Bagunça sim, mas organizada
Pequenas variações, efeitos gigantes: sim, existe lógica por trás do que os cientistas apelidaram de teoria do caos.
Texto Samuel Lauro
O caos não é simplesmente uma bagunça ao acaso. Para entender esse conceito, que é um dos pontos centrais da Teoria do Caos, pode-se pensar em algo tão simples quanto um jogo de dados, que está no imaginário popular como uma atividade associada ao acaso. Mas será que um dadinho é mesmo tão imprevisível?
Imagine se alguém tentasse medir tudo aquilo que influencia o movimento de um dado quando jogado sobre uma mesa. Seria preciso saber a velocidade e aceleração com que o dado cai, a elasticidade da mesa, o atrito do dado quando quica e outras propriedades do sistema. Em tese, medindo esses parâmetros com precisão absoluta (e com grande controle de força) é possível jogar o dado sabendo exatamente qual face acabará virada para cima.
Na prática, porém, a teoria é outra. Para qualquer ínfimo erro de medida com que o dado é jogado, o resultado obtido acaba sendo bem diferente. Ao tentar obter um 6, podemos acabar micando com um 1.
Nesse sentido, diz-se que um dado jogado é um sistema caótico, porque o resultado da jogada depende dos mínimos detalhes das condições iniciais do lance. Um milímetro de diferença pode acabar mudando tudo.
TEMPOS CAÓTICOS
Um exemplo mais completo é, por exemplo, a meteorologia – o campo de trabalho de um dos pioneiros da Teoria do Caos, Edward Lorenz (leia texto ao lado).
Contudo, essa propriedade (depender enormemente de condições iniciais) não é a única a caracterizar sistemas caóticos. Uma outra característica importante vem do trabalho do matemático franco-polonês Benoît Mandelbrot na década de 1970.
Manipulando números, Mandelbrot descobriu que era possível derivar padrões complexos, da classe dos chamados fractais, a partir de expressões matemáticas simples. Um fractal, grosso modo, é uma figura geométrica que pode ser dividida em partes semelhantes ao seu todo. Com um grau de detalhamento infinito, ela mostra que um sistema caótico, afinal, segue um padrão. “Os primeiros teóricos do caos, os cientistas que puseram a disciplina em movimento, compartilhavam certas sensibilidades”, diz James Gleick, autor de Caos, livro que popularizou o campo de pesquisa na década de 1980. “Tiveram uma visão para padrões, especialmente padrões que apareciam em diferentes escalas ao mesmo tempo.”
Do estudo de sistemas caóticos, mais tarde, derivou o campo da Teoria da Complexidade. Ela estuda sistemas compostos de partes simples que, juntas, exibem uma complexidade maior. (Nesse caso é que se aplica a máxima “o todo é maior do que a soma das partes”). O estudo dessas propriedades emergentes ganhou aplicação em muitos campos e deu novo fôlego à física. A análise de partículas isoladas não vai explicar coisas intrincadas como o sistema nervoso dos humanos, o mercado financeiro e a evolução da inteligência. Tudo isso, porém, já está na mira de áreas de estudos criadas a partir da Teoria do Caos.
Borboleta demolidora
Em 1961, o meteorologista Edward Lorenz estava trabalhando em um programa para simular o clima a partir de equações na tentativa de reproduzir o resultado de uma longa simulação que obtivera uma vez. Em vez de rodar a simulação inteira, porém, Lorenz colocou o computador para trabalhar a partir da metade. Para isso, alimentou-o com números arredondados extraídos de um certo ponto da simulação que havia rodado anteriormente nele.
SURPRESA
Com essa “acochambrada”, porém, Lorenz acabou obtendo um resultado que nada tinha a ver com o esperado. Ele não foi capaz de reproduzir o resultado anterior. A partir daí, pôs-se a estudar o clima como sistema caótico – dependente de detalhes nos dados iniciais. Para explicar isso, Lorenz escreveu o famoso artigo Previsibilidade: Uma Borboleta Voando no Brasil Pode Desencadear um Tornado no Texas? Nascia então o termo “efeito borboleta”.