Publicidade: O gênio do Fusca
Maior publicitário da história, Bill Bernbach vendeu o carro de Hitler na terra do Tio Sam
Álvaro Oppermann
O publicitário Bill Bernbach tinha pela frente um problema e tanto naquele ano de 1959. Sua agência acabara de ser contratada para fazer a propaganda do Fusca nos Estados Unidos. Os americanos não gostavam do carro. Insensíveis ao seu arrojado design, criado pelo austríaco Ferdinand Porsche, inspirado numa gota d’água, o achavam feio e pouco prático. Deram a ele o apelido pejorativo de beetle, besouro em inglês. Além disso, carregava a pecha de ser “o carro de Hitler”, o veículo que o ditador nazista sonhara para o povo alemão. Lançado nos Estados Unidos em 1949, foi logo um fracasso. Em 1950, dos 6,6 milhões de veículos novos do país, apenas 330 eram da marca Volkswagen.
Bill Bernbach, um nova-iorquino nascido em 1911, resolveu mudar esse cenário e engatou uma nova marcha na história dos negócios do século 20. O anúncio que criou para o pequeno besouro alterou o curso do automóvel no país e, de quebra, mudou o jeito de se fazer propaganda no mundo. O seu título era “Think small” (pense pequeno). Seu humor provocativo ia contra o pensamento corrente nos EUA do “pense grande”. Um fenômeno curioso se registrou: os consumidores chegavam às lojas de automóveis repetindo aos vendedores quase literalmente os textos da campanha publicitária que tinham ouvido.
Os anúncios de Bill tinham humor e falavam com o consumidor como se fosse um amigo próximo. Além disso, o publicitário colocou um ingrediente inédito nos anúncios americanos: a malandragem de quem nasceu no Bronx.
Para a então obscura locadora de automóveis Avis, que no ano de 1962 se encontrava bem distante da líder e rival Hertz, criou a campanha “Nós somos o número dois”. Ser vice, argumentava Bernbach, era um estímulo para a Avis atender melhor o cliente e assim bater a líder. O que de fato aconteceu.
Por trás do malandro, porém, escondia-se um erudito que estudara literatura inglesa e filosofia. O passado imerso nos clássicos o ajudou. Vendo em retrospecto, os melhores anúncios de Bernbach se apoiavam num velho truque de retórica, cujo artifício consistia em, de início, concordar com a opinião contrária de uma platéia hostil, a fim de ganhar sua simpatia e confiança, para só então expor os argumentos que faziam o público mudar de opinião.
A erudição não era sua única marca distintiva. Organizado, nunca saía do escritório depois das 5 da tarde. De gosto apurado, estava sempre de paletó e gravata. Foi o primeiro a dar um lugar ao sol na publicidade a judeus, italianos e negros, antes rigorosamente excluídos da avenida Madison (rua das agências em Nova York).
Polêmicas também cercavam o nome de William Bernbach. Era considerado arrogante. “Sem arrogância não dá para fazer propaganda”, afirmava categoricamente. Rendeu-lhe críticas também o fato de ser judeu e ter transformado o sinistro carro de Hitler no simpático Fusca (ou Beetle e Carocha, alguns dos nomes que recebeu mundo afora). Aos críticos, respondia: “Nada é mais danoso a um mau produto que a boa propaganda”.
Bernbach morreu em 1982, de leucemia. Recentemente, foi eleito o maior publicitário da história. Criar um dos ícones do século 20 foi só uma de suas façanhas. Persuasão era a arte de Bill.