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Eco sim, chato não

Dez dicas para ser sustentável sem ser mala

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h23 - Publicado em 14 dez 2007, 22h00

Texto Aryane Cararo

João Gordo não é o que se pode chamar de ativista bonzinho e politicamente correto. Mas acredite: o apresentador mais desbocado do país está preocupado com o futuro do planeta. Aos 43 anos, dois filhos, vegetariano desde 2005, João constrói uma nova casa em São Paulo que é feita com madeira de demolição e terá aquecedor solar e reservatório de água da chuva. Se reciclagem de lixo já é uma atitude básica nas grandes cidades, ele vai além: na festa de aniversário de um dos dois filhos, a lembrança que os convidados levaram para casa era feita de garrafas pet reutilizadas. E as roupas que o pessoal em casa não usava mais viraram capas de almofadas, feitas por sua mulher, Viviana Torrico. “É muito legal: depois de velho, eu virei hippie”, brinca ele.

Como o punk mais pop do Brasil mostra, não é preciso virar um ecochato e se mudar para uma comunidade alternativa para adotar atitudes mais saudáveis para o planeta. A ciência tem dicas de ações simples e surpreendentes para você gastar menos energia, produzir menos lixo e emitir menos carbono na atmosfera. Veja 10 delas, a seguir.

1. USE MÓVEIS DE MADEIRA

Sim, optar por móveis de madeira é uma atitude sustentável. Árvores, para crescer, transformam o carbono da atmosfera em madeira. Por isso, cerca de metade do peso da madeira é de átomos de carbono – os mesmos que poderiam estar no ar causando o efeito estufa. “O móvel de madeira mantém o carbono que iria para a atmosfera aprisionado por muito tempo, podendo ser usado por muitas gerações. Isso não acontece com os plásticos e o aço”, diz o pesquisador Márcio Nahuz, do Centro Tecnológico de Recursos Florestais do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). A quantidade de carbono que o seu guarda-roupa aprisiona depende do tipo de árvore e da densidade da madeira de que ele é feito. Prefira os móveis de pinus, eucalipto e paricá e evite as espécies escassas como pau-brasil, mogno, imbuia e jacarandá-paulista. E, claro, escolha madeira com certificação do Conselho Brasileiro de Manejo Florestal (FSC Brasil ), que garante a procedência de árvores plantadas e derrubadas de maneira planejada. Outra vantagem é que a madeira é um lixo muito mais tolerável para o ambiente que outros materiais. “A madeira se decompõe e, assim, não cria um Frankenstein na natureza”, diz Nahuz. Plásticos, outros derivados de petróleo e demais materiais precisam de um processo de reciclagem (quando há) que pode consumir energia – e liberar mais carbono na atmosfera.

2. TAMPE A PANELA

Parece conselho de mãe para a comida não esfriar, mas a ciência explica como é possível ser um cidadão ecossustentável adotando o simples hábito de tampar a panela enquanto esquenta a água para o macarrão ou para o cafezinho. Segundo o físico Cláudio Furukawa, da USP, a cada minuto que a água ferve em uma panela sem tampa, cerca de 20 gramas do líquido evaporam. Com o vapor, vão embora 11 mil calorias. Como o poder de conferir calor do GLP, aquele gás utilizado no botijão de cozinha, é de 11 mil calorias por grama, será preciso 1 grama a mais de gás por minuto para aquecer a mesma quantidade de água. Isso pode não parecer nada para você ou para um botijão de 13 quilos, mas imagine o potencial de devastação que um cafezinho despretensioso e sem os devidos cuidados pode provocar em uma população como a do Brasil: 54,6 toneladas de gás desperdiçado por minuto de aquecimento da água, considerando que cada família brasileira faça um cafezinho por dia. Ou 4 200 botijões desperdiçados.

