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Os maiores espiões de todos os tempos

Eles descobriram segredos, roubaram planos e alteraram o curso da história. E tudo isso fora das telonas do cinema. Confira a ficha dos agentes secretos mais formidáveis da vida real

Por Marcelo Cabral
Atualizado em 31 out 2016, 18h26 - Publicado em 31 mar 2007, 22h00

O que torna alguém um bom espião? O porte atlético? A inteligência refinada? Os equipamentos sofisticados? Seja lá qual for a resposta, com certeza ela não se encaixa em nenhuma dessas alternativas. Afinal, o grupo dos espiões mais importantes do mundo inclui deficientes físicos, analfabetos e gente da época da Guerra Civil Americana, em pleno século 19. Alguns alcançaram reconhecimento, fama e riqueza durante a vida; outros tiveram fins trágicos ou morreram no anonimato. Difícil imaginar um grupo mais heterogêneo. Em comum, apenas sua importância: todos eles realizaram façanhas tremendas e, com suas aventuras, ajudaram a construir o mundo da forma como ele é hoje. Confira nas páginas seguintes a história dessas lendas da espionagem e tente descobrir qual, afinal, é a receita para se criar um James Bond de verdade.

Harriet Tubman – As aventuras de ·Moisés negra·

Suas façanhas para libertar escravos e obter informações durante a guerra civil a tornaram famosa nos EUA

Data de nascimento: 1820 (não há registro do dia).

Local: Dorchester, nos EUA

País para qual trabalhou: EUA

Maior façanha: Ajudar milhares de negros a fugir da ecravidão nas fazendas do sul dos EUA

Morte: Razões naturais, em 10 de março de 1913.

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Negra. Escrava. Pobre. Aventureira, espiã e abolicionista. Esses são os adjetivos a ser empregados quando o assunto é Harriet Tubman, uma das primeiras figuras femininas de destaque na história dos EUA, embora ainda seja pouco conhecida por aqui. Tubman não apenas organizou arriscadas expedições para libertar escravos negros de fazendas no Sul dos EUA como criou uma sofisticada rede de espionagem na região durante a Guerra Civil Americana, na qual também liderou operações militares do exército do Norte.

 

Vida dura

Harriet nasceu como escrava no condado de Dorchester, no estado de Maryland, em 1820. Durante a infância, teve vários donos e foi submetida a toda sorte de tratamento desumano, tendo no corpo várias cicatrizes resultantes dessa época. Em uma ocasião, quase morreu devido a um golpe na cabeça, que a deixaria sujeita a ataques epilépticos durante o resto da vida. Em 1844, se casou com um negro liberto chamado John Tubman, mas a união não durou muito: quando Harriet fugiu da fazenda onde trabalhava, em 1849, Tubman decidiu não segui-la, e seus caminhos acabaram por se separar.

Ótima conhecedora da região Sul dos EUA, Harriet se ligou aos movimentos abolicionistas do Norte e começou a ajudar escravos a fugirem das fazendas sulistas. Durante cerca de 10 anos, ela organizou 13 expedições, que libertaram mais de 300 escravos. As fugas ocorriam através de um intrincado sistema de vias desertas e abandonadas conhecidas como “Estradas Subterrâneas”. Esses caminhos cruzavam florestas, matas, pântanos e outras regiões de difícil acesso, onde o risco de serem encontrados eram menores, e levavam até locais do Norte onde os negros não eram mais considerados escravos. Harriet nunca foi capturada; uma de suas técnicas era roubar os cavalos das fazendas, o que não só facilitava a fuga como também dificultava a perseguição dos fazendeiros. Ela carregava um sonífero, que usava para adormecer os bebês libertados, caso esses começassem a chorar e pôr a expedição em perigo. Ela também levava uma arma com a qual ameaçava os escravos que desistiam da fuga: “Você vai ser livre ou vai ser morto”, dizia. Suas ações lhe valeram o apelido de “Moisés do povo negro”, numa alusão ao personagem bíblico que livrou os hebreus da escravidão no Egito.

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Nova carreira

Durante a Guerra Civil Americana, entre 1861 e 1865, Harriet começou a trabalhar como espiã. Ela usou seus contatos entre os negros do Sul dos EUA para criar uma rede de espionagem que passava informações ao Norte. Seu esquema foi tão preciso que o Sul chegou a estipular uma recompensa de US$ 40 mil pela sua captura. Harriet se tornou a primeira mulher a planejar e liderar uma operação militar nos EUA: o ataque à Combahee Ferry, em 1863. Ela usou seus espiões para obter dados sobre as defesas sulistas no rio Combahee. Essas informações permitiram que 3 barcos do Norte – sob o comando de Harriet – atacassem várias fazendas de arroz situadas às margens do rio. Os locais foram destruídos e mais de 750 escravos libertados.

Após a guerra, Harriet se casou novamente e se dedicou à causa dos direitos femininos. Mais tarde, foi morar em uma instituição dedicada a mulheres negras pobres, que ela mesma havia criado. Em 1913, teve complicações devido à saúde debilitada e acabou morrendo. Harriet teve um enterro com honras militares e é relembrada todo ano nos EUA no dia 10 de março, data de sua morte.

 

Sidney Reilly – O ás da espionagem

Com uma incrível lista defaçanhas, ele foi considerado o mais aventureiro dos espiões

Data de nascimento: 24 de março de 1874

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Local: Odessa, na Rússia (hoje na Ucrânia)

País para qual trabalhou: Inglaterra e Japão

Maior façanha: Mudar o próprio conceito da espionagem

Morte: Fuzilado, em 5 de novembro de 1925

Até o final do século 19, a espionagem era algo feito por fidalgos diplomatas, que gentilmente tentavam enxergar algum documento secreto em cima de uma mesa de negociações. Quem mudou essa visão foi Sidney Reilly, o espião britânico nascido na Rússia. Autor de inúmeras façanhas, ele criou o conceito do agente durão, capaz de atos incríveis para conseguir resultados, o que lhe valeu a alcunha de Ás dos Espiões. Sua fama de superespião chegou até os dias atuais. Ela lhe rendeu uma minissérie televisiva chamada Reilly, Ace of Spies, na qual seu papel foi interpretado pelo ator Sam Neill.

