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Para onde vamos?

A ciência já sabe de onde viemos. Mas e agora? Onde o Universo vai parar? Quem viver não verá, porque o breu vai ser total

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h51 - Publicado em 9 fev 2015, 22h00

Salvador Nogueira

Um técnico americano de beisebol, Yogi Berra, sintetizou tudo: “É duro fazer predições – especialmente quando são sobre o futuro”. Diante da veracidade dessa afirmação, os cientistas têm muito do que se orgulhar. A duras penas, conseguiram conceber teorias físicas que não só foram capazes de dizer como o Universo progrediu desde seu surgimento como também permitiram extrapolar, de maneira razoável, como o Universo irá se desenvolver daqui para os próximos zilhões de anos. O que não sabem é até quando a humanidade terá um espaço nele. E isso inclui amanhã.

Talvez a maior desvantagem de fazer parte de uma civilização tecnológica seja o inevitável desenvolvimento de uma série cada vez maior de maneiras de ela acabar de uma vez por todas com si mesma. Esse é um raciocínio que começou a ser mais exercitado pelos pensadores depois da criação da bomba atômica. A proliferação exuberante de técnicas de suicídio coletivo talvez explique por que ainda não encontramos nenhum alienígena inteligente lá fora – é provável que todos os que foram espertos o suficiente (como nós) para desenvolver suas primeiras espaçonaves e radiotelescópios tenham se matado antes de conseguir estabelecer contato com alguém.

Por mais que não gostemos, essa é uma resposta bem possível ao famoso paradoxo de Fermi. Em 1950, durante uma animada conversa após o almoço com seus colegas, o ítalo-americano Enrico Fermi ouvia argumentos entusiasmados sobre quão provável seria a existência de outras civilizações no cosmos. Com uma indagação, o cientista nuclear quebrou as pernas dos entusiastas da vida inteligente: “Então onde está todo mundo?”

A premissa é simples: se é tão fácil o desenvolvimento de civilizações Universo afora, como ainda não encontramos nenhum sinal claro de sua presença? Nem uma sonda não tripulada, nem um monólito, nem um sinal de rádio… nada. (Ou, pelo menos, nada que possa ser verificado cientificamente como prova de vida extraterrestre.) É fato que, uma vez que tivesse desenvolvido uma determinada capacidade tecnológica e de voo espacial (não muito distante da que temos hoje), uma espécie alienígena teria facilidade para espalhar sinais de sua existência pelo cosmos.

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Entra em cena o conceito das sondas autorreplicadoras de John von Neumann. Se uma civilização criasse pequenos robôs capazes de aproveitar matéria-prima local para se replicar e, dessa forma, se espalhar pela galáxia, 200 bilhões de estrelas da Via Láctea teriam sido visitadas por uma dessas espaçonaves em meio milhão de anos (voando a modestos 10% da velocidade da luz). Comparado com a idade do Universo (cerca de 13,8 bilhões de anos), esse período de tempo é ridiculamente curto. Ou seja, se alguém teve essa ideia lá fora ao longo desse período todo, deveria haver algum sinal disso em nosso Sistema Solar.

Outra hipótese é que a vida inteligente seja muito rara. E pronto. É o que defendem o astrônomo Donald Brownlee e o paleontólogo Peter Ward, em seu livro Sós no Universo? Mas pode ser também que os ETs sabichões tenham simplesmente tropeçado, por acidente ou burrice, em alguma tecnologia que se mostrou fatal para sua existência. Esse é um risco que nós também corremos. A pergunta é: podemos escapar dessa armadilha? Talvez. Mas não vai adiantar grande coisa. A maior bomba nuclear que temos por perto está bem aí no seu nariz. É o Sol. E ela vai detonar.

