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Os Malditos – Rasputim, o místico devasso

Guru salafrário, curandeiro, depravado, anticristo ou santo de corpo fechado, Rasputin penetrou a corte russa ao tratar um filho do czar Nicolau 2º para depois tomar o poder de fato na 1ª Guerra

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h25 - Publicado em 25 fev 2011, 22h00

Texto Álvaro Oppermann

Olhos arregalados, barbas e cabelos compridos em desalinho. O místico russo Grigori Yefimovich Rasputin (1869-1916) entrou para a história com o apelido de “monge louco”. Foi a eminência parda do czar Nicolau 2º e da czari­na Ale­xandra, na Rússia, antes da Re­vo­lu­ção de 1917. Rasputin tinha um incrível poder magnetizador, e mandava e desmandava no casal real. Por tabela, também na “Mãe Rússia” (como os russos ainda hoje chamam o país).

Dois detalhes: Rasputin podia ter cara de doidão e estilo de guru, mas não era monge. Sua ligação com a Igreja Ortodoxa russa foi esparsa, tensa e conflituosa. Também não era louco, de acordo com diagnósticos modernos. Ao analisar seu perfil, o psiquiatra húngaro Thomas Stephen Szasz não encontrou nele traços de insanidade. Ele era, isto sim, calculista e inteligente, diz Szasz. Já a psicóloga Martha Stout, autora de The Sociopath Next Door (“O Sociopata da Porta ao Lado”), é enfática: era um psicopata.

Rasputin nasceu na Sibéria, numa família de camponeses. Reza uma lenda que o garoto tinha supostos dons de clarividência, como identificar autores de atos ilícitos, como quando descobriu o ladrão de cavalos do seu pai.

Isso não impediu que Rasputin cometesse pequenos furtos na adolescência. Aos 18 anos foi enviado para um mosteiro, como punição por roubo. Lá, teve uma visão da Virgem Maria, e passou a viver como andarilho. Entrou em contato com a seita herética cristã dos flagelantes, cujos membros buscavam o transe místico por meio do êxtase sexual. Casou aos 20 anos, mas seguiu a vida errante.

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Em 1902, foi para São Petersburgo. Com seu jeitão simples, mas rudemente sedutor, Rasputin ganhou acesso aos salões da corte. “Como todo psicopata, Rasputin tinha uma aura ou carisma que o tornava mais interessante do que as pessoas em volta”, observa Stout. Ali, ele era visto pela nobreza russa mais ou menos como uma atração de circo, e logo teria caído no ostracismo, não fosse por um incidente.

Alexei, o filho do czar, era hemofílico, problema genético comum no ramo materno, que remontava à rainha Vitória da Inglaterra (de quem a czarina Alexandra era neta). Não se sabe como, mas Rasputin conseguia debelar as crises de hemorragia do garoto. O historiador Robert Massie aventa a hipótese de hipnose, na qual Rasputin era bamba. Não importa. O místico ganhou fama imediata de milagreiro. E também a gratidão dos pais.

Rasputin virou celebridade, passando a ser, nas palavras de Massie, uma figura controversa, de vida escandalosa. Era visto quase sempre bêbado, na companhia de prostitutas. Chegou a ser acusado de estuprar uma freira. Curiosamente, um dos significados de Rasputin em russo é devasso ou licencioso. (O escritor Valentim Rasputin, que não tem parentesco com o místico, faz uma ressalva: a palavra, que é sobrenome comum na Rússia, também quer dizer encontro de dois rios).

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Rasputin tinha ainda a fama de ser bem-dotado: 28,5 centímetros de comprimento. No entanto, o suposto pênis do místico adquirido pelo Museu Erótico Russo em São Petersburgo e em exibição desde 2004 é de origem duvidosa. Possivelmente uma armação.

O czar Nicolau 2º apreciava em Ras­­putin a religiosidade simples do povo russo. Referia-se a ele como “Nos­so Amigo” e até como santo. A mais embasbacada, porém, era Alexandra. No fim da vida de Rasputin, ela estava convicta de que Deus falava pela sua boca. O místico, nada bobo, usou essa influência em benefício próprio. Aceitava propinas para interceder por nobres junto ao casal real. Trocava os favores muitas vezes por sexo, no caso de nobres bonitas.

A aristocracia e o clero toleravam as bandalheiras do místico, mas não o seu crescente poder. Durante a 1ª Guerra, o czar Nicolau 2º foi para a frente de combate, e Rasputin, embasado pela crédula czarina, virou uma espécie de primeiro-ministro plenipotenciário. Todas as decisões tinham de passar pelo seu crivo delirante. Foi demais. Na Duma (a assembleia nacional russa) parlamentares lançavam vitríolos verbais contra Rasputin. Já um punhado de nobres, encabeçados pelo príncipe Félix Yussupov, decidiu passar às vias de fato e liquidá-lo.

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Em 1914, uma crente fanática, ex-prostituta, esfaqueou-o no abdômen. “Matei o anticristo!”, festejou. Mas Rasputin sobreviveu. Parecia ter o corpo fechado. Na noite de 29 de dezembro de 1916, Yussupov e os nobres convidaram Rasputin para uma ceia no Palácio de Moika, de propriedade do príncipe. Era uma armadilha. Ofereceram-lhe bolo e vinho envenenados com cianeto, mas ele resistiu ao veneno. “Já chega!”, disse Yussupov. E deu um tiro nas costas do místico, que tombou. Mas, para o horror dos nobres, Rasputin levantou-se e agarrou o príncipe, tentando estrangulá-lo. “Seu menino ruim!”, teria grunhido Rasputin, com olhar desvairado. Os companheiros de Yussupov vieram em seu socorro, com uma saraivada de tiros e facadas. Rasputin caiu gemendo, mas ainda vivo. Finalmente, o enfiaram num saco, que foi amarrado e jogado nas águas gélidas do rio Neva.

Seu corpo foi encontrado 3 dias depois. Feita a autópsia, constatou-se a causa mortis como afogamento: havia água nos pulmões. A inconsolável Alexandra mandou enterrá-lo em São Petersburgo. Depois da Revolução de 1917, uma turba desenterrou o cadáver e o queimou numa fogueira. Fim espetacular e dramático bem à medida do tresloucado personagem.

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