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Tudo na ponta da língua

A capacidade prodigiosa de arquivar informações não faz de ninguém um gênio. Mas todo grande sábio tem uma excelente memória.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h47 - Publicado em 30 set 1998, 22h00

Luciana Garbin

Sem a memória, você dificilmente entenderia qualquer texto desta revista. Tampouco saberia andar de bicicleta, não aprenderia a usar o computador e nem sequer conseguiria montar um quebra-cabeças. A inexistência de lembranças o tornaria incapaz de ter amigos. Uma das principais funções cerebrais, a memória ajuda você a repetir os acertos e evitar os erros já cometidos. Ações como andar, entender uma piada ou abrir uma gaveta só são possíveis porque você vai gravando experiências desde o nascimento.

A memória ainda tem um papel primordial na inteligência. É verdade que nem todo mundo com memória de elefante tem um alto quociente de inteligência. Mas os gênios sempre possuem uma capacidade excepcional de registrar informações no cérebro. “Os indivíduos mais inteligentes têm facilidade para desenvolver boas estratégias de memorização”, afirma o psiquatra Cássio Bottino, diretor da Clínica da Memória do Hospital das Clínicas de São Paulo. “Memória e inteligência se influenciam mutuamente”, acrescenta.

Memórias assombrosas

Criadores extraordinários em suas áreas, Pixinguinha e Simonsen também são recordados pelas suas proezas de memória. Autor de Carinhoso, Alfredo da Rocha Viana Filho, o Pixinguinha (1898-1973, foto superior), compunha em um teclado desenhado numa folha de papel. Ele “ouvia” as notas de cabeça. Para quem se espantava com a mania, justificava: “Os pianos de verdade desafinam. Este é mudo e, portanto, não corre o risco”. Igualmente espantosa era a memória do economista e ex-ministro Mário Henrique Simonsen (1935-1997, foto inferior). Em suas aulas na Fundação Getúlio Vargas, no Rio, ele decorava os nomes dos alunos após ler as imensas listas de chamada uma única vez. E não errava.

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O pesadelo de recordar demais

Imagine alguém que nunca se esquece de nada, que se lembra de todos os sonhos em detalhes, de todos os instantes dos dias que viveu, de cada folha de árvore, de cada paisagem que viu ou imaginou. Pois esse prodígio existe, ao menos na literatura. Em 1942, o genial escritor argentino Jorge Luis Borges (1899-1986, foto) publicou em seu livro Ficções o conto “Funes, o Memorioso”. Funes recordava absolutamente tudo o que havia vivido, até os mínimos detalhes. Era um pesadelo. “Ele lembrava cada uma das linhas de espuma que um remo sulcou no Rio Negro, na véspera de uma batalha”, escreve Borges. Seu personagem conta que, sozinho, tinha “mais recordações do que as tiveram todos os homens desde que o mundo é mundo”. O próprio autor, porém, observa: “Suspeito, entretanto, que ele não era muito capaz de pensar. Pensar é esquecer diferenças, é generalizar, abstrair. No abarrotado mundo de Funes não havia senão pormenores.”

Gavetas cerebrais

Ainda bem que você não se lembra de tudo. Se a sua mente não descartasse uma boa parte das informações que recebe, a existência seria insuportável. Você só armazena aquilo de que precisa para seu próprio uso. Dessa maneira, o cérebro torna o mundo gerenciável. De que valeria saber de cor listas intermináveis de fatos e números desnecessários?

A decisão de guardar ou descartar a informação raramente é consciente. É o hipocampo, uma região do cérebro, quem resolve o dilema para você. Como um arquivista, ele guarda o que lhe parece útil em “gavetas”. O veredicto obedece a dois critérios. Primeiro: se a informação tem algum significado emocional. Segundo: se ela se relaciona a algo que você já sabe. Assim, o nome de um namorado ou namorada em potencial tem mais chances de obter uma “vaga” na memória do que o do ministro da Agricultura. Agora, se você já dedica vários circuitos de neurônios à agropecuária brasileira, o nome do ministro também pode despertar o interesse do seu hipocampo.

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O homem dos 58 idiomas

O maior poliglota da atualidade, de acordo com o Livro Guiness dos Recordes, mora no Rio de Janeiro. É Ziad Youssef Fazah (foto), um libanês naturalizado brasileiro, que fala nada menos que 58 idiomas. Aprendeu todos eles em apenas três anos, entre os 14 e os 17. Ele diz que costumava estudar 1 hora por noite, três idiomas de cada vez. Em três meses, já os dominava. Seu método era simples: primeiro memorizava a gramática e depois decorava o vocabulário. No dia seguinte, acordava às 5 horas e ficava falando sozinho, criando diálogos.

Em sua lista, estão idiomas como o cambojano, o vietnamita, o tailandês, o javanês e o finlandês. Para quem quer aprender uma nova língua, Ziad dá uma dica: “O jeito mais fácil de guardar frases é conversando em voz alta, pois você se acostuma com o som das palavras”.

Arquivos bem organizados

Para os cientistas que estudam o cérebro, o fato de o ser humano conseguir reter tanta coisa é um milagre. Um simples bate-papo, por exemplo, requer um esforço mental enorme. Mas há coisas que ficam guardadas na memória e outras que caem no esquecimento. Por quê? A resposta está no funcionamento dos neurônios, as células cerebrais que guardam as informações. Tudo começa nos sentidos. Ao captar os sinais do mundo pela visão, tato, audição, paladar ou olfato, você envia a mensagem para algumas regiões do cérebro, que recebem e traduzem as sensações. Quando um novo aprendizado é registrado, os bilhões de neurônios desencadeiam uma série de sinais elétricos, reações químicas e ligações entre eles. Essas ligações se chamam sinapses. Sempre que você cria ou desativa sinapses, a bioquímica das células do cérebro estará guardando ou apagando informações. É esse jogo de desenhar e apagar que constrói a memória.

