Igor Fuser
Stanislaw Ponte Preta – como Sérgio Porto (1923-1968), um dos maiores humoristas brasileiros, assinava suas crônicas – apelidou a televisão de “a máquina de fazer doido”. O líder político polonês Lech Walesa via o assunto por outro ângulo. Indagado, no início da década de 90, sobre o que havia causado o surpreendente colapso do comunismo no Leste Europeu, ele apontou para a TV e disse: “Foi tudo por causa dela”. De todas as invenções do século XX, nenhuma – com exceção, talvez, da energia atômica – provoca reações tão acaloradas. A TV é acusada de induzir as crianças à passividade; os adolescentes, ao sexo precoce e à violência; e os adultos, a se afastar do convívio social. Os moralistas querem censurá-la e as ditaduras, controlá-la. Uma entidade dos Estados Unidos chegou a pedir aos telespectadores que desligassem seus aparelhos por uma semana, só como experiência. O fracasso da iniciativa sugeriu que, ao contrário da idéia que os organizadores queriam demonstrar, é impossível viver sem TV. Que o digam os 1 bilhão de proprietários de televisores – um em cada seis moradores do planeta. Goste-se desse fato ou não, assistir televisão é, depois do trabalho, a atividade a que os seres humanos dedicam a maior parcela do tempo que passam acordados. Sessenta anos depois da primeira emissão comercial, a TV chega ao século XXI mais forte do que nunca. Para o bem e para o mal.
O profeta e sua aldeia
Referência obrigatória em qualquer papo-cabeça do final dos anos 60, o comunicólogo canadense Herbert Marshall McLuhan (1911-1980) é vítima de uma das grandes ironias deste final de século. Ele está completamente fora de moda nos círculos intelectuais, mas a sua mais famosa profecia – a de que a comunicação simultânea entre os habitantes de todos os países transformaria o mundo numa “aldeia global” – se materializou à perfeição. McLuhan foi o primeiro pensador a levar a televisão a sério. Enquanto seus colegas de academia se indignavam com o besteirol da programação, ele percebeu que a linguagem das imagens instantâneas iria virar pelo avesso a nossa maneira de ver a realidade. “O meio é a mensagem”, dizia. A frase, que se tornou um lugar-comum insuportável, significa que o mesmo conteúdo transmitido por dois veículos diferentes nunca é exatamente igual, já que os sentidos do corpo humano o captam de modos distintos. O canadense profetizou o fim da “Era do Livro”, em que a informação flui de forma linear, ou seja, pela leitura de um texto linha por linha. Em seu lugar entraria a “Era da Eletrônica”, marcada pela apreensão imediata da mensagem. McLuhan teve essa idéia inspirado pelos cortes rápidos dos comerciais de TV. Ainda não existia o videoclipe, nem o rap, nem os games eletrônicos, nem a Internet. Não é à toa que o chamam de profeta.