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Ahmed Abdallah

Era pelos olhos que ele transparecia a indignação e o fervor de homem eleito.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h33 - Publicado em 31 dez 2001, 22h00

Voltaire Schilling

Mohamad Ahmed Abdallah nasceu no Sudão, na época uma província do Egito governada, de longe, por um paxá turco instalado no Cairo. Mas quem, de fato, mandava naquela enorme região era um funcionário inglês. Nascido em 1843, criado dentro dos rígidos princípios da disciplina sufista, a corrente mais mística do Islã, Ahmed não podia tolerar o desprezo dos turcos pelos preceitos sagrados, muito menos a presença de cristãos comandando o destino dos seguidores do Profeta. Em 1871, ele resolveu afastar-se dos homens e do governo e foi viver isolado na ilha de Aba, no Alto Nilo, no oeste do Sudão. Lá fundou uma mesquita e um centro de estudos e orações.

Depois disso, Ahmed pôs-se a viajar, a partilhar com os pobres os ensinamentos que recebera. Desceu o Nilo Azul e depois cortou o Sudão de leste a oeste, com os ouvidos atentos, escutando as lamúrias do povo e a desesperança das aldeias, espalhando por todos os lados a crença de que um messias estava para chegar. E, chegando, o enviado poria cobro ao desleixo dos turcos com a província, a maior de toda a África. Pelos relatos que conhecemos, Ahmed devia causar grande impressão. Não só como celebrado homem santo que logo ele se tornou, mas também pela presença. Era um sujeito enorme, esguio e de pele bem morena, com uma barba cultivada, dotado de elegância natural, de fala moderada mas sempre firme, incapaz de gritar seja lá com quem fosse. Era pelos olhos que ele transparecia a indignação e o fervor de homem eleito.

Retornando de um daqueles périplos com as sandálias gastas, de volta à ilha, Ahmed trancou-se num retiro, mortificando-se num demorado jejum entremeado por rezas e meditações. Por fim, convenceu-se. Como não vira antes? Ele era o messias, era ele o Madhi, o esperado. A sua missão de enviado divino ficou clara: sacudir o Sudão. Afastar do poder os prepostos do paxá, pôr a correr dali os brancos cristãos, gente infiel que infestava Cartum, a capital. Conclamou o Sudão inteiro que se apresentasse a ele, o ungido de Alá. E disse a todos que Deus lhe ordenara uma jihad, a guerra santa.

Em 1883, um exército de dervixes (como os sudaneses pobres se chamavam) ocupou a cidade de El Obeid. Os ingleses enviaram então para Cartum ninguém menos que o lendário general Charles Gordon, herói de várias guerras coloniais britânicas na China e na Rússia. Inútil. Em 1884, a guarnição anglo-egípcia foi posta sob sítio. Depois de 320 dias de cerco, Cartum caiu. Gordon, reconhecido, foi morto. A cabeça dele, espetada e envolta em pó. O Sudão inteiro, agitando lanças e escudos, celebrou a liberdade. A profecia se cumprira, o povo do Profeta matara o Dajjal, o demônio infiel.

Ahmed morreu em seguida, de tifo. Seus seguidores foram esmagados 13 anos depois, em 1898, na batalha de Omdurman, quando os ingleses dispararam modernos canhões Howitzer e metralhadoras contra os paus e as pedras dos dervixes – uma batalha do Primeiro Mundo contra o Quarto, na qual 25 000 sudaneses morreram, contra 48 ingleses. Essa história toda lembrou a você alguma coisa?

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