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A maior parte do que você percebe fica na memória ativa. É ela que permite a você, por exemplo, fazer cálculos simples ou reter números telefônicos até fazer a ligação. Ao contrário da memória de longo prazo, porém, a memória ativa não estabelece um registro duradouro da informação.

Uma camada da superfície do cérebro, o córtex, guarda a memória de longa duração. Está dividida em alguns tipos. A memória episódica se refere aos fatos do passado, como o primeiro beijo. A memória semântica é um sistema que contém tudo o que você conhece do mundo. É ela que faz você se lembrar do que é uma banana e de quem é o goleiro da seleção brasileira de futebol. Pode parecer absurdo, mas você também consegue se “lembrar do futuro”. Graças a um tipo específico de memória, a prospectiva, você não esquece que tem uma consulta com o dentista marcada para as 10 horas da manhã (a menos que tenha muito medo da broca). Há ainda a memória operacional, que guarda as informações sobre atividades mecânicas, como fazer o laço do sapato. n

Você se lembra disso?

Descubra a quantas anda a sua memória resolvendo este teste.

1. Agenda

Memorize em apenas 2 minutos o maior número possível de compromissos (25 pontos para cada resposta com a hora correta)

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8h Escola

9h Banca de revistas

10h Reunião no escritório

11h Dentista

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12h Encontro com José

13h Almoço de trabalho

14h Cartas no Correio

15h Ligar para Maria

16h Agência de viagens

17h Aula de inglês

2. Palavras

Depois de observar a lista de palavras, repita-as na mesma ordem em que estão escritas (10 pontos por resposta correta. Ao primeiro erro, deixe de contar pontos)

CopoRoupa

RevistaOvo

EscovaCadeira

MesaChuveiro

JanelaDisquete

3. Canastras

Observe as seguintes cartas durante 3 minutos. Feche a revista, espere 2 minutos e escreva as seqüências em um papel (6 pontos por naipe correto)

5 de copas 7 de ouros

5 de espadas 10 de paus

4 de ouros 3 de copas

5 de paus Rei de paus

8 de espadas Dama de paus

10 de espadas 6 de ouros

Rei de espadas Valete de paus

4. Números

Observe atentamente estes números de quatro algarismos durante 2 minutos, no máximo. Depois, tente reproduzi-los (25 pontos a cada resposta correta)

54892851

41805863

5. Caras

Olhe estes rostos durante 2 minutos. Cubra os nomes e tente, depois de uma pausa de 1 minuto, atribuir a cada pessoa o nome correspondente (5 pontos para cada nome ou sobrenome correto)

Carlinhos Prata

Antônio Nogueira

Giuseppe Finno

Pedro Fortes

Roberto Soares

Carmem Silva

Gérson Almeida

Neide Baldacchi

6. Nomes e dados

Em 3 minutos, memorize as informações referentes a estas pessoas. (5 pontos para cada pessoa e informação lembrada corretamente)

‹ Bernardo Fortunato

35 anos

‹ Isabela Virchow

Rio de Janeiro

‹ Paulo Henrique Martins

Av. Brasil, 311

‹ Maria Novaes

Banco do Brasil S.A.

‹ Luís Pereira

fone 3866-8771

‹ Mariana de Souza

Vôo 452

7. Lista

Aqui estão duas listas. Uma de compras, outra de coisas para fazer. Você tem 3 minutos para memorizar as duas. Feche a revista e tente reproduzi-las por escrito depois de uma pausa de 2 minutos. (5 pontos para cada palavra acompanhada por seu número correto)

1) Suco

2) Banana

3) Pão

1) Manteiga

1) Alface

1) Acelga

1) Queijo

8) Macarrão

9) Sal

10) Fósforos

1) Banco

2) Tênis

3) Jornal

4) Oficina mecânica

5) Seguro do carro

6) Ingressos para o teatro

7) Xerox

8) Passagem de avião

9) Presente de casamento

10) Chamada telefônica

8. Na cozinha

Olhe atentamente para estes objetos durante 1 minuto e cubra o desenho. (5 pontos para cada objeto que você conseguir lembrar)

9. Pela estrada afora

Tente gravar, em 2 minutos, as cidades que o ônibus percorre entre São Paulo e o Rio de Janeiro (5 pontos para cada cidade correta. Depois do primeiro erro, não marque nenhum ponto)

Guarulhos • Arujá • Santa Isabel •

Guararema • Jacareí •

São José dos Campos • Caçapava •

Taubaté • Pindamonhangaba •

Guaratinguetá • Lorena • Cruzeiro •

Engenheiro Passos • Itatiaia •

Resende • Volta Redonda •

Barra Mansa • Paracambi •

Nova Iguaçu • São João de Meriti •

10. Poema

Tente decorar este trecho de um poema de Fernando Pessoa em 4 minutos (10 pontos para cada verso correto)

Talvez seja a brisa

Que ronda o fim da estrada

Talvez seja o silêncio

Talvez não seja nada…

Que coisa é que na tarde

Me entristece sem ser?

Sinto como se houvesse

Um mal que acontecer

Mas sinto que o mal que vem

Como se já passasse (…)

Pontuação:

De 0 a 200 pontos: Você, provavelmente, tem problemas com a memória.

De 201 a 450: Você não é nenhum elefante, mas não precisa andar com uma fita amarrada no dedo.

De 451 a 700: Você tem boa memória. Só precisa de um pouco de treino.

De 701 a 940: Memória paquidérmica. Parabéns.

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