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3. EVITE PLÁSTICO E VIDRO

No supermercado surge a dúvida: serei um cidadão mais sustentável se levar a bebida na embalagem de alumínio, de vidro ou de pet? O senso comum apostaria na latinha, já que ela é quase totalmente reciclada no Brasil. Alguém poderia contra-argumentar que ela gasta energia demais: a indústria do alumínio consome 6% da eletricidade do Brasil. Já a ciência diz que, se a intenção é só avaliar a forma mais ecológica de beber refrigerante ou cerveja, siga o senso comum. Esse é o conselho da engenheira química Renata Valt, autora do livro Ciclo de Vida de Embalagens para Bebidas no Brasil. Segundo ela, a lata leva vantagem hoje no Brasil justamente pelo alto índice de reciclagem (96% em 2005) frente ao vidro (45%) e ao pet (47%). Renata comparou a produção de 1 000 litros de refrigerante para cada embalagem, somou a porcentagem de reciclagem e de matéria-prima e concluiu: o alumínio é o que menos consome energia, água e recursos naturais, tem a menor emissão de poluentes e gera menos resíduos sólidos.

É de espantar que o vidro, cuja garrafa é reutilizada de 20 a 30 vezes em média, não seja o mais ecológico. Mas é exatamente por causa das idas e vindas no transporte, e sua queima de combustível, que ele perde pontos. “O vidro só é melhor se considerarmos que seus recursos são mais renováveis que o petróleo do pet e a bauxita do alumínio. Se a indústria usasse combustíveis mais limpos, a avaliação melhoraria”, diz Renata. Ainda que vivêssemos em um mundo ideal, com 100% de reciclagem, o alumínio teria suas vantagens, pois gastaria menos recursos naturais e emitiria menos poluentes. O pet seria mais econômico na energia, na água e na produção de lixo. Por outro lado, sem reciclagem, a latinha seria o terror do consumo energético, dos recursos naturais e da emissão de gases.

4. TOME BANHO PELA MANHÃ

A dica é velha: evite consumir energia elétrica no horário de pico. Mas está mais a- tual do que nunca. A limitação das usinas e a escassez de água, motor propulsor das hidrelétricas, deixam sempre possível haver um apagão. O Brasil produz, normalmente, 75 mil megawatts de energia elétrica. A quantidade é suficiente para o consumo habitual, mas não para os picos – momentos como o intervalo do futebol, quando milhões de brasileiros abrem a geladeira para pegar uma cerveja, ou às 19h30, quando a maioria liga o chuveiro.

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Quando as 158 hidrelétricas não dão conta da demanda, o país é obrigado a acionar as usinas termoelétricas, que usam como combustível gás natural, carvão, xisto ou óleo diesel e lançam muito mais dióxido de carbono na atmosfera. Com todos os tipos de usinas ligados, a capacidade de fornecimento sobe para 100 mil megawatts. Já que é impossível armazenar energia em grande quantidade, qualquer consumo superior a isso obrigaria à construção de mais usinas e linhas de transmissão.

Imagine se os 186 milhões de brasileiros decidissem tomar banho em chuveiros elétricos às 19h30. Como cada chuveiro gasta cerca 1 kWh em 11 minutos de banho, o país precisaria de quase duas vezes mais usinas para não apagar. Para espantar esse risco, basta variar o horário do banho. Se você ligar o chuveiro fora dos horários de pico, como pela manhã, ajuda a diminur a necessidade de construção de mais usinas para atender a um consumo pontual.