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Juventude rebelde

Reilly nasceu em Odessa, com o nome de Georgi Rosenblun. Ele era filho bastardo de uma camponesa e um médico judeu. Na juventude, fez parte de um grupo de agitadores antimonarquistas e foi preso por servir como mensageiro para a organização. Após a morte da mãe, Georgi se escondeu como clandestino em um navio britânico e veio parar no Brasil, onde adotou o nome de Pedro e trabalhou como cozinheiro para uma expedição científica inglesa. Aqui, ele salvou o grupo da morte durante um ataque de índios; como gratidão, recebeu dinheiro e uma carta de recomendação de um diplomata que fazia parte da expedição. Ele se mudou definitivamente para a Inglaterra, adotou o nome de Sidney Reilly e começou sua carreira de agente no serviço secreto britânico.

Uma de suas primeiras missões foi viajar através da Rússia. Usando seu passaporte inglês, Reilly tratou de mapear os campos petrolíferos e as minas de ferro russas no Cáucaso. Dali seguiu para a parte oriental da Rússia, onde trabalhou tanto para os britânicos quanto para os seus então aliados japoneses. Em janeiro de 1904, ele descobriu os planos secretos que mostravam a localização das defesas da fortaleza russa de Porto Arthur e os entregou ao Japão. De posse desses planos, um ano depois a Marinha japonesa passaria pelos campos minados russos e devastaria a frota do czar, na batalha que deu início à Guerra Russo-Japonesa.

Logo depois, Reilly tomaria parte em uma nova proeza. O alto comando inglês havia percebido que o petróleo iria substituir o carvão como o principal combustível para os navios. O dono das maiores jazidas do mundo, o milionário William Knox D´Arcy, estava negociando a venda das concessões de seus campos petrolíferos do Oriente Médio com a França. Foi então que o agente entrou em ação: disfarçado como um padre, Reilly subiu a bordo do iate do milionário e, após muita conversa, o convenceu a negociar com a Inglaterra. De posse das jazidas, o país dominaria completamente o mercado mundial nas décadas seguintes, obtendo lucros fabulosos.

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Nos anos anteriores à 1a Guerra Mundial, a Alemanha seria a principal vítima das aventuras de Reilly. O agente não só conseguiu roubar de um avião alemão uma nova peça – um magneto – como também se disfarçou de operário, se infiltrou em um estaleiro alemão e obteve os planos de novos canhões navais de grande alcance.

 

Contra a revolução

No entanto, foi mesmo em sua terra de nascença, a Rússia, que Reilly mais trabalhou. Após a revolução comunista de 1917, ele foi enviado para lá com o objetivo de tentar derrubar os revolucionários bolcheviques. O plano tinha duas frentes: de um lado, o assassinato do líder comunista Vladimir Lênin. De outro, o contato com vários militares russos, que poderiam assumir o poder após a queda dos socialistas. Os preparativos foram feitos cuidadosamente e ambos os eventos já tinham até data marcada para começar. No entanto, a polícia secreta dos comunistas, a Cheka, ficou sabendo do golpe e na última hora conseguiu prender os conspiradores. Reilly escapou por um triz, mas foi identificado e condenado à morte, caso pusesse novamente os pés na Rússia.

Foi exatamente o que aconteceu em outubro de 1925. Reilly estava novamente tentando entrar na Rússia, desta vez através da fronteira finlandesa, mas foi preso por uma patrulha do Exército Vermelho. Foi levado para a prisão de Lubyanka, onde foi duramente interrogado diversas vezes. Finalmente, a sentença do governo russo foi executada: no dia 25 de novembro, ele foi levado para as florestas da região e executado por um pelotão de fuzilamento. Até hoje, não se sabe onde estão enterrados os restos mortais do lendário Ás.

 

Mata Hari – O trágico destino da estrela cortesã

Até hoje não se sabe ao certose uma das dançarinas mais famosas dos mundo era mesmo uma espiã

Data de nascimento: 7 de agosto de 1876

Local: Leeuwarden, na Holanda

País para qual trabalhou: Alemanha e França

Maior façanha: Ser a espiã mais famosa da história, mesmo sem provas concretas de que ela tenha de fato praticado espionagem

Morte: Fuzilada, em 15 de outubro de 1917

Mais do que um nome, Mata Hari é uma lenda. Sua menção evoca imagens de uma linda espiã, usando seu poder de sedução para arrancar segredos de seus amantes da alta roda. Essa figura chegou ao cinema em 1931, quando Greta Garbo estrelou um filme sobre essa misteriosa mulher. A partir daí, surgiu uma série imensa de livros e filmes sobre a personagem. No entanto, eles pouco tiveram a ver com a sua verdadeira história. Historiadores e biógrafos até hoje discutem se ela teria sido mesmo uma espiã e para quem ela teria espionado, ou se na realidade ela foi apenas o bode expiatório de uma guerra desastrosa.

Nascida como Margaretha Zelle, essa holandesa de cabelos negros teve uma vida complicada. Se casou com um oficial da Marinha, foi morar na distante Java, perdeu um dos filhos, envenenado por uma empregada vingativa, voltou para a Holanda, se separou, casou de novo, perdeu mais uma filha e se divorciou novamente. Tentou viver como artista de circo, mas o pagamento não era nada atrativo. Margaretha criou então um novo nome artístico, pela qual seria para sempre conhecida. Nascia Mata Hari, que significa “olho do amanhecer” em malaio.

 

Sucesso na noite

Em 1905, ela começou uma carreira meteórica como dançarina e cortesã nos clubes noturnos de Paris. Sedutora, libidinosa e cativante, ela se apresentava como uma princesa javanesa, que teria aprendido danças exóticas na Índia. Logo se tornou a maior estrela da noite parisiense. Como cortesã, dormiu com muitas personalidades, de políticos a militares famosos. Durante 10 anos, Mata Hari foi uma das principais figuras do animado período que se tornou conhecido como belle époque. Tanto esse tempo quanto sua vida fulgurante iriam acabar com o início da 1a Guerra Mundial, em 1914.

As circunstâncias de seu envolvimento com a guerra e a espionagem são confusas. Existem duas correntes de pensamento. A primeira diz que ela se tornou uma espiã alemã por influência de um de seus amantes, que era chefe da polícia de Berlim. Ela teria transmitido aos alemães os segredos militares que escutava nas alcovas de oficiais aliados, durante suas turnês de dança na França, na Bélgica e na Inglaterra. Já a outra corrente diz que na verdade Mata Hari era uma agente dupla francesa. Segundo essa versão, ela teria se apaixonado por um oficial russo, que foi ferido em batalha. Para poder visitá-lo no hospital, ela aceitou espionar para a França. Para cumprir sua missão, teria se tornado amante do cônsul alemão na França e iniciado um jogo duplo: ela teria passado ao cônsul apenas informações falsas, enquanto tentava arrancar segredos militares dele.

