Nada de American way of life. A cachorrinha Laika não teria visto como a Terra é azul. E Berlim nunca teria sido dividida por um muro. Tudo isso só aconteceu porque, em junho de 1914, na então província austro-húngara da Bósnia, o arquiduque Francisco Ferdinando de Habsburgo foi assassinado. Se ele tivesse vivido para contar a história, a 1ª Guerra provavelmente não teria acontecido. E a humanidade teria passado por tempos mais pacíficos. Nem a 2ª Guerra teria razão para existir. Ela eclodiu por causa dos termos da derrota alemã ao fim da 1ª Guerra – o país foi obrigado a reconhecer a culpa pelo conflito e ainda perdeu territórios. Mas os alemães não escapariam de embates. Em protesto contra o estado burguês que não conseguiria acompanhar economicamente os rivais europeus, eles provavelmente passariam por uma revolução socialista.
A Europa continuaria forte e se manteria um centro econômico e cultural. Esqueça a exportação em massa para o mundo de hábitos tradicionalmente americanos. Sem a oportunidade de ganhar dinheiro vendendo produtos aos europeus desabastecidos durante a guerra, os EUA não ascenderiam como líderes globais. Mas seguiriam como ícones do capitalismo. E os líderes socialistas da Alemanha não os veriam com bons olhos. Seria a Guerra Fria. Guerra Fria sem os russos? Isso. Eles continuariam sob domínio dos czares. E não teriam entrado na competição que levou cosmonautas – e a Laika – ao espaço. Aliás, a Rússia de que falamos é bem maior do que a dos mapas de hoje. Ela ainda incorporaria países como Ucrânia, Eslováquia e Lituânia. Esse pessoal só virou independente por causa do desmembramento do Império Russo, que aconteceu após a 1ª Guerra.
Sem a falta de alimentos decorrente da mobilização militar russa na 1ª Guerra, não haveria espaço para a Revolução Bolchevique. Mas a revolução socialista chegaria de qualquer forma – só que na Alemanha, liderada por Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, e depois exportada para o leste, até a fronteira russa.
MISTURA DE ETNIAS
Com Hitler ocupado em seu ateliê, nada de 2ª Guerra Mundial. Ou seja, 50 milhões de pes-soas não teriam morrido, e mais de 20 milhões não teriam ficado feridas. O ódio aos judeus, ciganos e negros não teria atingido a proporção criada pelo führer. Arianos e não arianos poderiam conviver em paz, e até lutariam juntos pelos mesmos objetivos.
HITLERISMO, UMA ARTE
Hitler talvez deixaria seu legado para a história – mas a da arte. Sem o Tratado de Versalhes, que impôs a derrota da 1ª Guerra aos alemães e impulsionou o partido nazista, Hitler não teria apoio para chegar ao poder. Seguiria como o pintor medíocre que foi quando jovem.
IT’S UP TO YOU, LONDON/PARIS
Nem Frank Sinatra conseguiria muita coisa em Nova York. Os EUA até se tornariam potência mundial, mas os olhos e o dinheiro do mundo dividiriam o foco entre as capitais das potências colonialistas: Paris, centro de cultura e tendências, e Londres, graças à força econômica que o Império Britânico possuía antes da 1ª Guerra.
ARTE
A 1ª Guerra influenciou muitos movimentos da arte moderna, como o dadaísmo – que criticava a sociedade por não ter evitado uma guerra de grandes proporções. Sem ele, o surrealismo e o expressionismo não teriam acontecido. Prevaleceria uma arte menos onírica e mais concreta, como a do futurismo.
Fontes Demétrio Magnoli, integrante do Grupo de Análises de Conjuntura Internacional, da USP; Wilson Barbosa, historiador da USP; Modesto Florenzano, historiador da USP; Angelo Segrillo, professor de história da USP; Eduardo Ferreira de Souza, cientista social.