5. PAGUE SUAS CONTAS ONLINE

Aqueles papéis bancários que você recebe toda vez que paga suas contas significam mais emissões de poluentes, gás metano nos lixões e água desperdiçada. Essa é a conclusão de um relatório da empresa de consultoria americana Javelin Strategy and Research sobre o que representam os extratos, comprovantes de pagamento e cheques nos EUA. Segundo o estudo, lançado em junho, se todos os americanos abolissem o papel de suas transações bancárias, 2,3 milhões de toneladas de madeira seriam poupadas por ano – ou cerca de 16 milhões de árvores. Ok, consumo de madeira não é ruim para o aquecimento global, já que madeira e papel são pequenos depósitos de moléculas de carbono. O problema é que, para fazer papel, é preciso muita energia e poluição. A produção dos comprovantes nos EUA gasta a energia suficiente para abastecer, durante o ano inteiro, uma cidade do porte de Campinas (SP). Se tanto papel não existisse, a emissão de carbono também diminuiria, no equivalente a 355 mil carros a menos nas estradas americanas. No Brasil, a maior empresa de bobinas do país abasteceu, em 2006, 4 grandes bancos com 6 mil toneladas de papéis para caixas eletrônicos.

6. DESLIGUE O FOGÃO

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Em vez de usar sempre o fogão ou o microondas, opte por uma resistência elétrica para aquecer líquidos. Pode ser o popular rabo-quente ou as modernas chaleiras elétricas. Segundo o físico Cláudio Furukawa, da USP, o rabo-quente é o mais eficiente quando a opção é pelo menor uso de energia. Como quase 90% da energia brasileira vem das hidrelétricas, que poluem muito pouco, é melhor para o ambiente usar aparelhos elétricos que movidos a gás, como o fogão. Pensando assim, o microondas levaria vantagem sobre o fogão a gás, pois causaria menos danos ao ambiente. O problema é que ele tem pouco rendimento, pois redireciona parte da eletricidade para o motor que gira o prato, a lâmpada e a ventoinha. “Além disso, as microondas ficam espalhadas por toda a cavidade e não se concentram apenas no alimento. No caso dele, a eficiência de conversão em calor não passa dos 40%”, afirma o físico Cláudio Furukawa.

7. USE A ÁGUA DA LAVADORA DE ROUPAS PARA REGAR O GRAMADO

Em vez de gastar água da torneira para regar as plantas, use a que sai da máquina de lavar. A água dos últimos enxágües da lavadora é muito boa para plantas. “A partir do 2º ciclo, a concentração da maioria dos sais está numa faixa que traz benefícios às plantas, principalmente aos gramados”, afirma Gilberto Kerbauy, professor de botânica do Instituto de Biociências da USP. Gilberto analisou os resultados na tese de doutorado da engenheira civil Simone May, também da USP. Simone quantificou itens como acidez, sais, metais pesados e coliformes para 3 enxágües da máquina, a partir da lavagem de roupas de uma família típica. “O 1º enxágüe é muito sujo, equivalente à água resultante de um banho no chuveiro”, diz ela. A quantidade de coliformes fecais no 1º ciclo era de 44 mil em cada 100 mililitros – em piscinas, por exemplo, acima de 1 mil/ml a água é considerada imprópria. Mas, nos enxágües seguintes, a concentração baixa a níveis normais. “A partir do 2º enxágüe, a água poder ser reaproveitada para regas de plantas ornamentais. Os valores de pH estão na faixa tolerável para a maioria das plantas (7,9 e 7,1)”, diz Kerbauy. “Eventualmente, a concentração de sódio poderia ser prejudicial a algumas espécies. E o uso para regar hortas deve ser evitado.”

8. PREFIRA ALIMENTOS LOCAIS

Comprar alimentos produzidos na região próxima de onde você mora faz bem aos pulmões. O segredo está na redução da distância: com caminhões rodando pouco, há menos poluição. Além disso, o desperdício é muito menor – e as frutas não precisam ser colhidas ainda verdes. De acordo com Celso Moretti, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Brasil desperdiça no trajeto do campo à mesa 14 milhões de toneladas de hortaliças, grãos e frutas por ano. O transporte, que submete frutas a uma temperatura de 42 oC embaixo das lonas, é o maior vilão do desperdício de alimentos.

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Alimentos de longe também aumentam o aquecimento global. O pesquisador Márcio Nahuz e sua equipe do Instituto de Pesquisas Tecnológicas fizeram as contas do gás carbônico emitido por um caminhão a diesel (Mercedes 1620, com 231 cavalos) no transporte de melões de Mossoró, no Rio Grande do Norte, até a capital paulista (uma distância de 2 783 quilômetros). Considerando apenas o consumo de combustível, a carga teria custado 1 570,95 quilos de dióxido de carbono a mais na atmosfera. Ou o trabalho de 3 árvores adultas de 16 metros de altura e 0,28 metro de diâmetro no seqüestro de carbono. “O problema é que, para neutralizar as emissões da viagem, esse motorista deveria ter plantado as árvores 20 anos antes”, diz Nahuz. O mesmo problema acontece com maçãs que viajam de Vacaria (RS) até São Paulo, nas mesmas condições de transporte. Emitem 488 quilos de dióxido de carbono nos 865 quilômetros de viagem. Até mesmo a cenoura, facilmente cultivada nos cinturões verdes dos municípios, pode ter alta quilometragem – do pólo de São Gotardo (MG) à capital paulista vão sendo distribuídos nos 655 quilômetros quase 370 quilos de gás causador do efeito estufa. “É muito difícil não ter esse custo ambiental, já que não dá para produzir nas capitais as mesmas frutas de regiões distantes”, diz Nahuz. Uma saída é aproveitar as frutas e verduras da época – que podem ser produzidas tranqüilamente perto das grandes cidades.

9. TOME ÁGUA DA TORNEIRA

Se você viu o filme Uma Verdade Inconveniente, do Prêmio Nobel da Paz Al Gore, sabe que a cor branca dos pólos reflete de 80 a 90% da luz solar. Quando derretem, acabam com o mesmo índice de reflexão do oceano: 8%, em média. Ou seja: quanto mais os pólos derretem, mais eles próprios contribuem para o aquecimento global. Aplicando a mesma teoria, é possível traçar um paralelo para a realidade de sua casa. Já que não dá para trazer a neve para casa, por que não a cor branca? Pintar telhados e paredes de branco pode fazer com que até 90% da luz incidente seja refletida, já que a tinta dessa tonalidade rebate de 50 a 90% dos raios solares. Enquanto isso, a tinta vermelha ou marrom só reflete de 20 a 35% e as cores laranja e cinza ficam na média dos 50 e 30% respectivamente. No mínimo, você ganha em conforto térmico e usa menos ar-condicionado. “O branco refletivo ou o aluminizado refletem 90% da radiação solar. Com as superfícies externas da casa pintadas de branco, menos calor penetra na casa. E a temperatura interna pode variar até 5 oC”, diz Racine Prado, professor de física das construções da USP.

Esqueça a água mineral. A água que sai da torneira da maioria das cidades brasileiras é potável – tratada para que você possa bebê-la numa boa. Gastar dinheiro com água de garrafa é supérfluo e agressivo ao planeta. Além de mais cara, produz milhões de garrafas como lixo e precisa ser transportada em caminhões poluentes. Se não recicladas, as garrafas pet demoram 110 anos para se degradar. Além disso, o processo para transformar resina em garrafas e o transporte até a sua casa consomem combustível e geram poluição. Cada 1 000 garrafas de meio litro de água gastam 600 kWh de energia, liberam 6 quilos de carbono e geram 35 quilos de lixo no planeta. Por isso, várias cidades da Califórnia, nos EUA, estão adotando leis para restringir a água mineral em empresas e escolas. “Do ponto de vista bacteriológico, a água da torneira é segura, não precisa nem ser filtrada”, diz Paulo Olzon, clínico geral da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Quem prefere ter mais segurança e optar pela água mineral, deve evitar embalagens descartáveis.”

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Para saber mais

Ciclo de Vida de Embalagens para Bebidas no Brasil

Renata Valt, Thesaurus, 2005.

Planeta Sustentável

https://www.planetasustentavel.com.br

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