Seja como for, em janeiro de 1917 a inteligência francesa interceptou uma mensagem de rádio na qual um oficial alemão descrevia os sucessos obtidos por uma agente chamada H-21. Com base em informes anteriores, os franceses deduziram que H-21 era Mata Hari, que foi presa. O que deixa muita gente com a pulga atrás da orelha é que a mensagem foi transmitida num código que os germânicos sabiam ser conhecido dos franceses. Assim, existem historiadores que acham que os alemães descobriram que Mata Hari era uma agente dupla e quiseram se livrar dela. Na época, a França atravessava um período difícil na guerra: o moral estava baixo, havia deserções em massa e parecia não haver nenhum fim previsível para o conflito. Assim, Mata Hari teria sido escolhida como bode expiatório para os males do país.

 

Cercada de mistérios

Julgada, sempre negou ser uma espiã. A acusação teve muita dificuldade em arranjar provas contra ela. Tudo o que foi encontrado foi um pouco de tinta “invisível” em seu quarto, do tipo que era usado para enviar mensagens secretas. Embora alegasse que a tinta era parte de sua maquiagem, Mata Hari foi considerada culpada e condenada à morte. No dia 15 de outubro, foi executada por um pelotão de fuzilamento. Seus restos mortais teriam sido preservados e enviados para os depósitos do Museu de Anatomia de Paris, mas estudos recentes descobriram que eles desapareceram de lá há várias décadas. Mais um dos muitos pontos de interrogação na história dessa mulher cheia de mistérios.

 

Richard Sorge – O James Bond vermelho

Disfarçado como um jornalista boêmio e mulherengo, ele salvou a União Soviética da derrota na 2ª Guerra Mundial

Data de nascimento: 4 de outubro de 1895

Local: Baku, na Rússia (hoje no Azerbaijão)

País para qual trabalhou: União Soviética

Maior façanha: Impedir os nazistas de conquistar Moscou

Morte: Enforcado, em 7 de novembro de 1944

Poucas pessoas podem se gabar de, sozinhas, terem mudado a história do mundo. Uma delas é Richard Sorge. Esse russo criado na Alemanha, considerado um dos espiões mais eficientes de todos os tempos, foi uma das peças-chave da 2a Guerra Mundial ao descobrir que, em 1941, os japoneses escolheram atacar os americanos em Pearl Harbor, e não a Rússia. A informação foi transmitida para o Kremlin e permitiu que os russos retirassem as tropas que vigiavam os exércitos japoneses na Sibéria e as transferissem para a capital, Moscou, então sob ataque do exército nazista. Esses soldados derrotaram os alemães e permitiram que a União Soviética continuasse na guerra, de onde sairia vitoriosa 4 anos mais tarde. Sorge, no entanto, não viveu para ver o triunfo. Capturado e torturado, morreu enforcado em uma prisão japonesa, em 1944.

Sorge nasceu em Baku, na Rússia (hoje no Azerbaijão), filho de um engenheiro alemão com uma russa. Três anos depois, o pai voltou para Berlim e levou a família junto. Durante a 1a Guerra Mundial, Sorge serviu no Exército alemão e foi severamente ferido: uma explosão lhe arrancou 3 dedos e quebrou suas pernas, fazendo com que ficasse manco para o resto da vida. Tornou-se comunista convicto durante seus estudos nas faculdades de Berlim, Kiel e Hamburgo, pela qual recebeu o diploma de Ph.D. em ciências políticas, em 1919. Em seguida, se mudou para Moscou, onde foi recrutado para o Departamento 14 do Exército Vermelho, que cuidava das ações de inteligência. Foi ali que iniciou a carreira de espião, operando sob o codinome Ramsay.

 

Personalidade falsa

De volta à Alemanha, Sorge começou a trabalhar disfarçado como jornalista e se filiou ao partido nazista para ter acesso aos políticos alemães. Dono de uma personalidade pacata, ele criou uma nova persona para si mesmo: boêmio, sempre envolvido com mulheres, e um grande bebedor. Na verdade, essa era uma tática: resistente ao álcool, ele conseguia arrancar qualquer informação de seus “companheiros” de bebida. Mais tarde, essa técnica cobraria seu preço e ele se tornaria alcoólatra. Em 1933, foi enviado è China e depois ao Japão como correspondente. Lá, se tornou confidente de uma série de autoridades de alto escalão, como um conselheiro do primeiro-ministro japonês e do embaixador alemão. Aliás, se tornou tão próximo que teve um caso com a mulher do embaixador. Logo, ele construiu uma ampla rede de espionagem, que fornecia para a União Soviética diversos dados secretos da Alemanha e do Japão.

 

Mudando a história da guerra

Uma das principais informações descobertas por Sorge foi o plano dos nazistas de atacarem a União Soviética e até a data do início da ofensiva: 22 de junho de 1941. No entanto, o ditador soviético Stalin duvidou da informação e não tomou nenhuma providência. Como conseqüência, a ofensiva alemã foi devastadora. Os nazistas conquistaram a maior parte da Rússia Ocidental e logo estavam nos portões de Moscou. O que salvou a Rússia foi a descoberta de Sorge de que os japoneses iriam atacar os americanos, e não os soviéticos. Com a transferência para Moscou das tropas que até então vigiavam os nipônicos, foi possível deter a ofensiva alemã.

No entanto, essa descoberta custou caro para Sorge. A polícia secreta japonesa, a temível Tokko, ficou em seus calcanhares. No dia 14 de outubro de 1941, ela prendeu Hotsumo Ozaki, um dos membros de seu círculo de espionagem. Sob tortura, ele acabou entregando o nome de Sorge, que foi preso 4 dias depois. Foi o início de um período amargo. Ele foi interrogado e torturado várias vezes, mas sempre negou ser um espião de Moscou. A União Soviética também não fez qualquer esforço para libertá-lo; Stalin tinha medo da reação, quando fosse descoberto que ele teve acesso aos planos da ofensiva alemã e nada fez. Assim, na manhã de 7 de novembro de 1944, Sorge foi enforcado no pátio da prisão de Sugamo. Após a guerra, seu corpo foi transferido para o cemitério de Tama, em Tóquio, onde está até hoje.

