O Teorema de Meneses
Leitor da Super demonstra por a + b que a matemática é uma ótima receita contra o tédio.
Luiz Barco
Há quem diga que o mal do próximo século será a solidão. Não ousaria discordar, embora ache que uma bem administrada dose dela não faz mal a ninguém. Triste mesmo é o tédio, capaz de abater qualquer um, mesmo quando cercado por uma multidão. Vários leitores têm me provado, no entanto, que a Matemática pode ser um excelente antídoto contra o aborrecimento. Vou provar isso para vocês.
Na edição de fevereiro deste ano, apresentei um pequeno problema, demonstrando que o sucessor do produto de quatro números inteiros, positivos e consecutivos, é sempre um quadrado perfeito. Ou seja: 1 x 2 x 3 x 4 + 1 = 25, que é o quadrado de 5, pois 52 = 25. Outro exemplo: 3 x 4 x 5 x 6 + 1 = 361, que é o quadrado de 19, pois 192 = 361.
Confesso que não esperava tamanha repercussão. Venho recebendo desde então um grande número de cartas, ora resolvendo o problema de outra forma, ora completando a demonstração, além de algumas com comentários. Uma das que mais me chamaram a atenção veio do leitor Francisco Meneses, de São Paulo. Pelo jeito, ele deve gostar muito de Matemática, mas quase nada de escrever. Lacônico, Francisco datilografou sobre uma fotocópia do artigo nove breves linhas com uma nova e criativa conclusão algébrica para o mesmo problema, que resolvi batizar de Teorema de Meneses.
Segundo ele, 4 x 5 x 6 x 7 + 1 é um quadrado perfeito, pois é sempre igual a (4 x 7 + 1)2 . O mesmo se pode dizer de 5 x 6 x 7 x 8 + 1, porque o resultado é sempre igual a (5 x 8 + 1)2. Matematicamente, isso significa que o sucessor do produto de quatro números inteiros positivos e consecutivos é sempre igual ao quadrado do sucessor do produto do primeiro pelo último desses quatro números. Vamos traduzir isso para o português: multiplicar, um pelo outro, quatro números de uma seqüência, e somar 1, dá na mesma que multiplicar o primeiro e o último da série, acrescentar 1 e elevar o resultado ao quadrado.
Coincidência? Que nada. Isso não existe em Matemática. Se uma situação como essa se repete sempre, pode ter certeza de que há por trás uma lei da Álgebra, com uma fórmula, uma equação, que a demonstre. Procure me acompanhar. Vamos chamar de “x” o primeiro número de qualquer seqüência. Você há de concordar comigo, portanto, que os seguintes são x+1, x+2 e x+3. Conseqüentemente, o sucessor do produto desses números se escreveria assim: x(x+1) (x+2) (x+3) + 1.
Os exemplos dados por Meneses mostram que isso é igual a {x (x+3)+1}2. Se você efetuar a multiplicação, vai descobrir que o resultado é (x2+3x+1)2. Mas e daí? Daí que essa equação é exatamente o resultado da outra:
x (x+1) (x+2) (x+3)+1. Fazendo a multiplicação, chega-se a x4+6×3+11×2+6x+1. A fatoração desse polinômio dá exatamente (x2+3x+1)2.
Agradeço ao Francisco Meneses pelo simpático teorema. Gostaria de falar mais sobre ele, mas não posso. Depois de apresentar-se como assinante da SUPER e leitor assíduo da coluna “2+2”, ele nada mais disse. Sua carta, porém, é o bastante para concluir que se trata de um homem sem tédio, pois sabe extrair prazer de brincar com os números – como, aliás, queríamos demonstrar.
Professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo