área na folha. Em seguida, alternam-se traçando linhas no interior dela, de modo a subdividi-la num bom numero de setores. A quantidade e a complexidade dessas divisões ficam a gosto.
Na segunda etapa, os jogadores se alternam colorindo um território por vez. No seu turno cada um pode escolher qualquer uma das quatro cores para pintar qualquer território ainda em branco, desde que, obviamente, não repita nenhuma cor já usada nos setores adjacentes. A partida termina quando alguém não puder fazer um lance sem infringir as regras, tornando-se o perdedor, Pode haver empatem se o mapa terminar integralmente colorido. Com mapas mais complexos, o jogo fica mais interessante, mas as despesas com oftalmologista correm por conta do leitor.
Luiz Dal Monte Neto é arquiteto e designer de jogos e brinquedos.
Para matar saudade
Estalo – jogo para dois a seis participantes, produzido pela Grow Jogos e Brinquedos S.A.
Nos últimos anos têm sido comuns lançamentos que adaptam ou simplesmente reproduzem velhos jogos de sociedade. É o caso, por exemplo, da Academia, cuja mecânica é a mesma do Dictionarv, onde: os competidores se alternam tentando adivinhar o significado de palavras obscuras. O mesmo acontece com Perfil, adaptação do Twenty Questions, em que o objetivo é descobrir a identidade; de alguém (ou de algo) através de vinte perguntes. Palavra Final é reelaboração de Gibberish, onde os adversários vão alinhando palavras numa seqüência aparentemente absurda, até que: a inclusão de sinais de pontuação lhe confira algum sentido. São apenas três exemplos, mas servem para configurar uma tendência. Agora, acrescente-se a eles o Estalo, para provar que a Grow aposta firme
na vitalidade dos mais tradicionais passatempos de salão.
E por que não? Num momento em que somos submetidos a uma overdose de jogos eletrônicos – alguns bons, muitos ruins, e a grande maioria péssima –, é saudável olhar para trás e resgatar diversões simples, capazes de reunir pessoas interessantes em torno de objetivos inteligentes. Até para não nos esquecermos de que grande parte do interesse de um jogo, se não a maior parte, reside no adversário (alguém, exagerando, já disse que não existem jogos ruins, e sim maus oponentes).
Estalo é uma versão prêt-à-porter do conhecidíssimo Stop, um freqüentador habitual dos bancos escolares. Duvido que algum leitor não o conheça, mas, em todo caso, vamos relembrar: os jogadores escolhem de comum acordo um certo número de categorias, que todos anotam em folhas de papel (por exemplo, marcas de auto-moveis, títulos de livros, espécies de flores, etc. ). Cada um na sua vez diz uma letra e todos se põem a escrever palavras que a tenham por inicial e que pertençam às categorias escolhidas. O primeiro a preencher todas eles diz Stop e põe fim à rodada. Cada palavra não lembrada pelos adversários dá a seu autor um certo numero de pontos.
Há diferença entre jogar pôquer com fichas de acrílico e grãos de feijão. Também entre jogar Stop improvisadamente e com os componentes de Estalo. Seja pela variedade de categorias pré-selecionadas, seja pelos simpáticos acessórios, como o timer ajustável para três níveis de dificuldade, que pode ser usado em inúmeros outros jogos onde se faz necessário um controle de tempo