 

Virginia Hall – A espiã manca

Sem parte de uma perna, ela foi considerada pela Gestapo a agente mais perigosa dos Aliados

Data de nascimento: 6 de abril de 1906

Local: Baltimore, EUA

País para qual trabalhou: EUA e Inglaterra

Maior façanha: impedir os nazistas de conquistar Moscou

Morte: Enforcado, em 7 de novembro de 1944

Quem disse que todos os espiões têm que ser fortes e atléticos para realizar suas façanhas? Virginia Hall é a prova do contrário. Sem parte de uma perna – resultado de um acidente anos antes da 2a Guerra Mundial – ela causou tantos problemas aos alemães organizando a Resistência Francesa que foi considerada pela polícia secreta nazista, a Gestapo, como a espiã mais eficiente dos Aliados. Por várias vezes, os nazistas quase capturaram aquela que eles apelidaram de “espiã manca” – seu codinome oficial era Artemis – mas ela sempre conseguiu escapar, a despeito de seu problema físico.

Quando criança, Virginia teve acesso aos melhores colégios e faculdades, mas queria terminar seus estudos na Europa. Passou pela França e pela Alemanha, até conseguir um emprego na Embaixada Americana em Varsóvia, na Polônia. Ela esperava seguir carreira diplomática, mas sofreu um sério acidente em 1932: durante uma caçada, ela atirou na própria perna esquerda. O ferimento infeccionou e sua perna teve que ser amputada do joelho para baixo. Virginia passou a usar uma prótese de madeira, que ela logo apelidou de Cuthbert. No entanto, o acidente acabou com suas chances de seguir carreira no governo e nos anos seguintes ela teve vários tipos de serviço, em diversos países europeus.

 

Sem limitações

Quando começou a 2a Guerra Mundial, Virginia estava trabalhando como enfermeira em Paris. Com a queda da França frente aos alemães, fugiu para a Inglaterra e se apresentou como voluntária para o Serviço de Operações Especiais britânico. Ela recebeu um extenso treinamento sobre armas, comunicações, código Morse e explosivos. Apesar das dificuldades criadas por sua perna artificial, ela se destacou nos treinos. “Minha única limitação era que eu não podia saltar de pára-quedas”, disse ela, anos depois. Sua primeira missão foi estabelecer contatos com a Resistência Francesa, que fustigava os ocupantes nazistas. Ela passou todo o ano de 1942 no sul da França, na região conhecida como Vichy, ajudando na fuga de prisioneiros e criando uma rede de espiões que obtinha acesso a informações de todos os cantos do país. Quando os alemães ocuparam a região, no final do ano, ela escapou por um triz para a Espanha e de lá de volta para a Inglaterra. Durante a escapada através do montes Pireneus, ela mandou uma mensagem para a Grã-Bretanha dizendo que “Cuthbert pode dificultar a fuga”. Esquecendo-se que esse era o apelido da perna artificial, os ingleses responderam que “se Cuthbert causar problemas, elimine-o”. De volta a Londres, ela foi condecorada, mas teve que deixar as operações britânicas de inteligência: os ingleses temiam que os alemães já tivessem dados detalhados sobre ela.

 

A velha camponesa

Virginia se juntou então ao serviço secreto americano da época, chamado de OSS, e novamente foi enviada ao sul da França, em 1944. Lá, suas atividades incluíram o mapeamento de áreas de aterrissagem de pára-quedistas, sabotagem e o treinamento de 3 batalhões de guerrilheiros franceses, além da constante captação de informações sobre a movimentação de tropas nazistas. Durante esse período, a Gestapo fez todos os esforços para capturá-la. Foram espalhados cartazes com seu retrato, que diziam: “Temos que achá-la e destruí-la”. Virginia escapou diversas vezes se disfarçando como uma velha camponesa, usando panos na cabeça e enchendo suas roupas com penas de ganso, para parecer mais gorda. Nos últimos dias da ocupação alemã na França, sua tropa de guerrilheiros sabotou trens de carga, cortou fios telefônicos, demoliu 4 pontes, matou mais de 150 soldados inimigos e capturou outros 500. Essas operações lhe valeram a única condecoração americana entregue a uma mulher civil na 2a Guerra Mundial.

Após o final do conflito, ela se casou com outro agente da OSS e passou a trabalhar na recém-criada CIA. Sua principal atividade era a análise de informações de inteligência relativas ao alto escalão do governo francês. Ela só se retirou do serviço ativo em 1966, quando atingiu a idade-limite (60 anos) da aposentadoria compulsória. Virginia morreu em um hospital próximo à sua casa nos EUA, em 1982.

 

Dusan ·Dusko· Popov – O verdadeiro James Bond

Servindo o império britânico, o agente iugoslavo inspirou o escritor Ian Fleming a criar o agente 007

Data de nascimento: 1912 (não há registro do dia)

Local: Titel, na Sérvia

País para qual trabalhou: Inglaterra

Maior façanha: Descobrir os planos secretos japoneses para o ataque contra Pearl Harbor

Morte: Causas não-especificadas, em 1981 (não há registro do dia)

James Bond é, indiscutivelmente, a maior lenda do mundo da espionagem. Seus filmes e livros praticamente definiram a imagem atual do espião – sedutor e mortal. O que pouca gente sabe é que o criador de 007, o escritor Ian Fleming, se baseou em uma figura real para dar vida ao mito. Quem serviu de modelo para Fleming foi “Dusko” Popov, um jovem e rico playboy iugoslavo que espionou para os ingleses na 2a Guerra Mundial.

Nascido na antiga Sérvia, “Dusko” Popov era uma criança quando seu país se juntou aos outros da região dos Bálcãs para formar a Iugoslávia. Sua família se tornou rica graças ao pai, dono de diversas indústrias. Democrata convicto, Popov logo desenvolveu uma profunda aversão pelas ações da Alemanha nazista e resolveu se oferecer para trabalhar como espião para os ingleses.

 

Surge o Triciclo

Na Inglaterra, Popov começou a operar sob o codinome de Triciclo. Uma das explicações para a origem do nome seria a lendária preferência do iugoslavo de ter duas mulheres na cama com ele ao mesmo tempo. Ele atuava como agente duplo, tendo convencido os alemães de que na verdade seria contra a monarquia britânica. Em troca de grandes quantias de dinheiro, Triciclo fornecia informações aos alemães, mas todas eram antes cuidadosamente aprovadas pelos ingleses, de modo que nenhum segredo realmente importante fosse revelado; assim, o agente logo ganhou credibilidade junto aos alemães. O dinheiro enviado pelos germânicos era usado para operações da inteligência britânica, e Popov obtinha informações sobre uma série de operações e planos nazistas, que eram imediatamente repassadas aos ingleses.

Foi nessa época que o futuro escritor Ian Fleming conheceu o iugoslavo, em um cassino. Durante um jogo de bacará, Fleming – que também trabalhava para a inteligência inglesa – estava vencendo todos os rivais e arrogantemente mostrando o dinheiro que tinha ganho. Calmamente, Popov entrou no jogo, derrotou Fleming e faturou US$ 50 000 às suas custas. A experiência marcou Fleming tão profundamente que mais tarde ele usaria Popov como base para criar James Bond.

Em 1941, Triciclo obteve seu maior sucesso. Ele conseguiu acesso a um relatório alemão que descrevia detalhadamente o plano japonês de ataque à base americana de Pearl Harbor. Imediatamente, foi enviado aos EUA para informar as autoridades americanas. No entanto, seu relato não teve nenhuma receptividade: o diretor do FBI, John Edgard Hoover, detestou o fulgurante Popov e não acreditou no relatório. Hoover disse que o agente não passava de um bon vivant, que usava o serviço de inteligência para obter dinheiro para suas farras. Poucas semanas depois, o ataque – exatamente no dia previsto pelo informe – praticamente destruiu a frota naval dos EUA no oceano Pacífico.

Verdade seja dita, Popov realmente extrapolou em sua estada nos EUA. Ele percorreu o país na companhia da estrela de cinema Simone Simon e sempre se hospedou nos melhores hotéis, comeu nos restaurantes mais caros, visitou cassinos e aproveitou o máximo da vida noturna americana – tudo às custas da inteligência britânica. Em sua lista de compras estava até um apartamento na caríssima Park Avenue, em Nova York. Popov também esteve no Brasil nessa época. Suas aventuras em solo tupiniquim foram descritas pelo escritor e jornalista Flávio Moreira da Costa no livro Crime, Espionagem e Poder.

 

Mantendo o estilo

Durante o restante da guerra, Popov continuou a passar informações falsas aos alemães. No entanto, em 1944, seu contato – que sabia que Popov trabalhava para os britânicos – foi desmascarado e os alemães descobriram que Triciclo era na verdade um agente inimigo. Foi o fim de sua atuação como espião durante o conflito.

Após a guerra, Popov manteve o seu estilo de vida. Conforme relata em sua biografia Spy, Counterspy (sem versão em português), escrita nos anos 70: “Todo ano eu passava pelo menos um mês em Paris. Não há cidade com mulheres tão belas”. Mas mesmo ele foi fisgado: Popov acabou se casando e teve 3 filhos. Morreu em 1981, aos 69 anos, na Côte d’Azur francesa.

 

Harold ·Kim· Philby – O terceiro homem

O agente duplo soviético viveu uma situação pitoresca: foi encarregado de caçar a si mesmo

Data de nascimento: 1º de janeiro de 1912

Local: Ambala, na Ìndia

País para qual trabalhou: União Soviética

Maior façanha: Liderar o setor do serviço inglês que localizava informantes soviéticos, ao mesmo tempo em que espionava para a Rússia

Morte: Complicações relacionadas ao álcool, em 11 de maio de 1988

Philby nasceu em 1912 na Índia, na época uma colônia britânica. Seu pai era o famoso diplomata e escritor John Philby. Ele ganhou seu apelido porque, tal qual o protagonista do romance Kim, de Rudyard Kipling, aprendeu a falar punjab antes do inglês. Foi para a Inglaterra estudar no prestigioso Trinity College, em Cambridge, onde se tornou um admirador do comunismo e começou a ter contato com os movimentos subterrâneos socialistas na Europa.

 

Os 5 universitários

O serviço secreto soviético de então, chamado NKVD, estava havia algum tempo tentando se infiltrar na inteligência britânica. Para isso, começou a procurar por jovens destinados a seguir carreira no governo inglês e que manifestassem simpatia pelo comunismo. Philby era o alvo perfeito dessa estratégia. Em 1933, ele e mais outros 4 rapazes da faculdade começaram a espionar para os russos. Esse círculo de espiões se tornaria conhecido como “Os 5 de Cambridge”.

Após se formar, Philby foi para a Espanha. Oficialmente, trabalhou como correspondente na guerra civil que assolava o país; na verdade, colhia informações para o serviço secreto inglês e, em segredo, também para o soviético. Com o início da 2a Guerra Mundial, volta para a Inglaterra para trabalhar – agora de modo oficial – no MI6, a inteligência britânica, dirigindo o setor que espionava Espanha, Portugal e Gibraltar. Seu brilhante desempenho provocou um rápido crescimento dentro da organização, ao mesmo tempo em que continuava a passar informações para a Rússia. Em 1944, foi nomeado comandante de um departamento cujo objetivo era localizar os espiões soviéticos que agiam em solo britânico, ou seja, sua função era descobrir agentes como ele próprio. Era considerado um funcionário tão exemplar que foi agraciado com uma alta condecoração, a Ordem do Império Britânico.

Pouco depois, em 1949, ele foi enviado aos EUA para servir de ligação com a CIA. Datam dessa época seus maiores sucessos. Com base nos dados enviados por Philby, Moscou conseguiu acabar com os planos ocidentais de desestabilizar os governos comunistas do Leste Europeu. Suas informações também ajudaram a acabar com uma revolução anticomunista na Albânia e com movimentos pró-Ocidente na Ucrânia. Acredita-se que ele também tenha informado o ditador soviético Stalin que os americanos tinham poucas armas nucleares em seu arsenal, o que fez com que o líder comunista desse o aval para a Coréia do Norte invadir a do Sul, em 1950, o que daria origem à Guerra do Coréia.

 

Em busca do Terceiro Homem

Philby começou a passar por momentos difíceis em 1951. Dois de seus antigos colegas de Cambridge, Guy Burgess e Donald Maclean, foram descobertos e fugiram para Moscou. Logo a inteligência ocidental passou a suspeitar que havia um “Terceiro Homem” espionando para os russos. Philby se tornou suspeito e foi interrogado várias vezes. Embora nada fosse provado contra ele, acabou tendo que se demitir. Foi para o Líbano, onde continuou a espionar como freelance para os britânicos – e para os russos. A verdade foi revelada em 1963, quando um desertor da KGB fugiu para o Ocidente e confirmou que de fato Philby era o “Terceiro Homem”. As agências ocidentais tentaram capturá-lo, mas ele conseguiu embarcar em um avião com destino a Moscou .

Na Rússia, Philby foi inicialmente recebido com frieza. Muita gente na KGB duvidava de sua lealdade, pois consideravam suas informações “boas demais para serem verdade”. Ele passou por tempos difíceis nessa época: se envolveu com a esposa de seu antigo amigo Maclean e desenvolveu uma dependência do álcool. Algum tempo depois, escreveu o livro My Silent War, onde relata suas aventuras e destaca que começou a espionar para a União Soviética porque achava que apenas o comunismo era capaz de impedir a vitória do nazismo. Foi reabilitado no início dos anos 80, quando recebeu a cidadania soviética e se tornou consultor da KGB. Morreu em 1988 por complicações decorrentes do alcoolismo, sem assistir ao colapso do seu admirado comunismo.

 

Juan Pujol – O espião que enganou Hitler

Sob os auspícios do serviço secreto britânico, ele criou uma rede fictícia de espionagem para os alemães na 2ª Guerra Mundial

Data de nascimento: 14 de fevereiro de 1912

Local: Barcelona, na Espanha

País para qual trabalhou: Inglaterra

Maior façanha: Facilitar o desembarque dos Aliados na Normandia fornecendo informações falsas aos nazistas

Morte: Causas não especificadas, em 10 de outubro de 1988

Até bem pouco tempo atrás, o nome Juan Pujol era desconhecido, mesmo entre a comunidade de espionagem. Já as aventuras de seu codinome – Garbo – são uma verdadeira legenda em todo o mundo. Por muitos anos, não se sabia a identidade do espião que salvou o Dia D (a invasão aliada da Normandia, na 2a Guerra Mundial) ao fazer os alemães acreditar que o desembarque seria em outro local. Porém, as façanhas de Garbo vão muito além dessa operação.

Nascido em Barcelona, Pujol era filho de pais com visões políticas liberais. Durante a Guerra Civil Espanhola, embora suas convicções o aproximassem da facção democrata, foi obrigado a combater no lado do ditador Francisco Franco para proteger a família. Essa experiência o marcou profundamente; ele desenvolveu um profundo desgosto pelo fascismo. Assim, quando começou a 2a Guerra, decidiu se colocar à disposição da Inglaterra, contra o avanço do nazismo alemão.

 

A falsa rede

Inicialmente ele se ofereceu ao serviço secreto inglês, mas foi recusado. Pujol criou então um plano: ele entrou em contato com os alemães e os convenceu a contratá-lo como agente. Para isso, Pujol mentiu que estava na Inglaterra, e passou a enviar uma série de informes sobre movimentos de tropas e a chegada de navios com munição às ilhas britânicas. Na verdade, ele estava em Portugal e simplesmente transmitia informações que saíam no jornal local. Os alemães caíram na esparrela e passaram a enviar dinheiro para o “seu” agente criar uma rede de espionagem em solo inglês.

Novamente, ele ofereceu seu trabalho aos britânicos. Vendo seu grande sucesso, dessa vez eles o contrataram e o levaram para a Inglaterra em 1942, onde passou a trabalhar com o codinome de Garbo. A partir desse ponto, ele passou a enviar aos alemães uma mistura de informações falsas, que prejudicavam totalmente as operações militares nazistas, com algumas verdadeiras – previamente aprovadas pelos britânicos. O objetivo era manter a credibilidade de Garbo. O esquema funcionou perfeitamente. Os alemães continuaram enviando fortunas (que iam parar nos cofres ingleses) para Garbo manter sua rede de espionagem inexistente. Em um de seus relatórios para Berlim, chegou a dizer que já tinha 27 agentes operando sob seu comando. Em muitos casos, as atividades de Pujol foram tão convincentes que fizeram os alemães revelar o nome e a localização de diversos espiões verdadeiros, tornando fácil para os britânicos neutralizá-los. Ele chegou até mesmo a ser condecorado pelos nazistas pelo rádio. Em “agradecimento”, ele transmitiu uma mensagem dizendo que “realmente não era digno de tamanha honraria”.

 

O salvador do Dia D

O maior golpe de Garbo foi aplicado pouco antes da grande operação de invasão da Normandia, conhecida como Dia D. Os aliados decidiram usar Pujol para enganar os alemães sobre o local onde se daria o desembarque. Assim, pouco antes do ataque, ele avisou seus “superiores” em Berlim que tinha um comunicado importante a fazer. A idéia era dizer que o desembarque seria na região de Calais, e não na Normandia. No entanto, seu contato na Alemanha teve um problema com o rádio e Garbo não conseguiu falar com ele antes do início do desembarque. Parecia que os alemães estavam livres para usar suas tropas de reserva para repelir a invasão aliada.

Foi então que Pujol teve a grande idéia: ele comunicou aos germânicos que o ataque na Normandia era apenas um despiste, e que o verdadeiro desembarque seria mesmo em torno de Calais. Hitler acreditou na informação falsa e mandou suas reservas militares esperarem inutilmente naquela região. Assim, os aliados conseguiram consolidar a invasão e iniciar a marcha que os levaria à vitória contra a Alemanha.

Após o fim da guerra, Pujol se mudou com a família para a Venezuela e viveu no anonimato. A identidade de Garbo ficou desconhecida por 40 anos, até que ele finalmente voltou para a Inglaterra para receber diretamente das mãos da rainha uma comenda. Ele foi uma das únicas pessoas a ser condecoradas tanto pelos ingleses como pelos alemães. Pujol faleceu em Caracas, em 1988, aos 76 anos.

 

Markus Wolf – O homem sem rosto

Por mais de 20 anos, ninguém no Ocidente conseguiu uma única imagem de um dos mestres da espionagem

Data de nascimento: 19 de janeiro de 1923

Local: Hechingen, na Alemanha

País para qual trabalhou: Alemanha Oriental

Maior façanha: Criar uma das maiores redes de espiões da Guerra Fria

Morte: Causas naturais, em 9 de novembro de 2006

No mundo da espionagem, poucas informações permanecem secretas. Pois Markus Wolf, líder do serviço de espionagem da antiga Alemanha Oriental, não só manteve sua face anônima por mais de duas décadas – o que lhe valeu o apelido de Homem Sem Rosto – como também obteve acesso a segredos militares da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a aliança militar ocidental que poderiam ter decidido o rumo de uma eventual 3a Guerra Mundial na Europa. Temido e ao mesmo tempo admirado por seus opositores no lado ocidental da Cortina de Ferro, ele criou uma das mais eficientes máquinas de espionagem do mundo.

Wolf nasceu em 1923 na Alemanha, em uma família de classe média. Ele teve uma infância confortável, mas que foi interrompida pela ascensão de Adolf Hitler ao poder, em 1933. Como seus pais eram socialistas – ambos eram membros do Partido Comunista alemão – sua família migrou para a União Soviética, fugindo das perseguições nazistas. Ali, ele concluiu os estudos e se tornou comunista convicto, servindo em diversos cargos dentro do partido local. Após o fim da 2a Guerra Mundial, voltou para sua terra natal – então dividida entre os pedaços ocidental e oriental – e começou a trabalhar dentro da nova burocracia do Estado. Sua eficiência fez com que conseguisse uma rápida promoção dentro do aparelho estatal.

 

No comando da máquina de espionagem

Em 1953, Wolf foi escolhido para chefiar a divisão de espionagem externa da polícia secreta da Alemanha Oriental, a Stasi. Ali, ele dirigiu uma rede de 4 000 espiões, que tiveram grande sucesso se infiltrando em cargos na Alemanha Ocidental e em outros países da Europa. Planejando com antecedência, às vezes Wolf esperava anos por informações, até que um de seus agentes finalmente conseguisse alcançar um alto posto. Entendia bem as atrações que o capitalismo exercia, e ele mesmo era um apreciador do conforto e de mulheres bonitas. Era considerado como um chefe caloroso, que se importava muito com os subordinados, o que não o impedia de usar esse charme para manipulá-los.

Um dos métodos favoritos de Wolf para obter informações era através do sexo. Sob seu comando, se tornou comum o uso de agentes (que recebiam o apelido de Romeus) para seduzir autoridades e, na alcova, ouvir seus segredos. Uma das vítimas foi a secretária do ex-chanceler Konrad Adenauer, que durante anos foi vítima de um Romeu. Parte da mística de Wolf também se deve ao fato de que, durante quase toda sua carreira na Stasi, ninguém no lado ocidental conseguiu sequer uma imagem sua. O segredo sobre ele só cairia durante uma viagem à Suécia, em 1978, quando um agente escondido conseguiu finalmente capturá-lo em uma foto à distância.

O maior sucesso de Wolf foi ter infiltrado seu informante Gunter Guillaume nos altos quadros do Partido Social-Democrata da Alemanha Ocidental. Guillaume se tornou confidente do chanceler Willy Brandt e obteve acesso a diversos segredos da Otan. Quando Guillaume foi desmascarado, o escândalo foi tamanho que Brandt foi obrigado a renunciar. Oferecendo altas somas de dinheiro, ele também trouxe para seu lado Hans-Joachim Tiedge, o agente ocidental que era responsável por caçar espiões duplos na Alemanha Ocidental. Assim, Wolf garantiu que os agentes orientais e soviéticos poderiam seguir seu trabalho sem ser importunados.

 

Batalha pela liberdade

Wolf se aposentou em 1986 e começou a escrever um livro com episódios de sua vida chamado Troika (inédito em português). No livro e em diversas manifestações públicas, ele mostrou apoio às reformas feitas pelo ex-presidente soviético Mikhail Gorbatchov, o que lhe valeu grande apelo popular. Após anos nas sombras, ele conseguiu atrair todos os holofotes para si. Após a queda do Muro de Berlim, ele procurou asilo na União Soviética, que foi negado. Ele então teve que passar por uma verdadeira batalha judicial: autoridades da nova Alemanha unificada o prenderam e soltaram diversas vezes, sob acusações que iam de traição a escuta ilegal. Finalmente, foi considerado inocente, pois o país no qual as acusações eram baseadas (a Alemanha Oriental) não existia mais. Ele morreu dormindo em sua cama, em 2006, aos 83 anos.

 

Eli Cohen – O espião impossível

Trabalhando infiltrado, o agente israelense chegou a ser cotado para a presidência da Síria

Data de nascimento: 26 de dezembro de 1924

Local: Alexandria, no Egito

País para qual trabalhou: Israel

Maior façanha: Transmitir informações que ajudaram Israel a vencer a Guerra dos 6 Dias

Morte: Enforcado, em 18 de maio de 1965

Em um país como Israel, que dispõe de um dos melhores serviços secretos do mundo e um histórico de grandes espiões, ser considerado o melhor de todos os agentes não é fácil. Mas esse foi o destino de Eli Cohen, até hoje venerado como herói por sua atuação decisiva na Guerra dos 6 Dias. Ele ganhou o apelido de Espião Impossível por ter realizado uma tarefa inimaginável: se infiltrar de tal modo na cúpula do poder, na Síria, que chegou a ser cotado para o cargo de presidente.

Apesar de ter nascido no Egito, a família de Cohen era formada por judeus sírios. Durante a infância e adolescência, ele recebeu uma educação que enfatizava sua herança judia e sionista. Com a criação do Estado de Israel, em 1948, sua família migrou para lá, mas ele permaneceu no Egito para coordenar atividades da colônia judaica. Por duas vezes, ele ofereceu seus serviços à inteligência israelense, mas foi recusado: embora fosse considerado como “dono de grande inteligência e bravura, além de uma memória prodigiosa”, ele teria também “um exagerado senso de confiança em si mesmo”. Em 1960, no entanto, o serviço secreto israelense, o Mossad, resolveu chamá-lo: estava preparando uma operação de infiltração na Síria e Cohen era a pessoa ideal para a tarefa. Ele tinha ascendência síria, era conhecedor da cultura árabe, possuía feições orientais, falava vários idiomas e, acima de tudo, era fanaticamente devotado à causa sionista.

 

Disfarce argentino

Inicialmente, Cohen participou de um extenso treinamento que incluía direção em alta velocidade, técnicas de evasão, uso de armas, sabotagem e criptografia. Em seguida, ele ganhou uma nova identidade: Kamel Abin Tabas, supostamente nascido na Síria e que teria se tornado um negociante de tecidos bem-sucedido na Argentina. Enviado a Buenos Aires, morou por um ano entre a comunidade árabe local. Logo se tornou conhecido como rico, generoso e mulherengo, fazendo contato com diversos oficiais da embaixada síria, a quem sempre falava sobre sua “vontade de servir ao país”. Logo, foi convidado a “voltar” para lá.

Nos anos seguintes, Cohen – ou melhor, Tabas – viveu na Síria, participando de festas, encontros de negócio e manifestações políticas na capital, Damasco. Aos poucos, foi cultivando amizades e ganhando a confiança de militares e políticos do alto escalão. Ele ficou particularmente próximo de Hafez Al-Assad, que mais tarde se tornaria Presidente da Síria por mais de 3 décadas. Nesse período, Cohen quase foi convidado a ser ministro da Defesa e chegou a ser o 3o na lista de sucessão para a Presidência. Durante todo esse tempo, ele alimentava Israel com informações via rádio e cartas secretas.

Essas informações mostrariam todo o seu valor alguns anos depois, com o início da Guerra dos 6 Dias, em 1967, que colocou Israel contra a Síria, Egito e Jordânia. Cohen tinha visitado fortificações sírias nas colinas de Golan, um local estratégico próximo à fronteira com Israel, e enviado planos detalhados com sua localização. Como convidado dos militares sírios, ele também havia estado anteriormente nas bases secretas no local e sugerido que eucaliptos fossem plantados ao redor, como forma de camuflagem. Na verdade, esses eucaliptos serviram de guia para a Força Aérea israelense localizar as bases. Como resultado, as defesas sírias foram destroçadas e o Exército israelense tomou a região em apenas dois dias. Até hoje o local continua sob ocupação militar de Israel.

 

Seis horas na forca

Já a sorte de Cohen chegou ao fim em 1965, quando um grupo de especialistas soviéticos em contra-espionagem o pegaram enviando uma mensagem de rádio para o Mossad. Ele foi julgado e condenado à morte. Vários chefes de Estado, inclusive o papa Paulo 6o, transmitiram apelos ao governo sírio para que mudasse a sentença. Em vão. Ele foi enforcado no dia 18 de maio, com direito à transmissão ao vivo na TV síria. Após sua execução, foi deixado balançando na forca por mais de 6 horas. Desde então, a despeito de vários pedidos da família de Cohen, o governo sírio se recusa a permitir o retorno de seus restos mortais para Israel.

 

Top 10 da espionagem

FILMES

007 Contra o Satânico Dr. No Dr. No, Terence Young, EUA,1962.

Missão Impossível Mission: Impossible, Brian De Palma, EUA, 1995.

007 – O Espião Que Me Amava The Spy Who Loved Me, Lewis Gilbert, EUA, 1977.

Três Dias do Condor Three Days of the Condor, Sydney Pollack, EUA, 1975.

Intriga Internacional North by Northwest, Alfred Hitchcock, EUA, 1959.

Munique Munich, Steven Spielberg, EUA, 2005.

A Identidade Bourne The Bourne Identity, Doug Liman, EUA, 2002.

007 Contra Goldfinger Goldfinger, Guy Hamilton, EUA, 1964.

A Caçada Ao Outubro Vermelho The Hunt for Red October, John McTiernan, EUA, 1990.

Sem Saída No Way Out, Roger Donaldson, EUA, 1987.

 

MÚSICAS

Secret Agent Man Johnny Rivers Greatest Hits, Johnny Rivers, EMI, 1995.

Live And Let Die Wings Greatest, Paul McCartney & Wings, Capitol, 1990.

Peter Gunn The Music of Henry Mancini, Henry Mancini, Naxos, 1994.

A View To A Kill Greatest, Duran Duran, Capitol, 1998.

Agent Double-O Soul The Very Best of Edwin Starr, Edwin Starr, Motown, 1998.

You Know My Name You Know My Name, Chris Cornell, Umvd Import, 2006.

FBI (I Spy for The) Wild Child, The Untouchables, Cherry Red, 2004.

Watching the Detectives My Aim Is True, Elvis Costello, Rykodisc, 1993.

The Living Daylights Stay on These Roads, A-Ha, Warner, 1988.

The Silencers The Silencers Soundtrack, Vikki Carr, RCA, 1966.

 

LIVROS – NÃO-FICÇÃO

Stealing Secrets, Telling Lies: How Spies & Codebrakers Helped Shape the Twentieth Century James Gannon, EUA, Potomac Books, 2002.

The Spycraft Manual: The Insider’s Guide to Espionage Techniques Barry Davies, EUA, Zenith, 2005.

O Homem Sem Rosto Man Without a Face, Markus Wolf, Brasil, Editora Record, 1997.

Ministério do Silêncio: a História do Serviço Secreto Brasileiro de Washington Luís a Lula Lucas Figueiredo, Brasil, Editora Record, 2005.

Eichmann em Jerusalém Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil, Hannah Arendt, Brasil, Companhia das Letras, 1999.

The Illegals: The Double Lives of the Cold War’s Most Secret Agents Nigel West, Inglaterra, Hodder & Stoughton, 1993.

Crime, Espionagem e Poder Flávio Moreira da Costa, Brasil, Editora Record, 1987.

Contra Ataque Striking Back: The 1972 Munich Olympics Massacre and Israel’s Deadly Response, Aaron Klein, Brasil, Ediouro, 2006.

Todos os Homens do Xá All the Shah’s Men: An American Coup and the Roots of Middle East Terror, Stephen Kinzer, Brasil, Bertrand, 2004.

Garbo: O Espião que Derrotou Hitler Juan Pujol: El Espia que Derroto a Hitler, Javier Juarez, Brasil, Relume Dumará, 2005.

 

LIVROS – FICÇÃO

O Espião Que Saiu do Frio The Spy Who Came In From the Cold, John le Carré, Brasil, Record, 2003.

Moscou Contra 007 From Russia with Love, Ian Fleming, Brasil, Record, 2003.

The Third-Nine Steps John Buchan, EUA, Oxford University Press, 1999.

O Espião que Sabia Demais Tinker, Tailor, Soldier, Spy, John le Carré, Brasil, Record, 1974.

O Dia do Chacal The Day of the Jackal, Frederick Forsyth, Brasil, Record, 1999.

The Ipcress File Len Deighton, EUA, HarperCollins, 1995.

Cassino Royale Casino Royale, Ian Fleming, Brasil, Record, 2006.

O Buraco da Agulha The Eye of the Needle, Ken Follett, Brasil, Record, 1978.

A Companhia: Um Romance Sobre a CIA

The Company, Robert Littell, Brasil, Record, 2003.

Death of a Citizen Donald Hamilton, EUA, Fawcett, 1984.

 

GAMES

Tom Clancy’s Splinter Cell Ubisoft, 2002.

KGB Cryo Interactive, 1992.

Metal Gear Solid 2: Sons of Liberty Konami, 2001.

Spycraft: The Great Game Activision, 1996.

GoldenEye 007 Nintendo, 1997.

Metal Gear Solid 3: Snake Eater Konami, 2004.

No One Lives Forever Monolith, 2000.

Return to Castle Wolfenstein Actvision, 2001.

Tom Clancy’s Rainbow Six Red Storm, 1998.

007: Nightfire Eurocom, 2002.

 

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