A terra esquenta

Bom, o Sol até que é uma estrela bem comum – uma do tipo anã amarela com “vida útil” estimada em 10 bilhões a 12 bilhões de anos. Como existem bilhões de astros como ele na Via Láctea, os astrônomos já flagraram objetos semelhantes com várias idades diferentes. Isso, somado ao fato de que entendemos razoavelmente os mecanismos de funcionamento da estrela, implica que sabemos como ela vai evoluir. E as notícias que vêm disso não são boas.

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Hoje, o Sol está em sua meia-idade, com cerca de 5 bilhões de anos. Durante todo esse tempo, a distância entre ele e a Terra permitiu que o planeta tivesse temperaturas amenas em sua superfície, fato essencial para que ele desenvolvesse e abrigasse vida. Só que, ao longo do tempo, o Sol está lentamente se tornando mais quente. Segundo as estimativas de Don Brownlee e Peter Ward, em mais 1 bilhão de anos a alegria da Terra vai acabar: as reações nucleares que acendem o astro estarão mais intensas. E o calor por aqui vai ser tamanho que fará com que todos os oceanos terrestres evaporem, o efeito estufa se acentue de maneira radical e o planeta inteiro seja esterilizado. Nem mesmo as bactérias ou as baratas – clássicas sobreviventes de um holocausto nuclear – poderão viver por aqui. Até lá, é bom que o homem já tenha desenvolvido capacidade para se instalar em outros mundos. Marte, então mais quente do que hoje, pode ser uma boa pedida para essa primeira parada.

Claro que a solução marciana será apenas temporária – em mais uns 5 bilhões de anos, quando o Sol esgotar seu combustível, ele se tornará uma estrela do tipo gigante vermelha, engolindo Mercúrio, Vênus e, possivelmente, a Terra. Embora mais de 200 vezes maior do que hoje, ele será uma estrela mais fria, e o sistema solar estará a ponto de se tornar uma região 100% inabitável. Após essa fase de gigante vermelha, o Sol encolherá até se tornar uma anã branca – o cadáver muito denso de uma estrela morta. Quando isso acontecer, todos os planetas remanescentes serão frios demais para abrigar vida (na forma como a conhecemos, claro).

A essa altura, por sinal, a Via Láctea será bem diferente. Ela já terá colidido com a vizinha galáxia de Andrômeda e se transformado em “Lactômeda”, uma galáxia muito maior que a atual. É o destino das galáxias idosas. Além desse impacto gigante, haverá outros menores, com galáxias anãs vizinhas. No final das contas, só haverá uma galáxia nos arredores. E, com o tempo, isso é tudo que estará ao nosso alcance.

Universos-ilhas

Desde o Big Bang, o Universo está em expansão. E agora num ritmo cada vez mais acelerado. Na prática, isso implica que todas as galáxias estão se afastando umas das outras – exceto aquelas suficientemente próximas para formar “grupos locais”, mantidos pela gravidade. Esses agrupamentos tendem a colidir e formar uma só galáxia – no nosso caso, uma “Lactômeda”.

Só que, afora esses agrupamentos, a expansão prossegue – e em ritmo acelerado. De início, os cientistas imaginavam que a gravidade, que atrai uma galáxia em direção à outra, iria frear o ritmo com que o Universo se espalha. Nada mais natural. Mas não é o que acontece. Desde os anos 90 os astrônomos sabem que a realidade é outra. Estudando supernovas distantes, eles descobriram uma misteriosa “energia escura”, uma força que ninguém sabe o que é, mas que se faz sentir nas maiores escalas do Universo. Ela assumiu o controle da expansão e está contra-atacando a força da gravidade, fazendo com que o cosmos fique cada vez maior.

Esse afastamento das galáxias terá efeitos práticos para nós. O astrofísico Abraham Loeb, do Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica, em Cambridge, nos Estados Unidos, realizou simulações sobre o fim do Universo, e as perspectivas, do ponto de vista humano, não são animadoras. Em 50 bilhões de anos, mesmo os melhores equipamentos só conseguirão detectar uma meia dúzia de galáxias próximas – hoje conseguimos enxergar mais de 100 bilhões. “E, quando o Universo tiver dez vezes a sua idade atual, tudo estará além do nosso horizonte, exceto o que estiver em nossa própria galáxia”, diz Loeb. Será a realização da hipótese aventada pelo filósofo Immanuel Kant, lá no século 18, de que cada galáxia seria como um “universo-ilha”.

