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Dois contra as bombas

As ogivas nucleares lançadas no Japão decretaram a derrota final do Eixo. Dois homens enfrentaram seus efeitos devastadores na tentativa de socorrer as vítimas

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h21 - Publicado em 14 abr 2012, 22h00
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  • Texto Moacir Assunção

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    Em um intervalo de 3 dias, o Japão foi atingido pelas armas de destruição em massa mais poderosas da história humana. Nem os EUA, que lançaram as bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki, previram tamanho estrago. Diante dos escombros, do choque e da chuva negra, ácida e corrosiva, alguns fizeram o caminho inverso ao das pessoas desesperadas que corriam para fora das cidades. Mergulharam no inferno para tentar socorrer os sobreviventes feridos. Dois desses heróis, Takashi Morita e Yoshitaka Samedima, vivem no Brasil.

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    O dia virou noite

    QUEM
    TAKASHI MORITA

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    NASCIMENTO
    HIROSHIMA ( JAPÃO)

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    ONDE ATUOU
    HIROSHIMA

    POR QUE É HERÓI?
    ARRISCOU A VIDA PARA CORRER AS VÍTIMAS DA PRIMEIRA BOMBA NUCLEAR

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    Na hora da explosão, em Hiroshima, Morita não ouviu nada. Percebeu apenas uma luz, como o flash de uma câmera. Foi arremessado a 10 metros de distância, desmaiou e, quando voltou a si, o dia tinha virado noite, embora fossem 8h15 da manhã. Era 6 de agosto de 1945. Morita liderava um grupo de 15 soldados da Polícia Militar que se preparava para construir um abrigo de armamentos. Estava a 1,3 km do epicentro da explosão (no coração da cidade) e de costas para o local.

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    Descobriu que as costas e a nuca estavam queimadas, sem imaginar que eram resultado de uma bomba atômica. Depois do estouro, caiu uma chuva negra, que a população pensava ser óleo jogado pelos americanos para provocar incêndios, como acontecera em Tóquio. Tratava-se na realidade de chuva ácida, fruto da radiação em contato com a atmosfera. “Nunca esquecerei o que vi. Milhares de corpos queimados, o fogo avançando sobre pessoas que imploravam por ajuda… Parecia o fim do mundo”, diz o japonês, de 86 anos, que vive no Brasil desde 1956.

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    Passado o momento de estupefação, ele decidiu agir. Apenas um de seus colegas sobreviveu. Levantaram-se com dificuldade e se dirigiram ao centro da cidade. Encontraram crianças em duas casas próximas; uma delas, um bebê. Morita e o companheiro ajudaram a resgatar as crianças e suas mães, que foram recolhidas por jipes militares e levadas a hospitais. Mas não havia médicos suficientes para todos. “As pessoas andavam como zumbis, sem rumo, os braços para a frente, com a pele do corpo e as unhas caindo.”

    Das áreas montanhosas mais afastadas do centro, onde foram montados postos de atendimento às vítimas, ele viu a cidade arder. Quase nada restou. Morita não tem ideia de quantas pessoas socorreu naquele dia ao lado dos poucos soldados que conseguiram se manter de pé após o impacto da bomba. “As vítimas praticamente derreteram. Teve gente que tentamos puxar dos escombros e se desfez em nossas mãos.” Ele ficou dois dias sem comer nem beber nada. Temia que tudo estivesse contaminado. Estava certo. Ele atribui sua sobrevivência ao fato de ser jovem e forte, estar bem alimentado, protegido com um capacete de ferro e de costas para o centro da explosão. “Era um negócio horroroso, como jamais tínhamos visto igual”, afirma Morita, hoje dono de uma loja no bairro do Jabaquara, na Zona Sul de São Paulo.

     

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    Hibakushas

    QUEM
    YOSHITAKA SAMEDIMA

    NASCIMENTO
    SÃO PAULO (BRASIL)

    ONDE ATUOU
    NAGASAKI

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    POR QUE É HERÓI?
    AJUDOU ENTRE 800 E MIL VÍTIMAS DA BOMBA ATÔMICA EM NAGASAKI

    Médicos e técnicos americanos que ocuparam Hiroshima após a destruição examinaram os sobreviventes – 100 mil pessoas de uma população de 250 mil morreram de imediato -, mas os laudos jamais foram entregues aos sobreviventes, conhecidos como hibakushas (“sobreviventes da bomba”, em japonês).

    Três dias depois foi a vez de Nagasaki. A bomba, apelidada de Fat Man, atingiu a cidade portuária. Mais de 80 mil pessoas de uma população de 240 mil morreram no mesmo instante. Yoshitaka Samedima – um brasileiro filho de japoneses que havia retornado ao país – estava dentro de um navio do Exército nipônico quando o artefato nuclear foi lançado. “O navio balançou de um lado para outro como se fosse um brinquedo nas mãos de um gigante. Saímos, e estava tudo escuro. A cidade estava arrasada.” Ele tinha 16 anos. Samedima engoliu o medo e saiu com alguns companheiros para tentar ajudar as vítimas. “Demoramos muito para entrar em Nagasaki por causa do entulho e ferro retorcido nas ruas. O cheiro de morte era difícil de aguentar”, afirma, hoje, aos 83 anos. “Àrvores, prédios, casas, escolas e hospitais estavam destruídos.” O incidente deixou Samedima, que vive em Suzano, na Grande São Paulo, com manchas brancas na pele. Por causa das marcas, foi reconhecido como hibakusha por Morita, que o convidou a integrar a Associação das Vítimas da Bomba Atômica no Brasil.

    Samedima acredita que ajudou a socorrer, junto com seus companheiros, entre 800 e mil pessoas. “Tirávamos as vítimas dos escombros e mandávamos para os poucos hospitais que estavam de pé”, relembra. “Cada viagem de caminhão levava 20 pessoas, e fizemos umas 20 em dois dias para dar conta dos feridos.” Apenas os militares tinham provisões, que dividiam com as vítimas. “Todos choravam, gritavam e pediam água, mas tínhamos instruções de dar o mínimo possível de água porque sabíamos que estava contaminada”, disse o aposentado. Os veteranos do Exército e da Marinha japonesa, segundo ele, se recusaram a entrar em Nagasaki por medo de contaminação. “A gente não sabia direito o que era radiação, mas eu tinha de ajudar as pessoas e não me preocupei com isso.” Samedima voltou ao Brasil apenas nos anos 1970 para cuidar do pai, que teve câncer de garganta. Desde então esteve quatro vezes em Nagasaki para fazer tratamento contra os efeitos da radiação.

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    A partir de 1984, quando fundou a associção, Takashi Morita teve de entrar, sem querer, em outra batalha. O governo japonês só oferecia ajuda aos hibakushas que viviam no Japão. Na rígida cultura nipônica, os que saíram do país eram vistos como ingratos. Acabou entrando na Justiça contra o governo para garantir seus direitos e os dos cerca de 130 sobreviventes que vivem no Brasil. “Ele sofreu um infarto porque jamais pensou que teria de acionar o governo japonês. Meu pai ainda é muito ligado à pátria natal”, afirma a filha, Yasuko Saito. Morita venceu. Hoje o Japão oferece uma pensão de um salário mínimo mensal e atendimento médico às vítimas da bomba no Brasil. Uma vez por ano, médicos especializados atendem os hibakushas brasileiros.

     

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