E essa é apenas uma das consequências naturais do envelhecimento do nosso Universo. Outra está ligada à segunda lei da termodinâmica, aquela que descreve um fenômeno conhecido como entropia. A ideia é simples: entropia é o que impede o ar que você está respirando agora de subitamente ir se acumular todo na sala ao lado e deixar você no vácuo. Em outras palavras, é a tendência natural que tudo no cosmos parece obrigado a ser mais e mais diluído, distribuído por igual, em toda parte.

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Essa diluição também afeta as estrelas. Elas se formam em nuvens de gás bem densas. Mas, com o tempo, a entropia espalha o gás. E aí fica cada vez mais difícil nascerem novos astros como o Sol. Universo afora, só existirão cadáveres estelares. E eles mesmos acabarão tragados pelos mais estranhos objetos que existem – os buracos negros, aqueles ralos cósmicos com uma gravidade tão intensa que nem a luz consegue escapar. Daqui a 10 mil trilhões de trilhões de trilhões de anos vão sobrar só eles. Todos bem gordos, com massa pelo menos 1 bilhão de vezes maior que a do Sol – isso que dá comer um Universo inteiro… Mas nem mesmo os buracos negros vivem para sempre.

O fim do fim

Alguns físicos especulam que os buracos negros sejam berçários para o nascimento de outros Universos. Mas a única coisa que sabemos com certeza é que eles marcarão o fim deste aqui, pois nem eles são imunes à entropia. A descoberta veio do físico britânico Stephen Hawking. Em 1974, ele calculou que os buracos negros emitem uma forma sutil de radiação. Um calorzinho equivalente a bilionésimos de graus Celsius, o suficiente para manter o espaço em volta dele acima do zero absoluto (-273 ºC). Claro que, conforme o Universo caminha para essa diluição completa, fica mais difícil para uma civilização arranjar energia.
Talvez o último passo na existência da vida seja se instalar nas imediações de um buraco negro, alimentando-se de radiação Hawking. Só que essa força também vai acabar. Isso de emitir radiação vai consumindo a massa do buraco negro bem devagar. Mas sempre. E daqui a uns 10100 anos (o número 1 seguido de 100 zeros) todos eles já terão evaporado. E o Universo estará morto de vez. Tudo aquilo que já formou você, as montanhas, as estrelas e tudo o mais será uma coisa só: um mar escuro de energia. Um mar cada vez mais frio, inerte. Sem nada nem ninguém para acender a luz.

Colisão galáctica

Serão vários finais. Depois da morte do Sol, não sobrarão nem as galáxias

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Antissociais

Em alguns bilhões de anos, nosso pedaço do Universo deve mudar drasticamente. Começa com a expansão dos cosmos, que afasta nossa galáxia de suas vizinhas.

Perigo na vizinhança

Vai cada uma para um canto, exceto aquelas próximas o suficiente para formar “grupos locais”, mantidos coesos pela força da gravidade. Essas começam a se juntar cada vez mais.

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Perto demais

Com o tempo, a aproximação vira uma colisão enorme. Essa colisão deve acontecer entre a Via Láctea, onde vivemos, e a galáxia de Andrômeda, nossa vizinha.

Gigantes sozinhas

Depois dessa batida (e de outras, com vizinhas menores), surge nossa nova galáxia, a “Lactômeda”. Respeitando a expansão do Universo, ela continua se afastando dos outros conglomerados.

Epílogo
Tudo que existe, em alguns trilhões de anos, deve acabar no interior dos buracos negros. Mas nem eles viverão para sempre. As últimas coisas a existir devem desaparecer devagare sempre.E é isso.Fim.

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